A hipocrisia
Coluna foi publicada no domingo (26)
Leitores do Jornal A Tribuna
Há alguns dias tive a oportunidade de ler um fascinante relatório da ONU sobre o estado do nosso planeta e suas perspectivas de futuro.
Li que a degradação do solo já atinge incríveis 40% da superfície do planeta. A agricultura já começa a se deparar com a perda de produtividade do solo - uma queda que pode chegar a 50% a médio prazo. Este já era um quadro esperado - afinal, nos últimos 50 anos a produção praticamente dobrou, porém utilizando apenas 10% a mais de solo.
Aliás, sobre agricultura, transcrevo um parágrafo revelador: “responde por 70% a 85% do uso da água, e um aumento estimado de 20% na produção global de grãos tornará o seu uso insustentável”.
Segundo este relatório já está em marcha um acelerado processo de desertificação - que, hoje, atinge regiões habitadas por um terço da população mundial.
A consequência seguinte será o aumento dos preços dos alimentos, em um patamar estimado de 30% a 50% nas próximas décadas. Será por conta disso que nos países em desenvolvimento seis a cada dez pessoas sofrerão, de forma muito intensa, as agruras deste quadro que se descortina.
Não nos esqueçamos dos desastres naturais: furacões, inundações, enchentes, tsunamis etc. Entre 1980 e 1985 eles eram apenas 132 por ano. E eis que entre 2005 e 2009 pularam para 357.
Tradução: a situação é séria demais para ser ignorada. Enquanto isso, “há mais de 900 carros por grupo de mil habitantes em idade de dirigir nos Estados Unidos e mais de 600 na Europa Ocidental, contra menos de dez na Índia. O consumo de água ‘per capita’ nos países desenvolvidos chega a 425 litros diários, umas seis vezes maior que o dos países em desenvolvimento, cuja média é de 67 litros”.
Este surpreendente relatório trouxe outra informação: “com apenas um sexto da população mundial, países altamente desenvolvidos foram responsáveis por quase dois terços (64%) das emissões de dióxido de carbono entre 1850 e 2005. Desde 1850 cerca de 30% do total acumulado de emissões vieram dos Estados Unidos. Na sequência estão China (9%), a Federação Russa (8%) e Alemanha (7%)”.
Seria de se esperar que, diante de um quadro desses, a parcela mais rica da humanidade estivesse fazendo a sua parte. Mas qual o que: “A necessidade de investimentos [para reverter e prevenir dados ambientais] é imensa, mas não supera os atuais gastos com outras áreas, como a militar. Os investimentos anuais para se promover o acesso universal a formas mais modernas de energia são menos de 1/8 do que se gasta em subsídios para o uso de combustíveis fósseis”.
Este relatório alerta, assim, para o fato de que “estamos brincando jogos com nosso planeta”, no qual “alguns indivíduos colhem os benefícios enquanto a sociedade arca com os custos”.Segue a conclusão do estudo: “Em suma, os países mais pobres suportarão muitos dos custos das mudanças de clima e a perspectiva de piora dos índices de desigualdade é muito real”. É isso aí. Afinal, como exclamou Bernard Shaw, “o maior dos males e o pior dos crimes é a pobreza”.
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