Condenações por mentir à Justiça do Trabalho dobram em 10 anos
No País, foram 118 mil decisões nesse sentido no último ano e, 10 anos atrás, eram 58 mil. Um dos motivos é a reforma trabalhista
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A Justiça do Trabalho tem sido menos tolerante quando uma das partes do processo falta com a ética, mente ou age de forma desonesta. Segundo levantamento da Data Lawyer, o número de condenações por litigância de má-fé mais do que dobrou no País.
Segundo o estudo, em 2023, foram 118 mil decisões de primeira e segunda instância em todo o País. Há 10 anos, eram 58 mil, o que representa uma alta de 105%. O Tribunal Regional do Trabalho (TRT-ES) foi procurado, mas não detalhou quantas das 118 mil decisões ocorreram no Estado até o fechamento desta edição.
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“A possibilidade da litigância de má-fé já existia antes da reforma trabalhista, mas ela deu um impulso para as condenações por penalizar as chamadas lides temerárias”, explica o juiz da 7ª Vara do Trabalho de Vitória, Marcelo Tolomei.
A lide temerária ocorre quando o advogado, em extrema concordância do cliente, altera os fatos ocorridos para propor ação processual. Neste caso, o advogado é solidariamente responsável pela litigância de má-fé de seu cliente.
A advogada especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Patricia Pena da Motta Leal, destaca que a reforma trabalhista tornou mais criteriosa o ingresso de uma ação na Justiça.
“Com a reforma, impôs-se a necessidade de maior rigor na fundamentação das ações. Os trabalhadores e seus advogados precisam ser mais cautelosos quanto a viabilidade e legitimidade das ações antes de ingressar na Justiça do Trabalho, para evitar as penalidades”.
O advogado Raphael Coelho destaca ainda que a responsabilidade por litigância de má-fé pode recair tanto sobre o autor da ação quanto sobre seu advogado, dependendo das circunstâncias.
“Se comprovado que o advogado contribuiu ou incentivou a prática desonesta, ele também pode ser responsabilizado e até pode ser aberto um procedimento administrativo na OAB”.
O presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Federação das Indústrias do Estado (Findes), Fernando Otávio Campos, destaca que o falso testemunho pode resultar na aplicação de multa e configura até mesmo crime previsto no Código Penal, com pena de reclusão de dois a quatro anos.
Além disso, desde 2017, o trabalhador está sujeito a pagar honorários de sucumbência sobre pedidos negados pelo juiz, de 5% a 15% sobre os valores exigidos.
A advogada trabalhista Letícia Leite destaca que para evitar casos de má-fé, costuma verificar todos os fatos alegados pelo cliente antes de ajuizar a ação, por meio de análise de documentos e até mesmo oitiva prévia de testemunhas. “Antes de protocolar a ação ou defesa, enviamos a petição para que o cliente confira se tudo foi narrado da forma correta”.
Entenda
Litigância de má-fé
- É uma conduta abusiva, desleal ou corrupta realizada por uma das partes dentro de um processo, com o intuito de prejudicar a parte contrária, o entendimento do juiz ou de alcançar algum objetivo ilegal.
- É litigante de má-fé, conforme o artigo 80 do Código Processual Civil, aquele que:
- Deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; alterar a verdade dos fatos; usar do processo para conseguir objetivo ilegal; opuser resistência injustificada ao andamento do processo; proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; provocar incidente manifestamente infundado; ou interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Litigância predatória
- Trata-se do ajuizamento de demandas massificadas, com elementos de fraude ou abusividade. Por exemplo, quando se utiliza o nome de uma pessoa morta como autora de uma ação de indenização, ou quando o advogado ingressa com diversas ações idênticas a fim de escolher a vara onde pretende que o processo se desenvolva, desistindo das demais posteriormente.
- Os principais alvos dos advogados que atuam de forma predatória são as instituições financeiras, empresas de telefonia, concessionárias de energia elétrica, companhias aéreas, construtoras e grandes varejistas.
Punições
- Quem pratica litigância de má fé poderá ser condenado a pagar multa, que deverá ser superior a 1% e inferior a 10% do valor corrigido da causa; a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu; e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou.
- Além disso, desde 2017, o trabalhador está sujeito a pagar honorários de sucumbência sobre pedidos negados pelo juiz, de 5% a 15% sobre os valores exigidos.
- A multa a ser aplicada deve ser revertida para a outra parte, uma vez que esta é quem sofre os principais efeitos do ato praticado com má-fé.
- Advogados também podem ser condenados a pagar, solidariamente com o cliente, a multa por litigância de má-fé.
- Além disso, com a reforma trabalhista, é possível que testemunhas sejam condenadas a pagar multa por falso testemunho.
Fonte: Especialistas citados pela reportagem
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