Livre arbítrio mitigado
Coluna foi publicada na quinta-feira (02)
Leitores do Jornal A Tribuna
Cesare Lombroso (1835-1909) defendia que delinquentes possuíam características físicas em comum, logo, era possível identificar a propensão ao crime com base nesses traços genéticos. Era essa a teoria do reo nato (criminoso nato), e em que pese o ultrapassado pensamento daquele psiquiatra, criminologista, antropólogo e cientista italiano, podemos observar traços de seu pensamento adotado na atualidade, onde se estigmatiza seres humanos com base, por exemplo, no que vestem e na cor da pele (atributos nem sempre considerados conjuntamente).
Desconsiderando os resquícios da influência lombrosiana, como explicar o comportamento delinquente? Como ser pensante, já faz algum tempo que abandonei a doutrina de que “bandido bom é bandido morto”, desde quando em consulta com a psicanalista Heloísa Loyola, no final de 2019, ela me fez entender que somos todos, enquanto adultos, espelhos de nossa infância.
Pouco tempo depois me vi, pela primeira vez, lamentando por um episódio ocorrido em 25 de março de 2020, quando um homem invadiu o apartamento de um médico na Praia do Canto, resultando na morte daquele invasor. Entendi que naquele evento todos eram vítimas. É óbvio que eu faria o mesmo que aquele médico para defender minha esposa e meus filhos, mas enquanto muitos vibravam com o desfecho, eu pensava que sequer deviam imaginar o trauma daquela família.
A empatia por aquele médico não me fez deixar de pensar naquela outra parte; naquele produto de uma cadeia de eventos e situações que foi submetido no decorrer de sua curta vida. Como deve ter sido sua criação? Tinha pai e mãe? Onde morou? Com quem conviveu?
Recentemente assisti um seriado chamado The Alienist. A primeira temporada trata de um serial killer que tinha como vítimas garotos que vendiam o corpo em ruas e bordeis, assassinando-os de forma bárbara, mutilando-os, arrancando os olhos, membros e órgãos internos; já na segunda temporada, o tema é relacionado a uma mulher que furtava bebês, cuidava deles por um tempo e depois os envenenava.
Observa-se que as duas abordagens envolvem extremos do que é mais hediondo para a sociedade, mas o interessante daquele seriado é que, ainda que o objetivo das investigações era capturar os criminosos e salvar futuras vítimas, havia um médico e cientista da mente humana que buscava entender o porquê daqueles atos – O Alienista!
Obviamente que não darei spoilers, mas o que se mostrou foi que os contextos traumáticos sofridos pelos criminosos enquanto crianças explicavam (não justificavam) suas empreitadas.
Fica em mim, então, a ideia do livre arbítrio mitigado. Por mais que possamos fazer nossas próprias escolhas, como poderíamos optar pelas melhores, se o que nos foi ensinado de forma teórica e empírica se distancia do que espera a sociedade? De uma forma ou de outra, branda ou grosseiramente, somos todos “objetos quebrados” em algum aspecto da vida, nem que seja na falta de empatia.
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