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Tribuna Livre

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Colunista

Leitores do Jornal A Tribuna

É Natal!

Coluna foi publicada no domingo (24)

Pedro Valls Feu Rosa | 26/12/2023, 11:26 h | Atualizado em 26/12/2023, 11:28

Eu fui à guerra. Estava lá, nas trincheiras, buscando a morte dos inimigos. Não havia tempo para pensar ou sentir – matar ou morrer era o nosso credo, avançar não importa a que custo nossa divisa.

À minha frente, entre as nossas trincheiras e as do inimigo, o sangue dos corpos daqueles que tombaram na refrega misturava-se à lama, compondo um cenário dantesco embalado pelas gargalhadas de Satanás.

E eis que caiu a noite do dia 24 de dezembro. Um a um, morteiros, canhões e fuzis foram silenciando diante do grito de nossas consciências.

Ao final, só restou aquele silêncio opressor que faz estremecer mesmo as almas mais embrutecidas. Foi quando ouvi um canção de Natal, ecoando lá das trincheiras inimigas.

O quadro era absurdo – as notas musicais sobrevoavam os corpos insepultos de tantos soldados, pousando a seguir em nossos corações angustiados. Alguns de nós responderam, começando a cantar em coro.

As vozes eram tristes, soluçantes e abafadas, mas de uma beleza angelical – ouso arremedar que nunca terá havido perante o Criador concerto mais sublime.

Um dos nossos, coração tão marejado quanto os olhos, levanta-se então da trincheira. Parte de peito aberto rumo ao inimigo levando não o aço que fere ou o chumbo que perfura, mas o coração que cativa – vai lá abraçá-lo. Outros o seguem – eu inclusive. Descobrimos, naquele lugar desolado pelo mal, um sacerdote. Foi ali, entre cadáveres e canhões, que rezou-se talvez a mais linda missa que um religioso jamais ambicionaria celebrar. E lá estava eu, ao lado dos inimigos que matei e dos que ainda viviam, buscando pela escuridão deste mundo a luz da redenção.

Findas as orações nossas rações de campanha compuseram, como que por milagre, a mais deliciosa ceia de Natal jamais servida. Não havia, é certo, o tilintar de cristais – mas quem precisa deles diante do som infinitamente mais agradável das batidas de centenas de corações entrando em harmonia?

Após uma noite verdadeiramente feliz decidimos sepultar nossos mortos, lado a lado. Com a voz embargada dos penitentes encomendamos juntos ao Criador as almas daqueles irmãos, cujas vidas havíamos subtraído na véspera. Foi ali, de mãos dadas com meus inimigos, que finalmente me compreendi efêmero diante da eternidade e insignificante sob o infinito.

Fomos todos – franceses, ingleses e alemães – punidos por estes momentos de grandeza e misericórdia. Afinal, aos senhores da guerra só agrada a paz dos cemitérios. Transferidos para campos de batalha ainda mais violentos, fomos perecendo um a um – mas com a alma leve de uma criança.

A guerra, claro, chegou a um fim – mas aquele Natal de 1914, visto pela ótica de um desconhecido soldado, permanece entre nós, superando a História e convocando nossas mentes a uma reflexão. Onde a personalidade, quando alguns poucos decidem que nossos destinos negarão a lógica mais elementar?

Das guerras à corrupção, dos desmandos à sanha da burocracia, lá está Incitatus nos pisoteando a todos e ditando as medidas de nossa humanidade.

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