Aposentados recebem todo dia até 32 ofertas de bancos
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Aposentados e pensionistas têm sofrido assédio cada vez maior por parte de bancos e financeiras, que não param de oferecer empréstimos consignados.
A insistência é feita das mais diversas formas. São abordagens por telefone, nas proximidades do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) e na porta da casa do beneficiário. Há casos de pessoas que recebem 32 ligações todos os dias.
Aposentados ouvidos pela reportagem de A Tribuna reclamam que as ligações são inúmeras, em qualquer dia da semana, em qualquer horário. E, mesmo que a oferta não seja aceita, ligam novamente e insistem no assunto, até que o aposentado ceda ou bloqueie o número. Se for bloqueado, eles passam a ligar de outro telefone.
O presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas do Estado (Sindnap-ES), Jânio Araújo, explicou que, durante a pandemia, o assédio aumentou.
“O consignado pode salvar uma vida, servindo para pagar uma cirurgia. É importante para um caso de necessidade, mas o assédio é tão grande, que às vezes o aposentado acaba pegando sem precisar”.
Ele destacou que muitas vezes o idoso é pressionado pela família a fazer o empréstimo.
O gestor de carteiras da Lotus Frederico Elias Muniz ressaltou que o consignado é um bom negócio para os bancos, porque oferece pouco risco, já que vai ser descontando da pensão ou da aposentadoria. “Existem riscos como morte ou perda da aposentadoria devido à mudança de legislação ou revisão. Mas o risco de inadimplência é muito baixo”.
O advogado Pérecles Reges, do Escritório BRFT, explicou que a oferta desenfreada dos bancos é considerada prática indevida e abusiva à luz do Código de Defesa e Proteção do Consumidor (CDC).
Ele explicou que a vulnerabilidade e fragilidade desses consumidores se presume por força de lei. E que as ofertas desenfreadas podem levá-los ao superendividamento, consequência nociva e, em muitos casos, irreversível.
Ressaltou que, mesmo que não configure crime, a prática dissemina consequências na esfera da responsabilidade civil, uma vez que é considerada assédio e perturbação do sossego, infração ao CDC.
Com a pandemia, o número de golpes contra os aposentados também cresceu. Para a psicóloga e diretora Psico Store, Martha Zouain, existe uma maldade implícita de se aproveitar da boa fé dos idosos.
“Elas sabem de aprovação da aposentadoria antes”
“Há muitos relatos de aposentados que ficaram sabendo da aprovação da aposentadora pelas financeiras. Ou seja, elas ficam sabendo antes deles”, contou o presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas do Estado (Sindnap-ES), Jânio Araújo.
O advogado especialista em direito do consumidor João Modenesi Filho explicou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tem o dever de resguardar os dados do segurado. Mas já há investigação sobre vazamento de dados por parte dos servidores do instituto.
Questionado sobre como essas instituições têm acesso tão rápido às informações, o INSS respondeu que de acordo com a Instrução Normativa 100, os bancos não podem fazer contato com os segurados até 180 dias após a liberação do benefício. Caso isso aconteça, é necessário que o beneficiário faça uma denúncia. Ela pode ser feitapelo consumidor.gov.br ou na Ouvidoria/SAC do banco que o beneficiário recebe a remuneração.
Modenesi explicou que essa é a regra vigente. Contudo, durante a pandemia, a partir de 30 dias da aprovação da aposentadoria, as financeiras já podem oferecer o consignado.
Cadastro para bloquear
A Federação Brasileira do Bancos (Febraban) criou um sistema “Não Perturbe”, voltado para as ofertas de empréstimo consignado. Quem não quiser recebê-las deve cadastrar os números nos quais não quer receber ligação no www.naomeperturbe.com.br.
“Uma vez realizado o cadastro do telefone fixo ou móvel no 'Não Perturbe', tanto os bancos quanto os correspondentes por eles contratados não poderão fazer qualquer oferta de operação de crédito consignado, 30 dias após a inclusão neste sistema”, destacou a Federação por meio de nota.
Outra iniciativa é a avaliação dos correspondentes bancários, com três itens que serão apurados: reclamações feitas aos canais internos dos bancos, à plataforma consumidor.gov.br e reclamações registradas no Banco Central e nos Procons; as ações judiciais e a avaliação feita por uma consultoria independente.
Os três pontos juntos serão monitorados pelo setor e podem criar aplicação de medidas administrativas, que preveem advertência, suspensão de contratação de novas operações por até 30 dias e ainda a suspensão definitiva de contratação de novas operações pelos correspondentes que não se adequarem às regras.
A autoregulação que trata de ambas as iniciativas entrou em vigor em janeiro deste ano.
Sabia mais
Vazamento
- São várias as denúncias de que as financeiras ficam sabendo da aprovação da aposentadoria do consumidor antes dele próprio.
- Além do assédio de financeiras, esses consumidores também sofrem muito com golpes, das mais variadas formas.
- A reportagem procurou a Polícia Civil para falar sobre o assunto, na segunda-feira, para conversar com uma fonte na quarta-feira, mas foi informada de que o delegado não estaria disponível e que a assessoria do órgão não poderia responder devido à especificidade das perguntas.
INSS
- De acordo com a Instrução Normativa 100, os bancos não podem fazer contato com os segurados até 180 dias após a liberação do benefício. Porém, durante a pandemia do novo coronavírus esse contato pode ser feito a partir dos 30 dias.
Fonte: INSS, Polícia Civil e entrevistados.
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