Perverso e anacrônico
Leitores do Jornal A Tribuna
É até admissível que na primeira metade do Século XIX fizesse algum sentido a preservação dos imóveis situados na costa do País para defender a integridade territorial. No entanto, há mais de século este instituto se revelou anacrônico e perverso.
A propriedade plena dos terrenos e imóveis ditos “de marinha” é da União, de forma que os titulares de tais imóveis detém apenas o direito de posse sem que haja a plenitude da propriedade, o chamado domínio pleno.
No âmbito concreto e real aquele que exerce de forma justa (com a devida origem) a propriedade de imóvel de marinha, usufrui dos mesmos direitos inerentes à propriedade, sendo, no entanto, devedor de taxa anual à União e de laudêmio na hipótese de transferência.
Tais encargos constituem relevante arrecadação para a União, que mantém robusta estrutura de controle e gestão deste patrimônio, onerando sobre maneira o contribuinte e os titulares de tais imóveis.
Não é demais expressar que se trata, os terrenos de marinha, de mais uma “jabuticaba”, onde o “proprietário” não tem domínio, apenas posse e portanto tem a “propriedade precária”.
Não raro este instituto esdrúxulo afasta investimentos e desestimula o empreendedorismo que gera emprego, renda e tributos; em especial o investimento estrangeiro, na medida em que é desafio enorme explicar a um investidor de outro país que o titular de imóvel de marinha por vezes valioso, não tem a propriedade plena embora por ela tenha pago quando da aquisição.
Tanto o aforamento como a ocupação, espécies do gênero terrenos de marinha, ostentam máculas. No primeiro, o domínio útil enseja remuneração anual a União limitando a o direito de propriedade, no segundo, a dita precariedade se eleva, o direito se resume à posse (ocupação) e a contribuição é ainda mais alta; ambos desaguando no mundo real no mesmo estuário: o dono se sente proprietário mas na verdade tem o direito precário em razão de um esquisito instituto tupiniquim.
Bem-vinda a PEC 39/11 que foi aprovada pela Câmara dos Deputados e encaminhada para o Senado Federal. Atribui-se a União o dever de vender o domínio útil aos foreiros e ocupantes, restando ainda obscuro como será implementado e se haverá obrigatoriedade de aquisição pelos titulares dos imóveis de marinha.
Nesta hipótese, a insegurança jurídica será brutal. Espera-se que o Senado Federal esclareça os pontos obscuros e privilegie a segurança jurídica em favor dos titulares dos Terrenos de Marinha conferindo-lhes a propriedade plena, banindo este anacronismo nefasto.
E não podem ficar fora da pauta as não raras redemarcações que tornam de marinha terrenos que nunca foram como tal considerados (os ditos alodiais), que não têm, portanto, esta anotação no Registro Geral de Imóveis, cuja propriedade é transferida regularmente, mas supervenientemente surge cobrança de laudêmio e taxa de ocupação. Absurdo.
Não estando anotado no RGI, não é exigível que seja de conhecimento do comprador; mas como já se disse: “no Brasil até o passado é imprevisível”.
Carlos Augusto da Motta Leal é advogado, especialista em Direito Imobiliário.
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