Fake news deve ser combatida para além do período eleitoral
É complexo definir a expressão fake news tendo em vista somente a sua tradução literal, “notícia falsa”. O termo não abarca toda a essência, amplitude e capacidade que a expressão possui para fraudar a consciência do eleitor em período eleitoral ou fora dele e angariar perdas ou ganhos para determinado candidato. Por isso, o mais correto seria dizer “notícia fraudulenta”, ou melhor, desinformação.
Desde que o mundo é mundo as notícias falsas são utilizadas como instrumento para derrotar o opositor nas mais variadas batalhas, dentre elas, as discórdias políticas e disputas pelo poder.
Assim, o sistema que alimenta a desinformação no ambiente político eleitoral precisa ser enfrentado pelo Poder Judiciário visando evitar desvios de condutas que possam influenciar a liberdade consciente de escolha do eleitor, mas, também, aferir com extrema cautela hipóteses em que cabem sua intervenção, sob pena de ferir a tão consagrada e almejada liberdade de expressão.
Em tempo real vivemos a era do consumo instantâneo, em que a autoestima ou o sucesso estão diretamente ligados à capacidade de interagir por meio das mídias sociais, não necessariamente comprando, mas consumindo conteúdo, na maioria das vezes desprovido de essência.
É justamente nessa sociedade plural e desigual que a publicidade na internet passa a ter importância “capital”, capaz não só de influenciar as matizes econômicas, mas também a própria política.
Por certo, o avanço tecnológico, associado à criatividade de grupos e pessoas dispostas a difundir notícias enganosas, é um desafio constante, potencializando a relevância das Cortes Eleitorais no exercício amplo e independente da jurisdição para mitigar os efeitos danosos das notícias fraudulentas na formação de convencimento do eleitor. Todavia, não será o Judiciário sozinho que conseguirá enfrentar angustiante tema, nocivo à democracia.
É preciso compreender que somente boas iniciativas de prevenção, como educação jornalística, acesso a veículos de comunicação confiáveis e acordos de cooperação com as plataformas digitais, aliado a um trabalho maciço de consciência do eleitor, será capaz de estabelecer remédios razoavelmente eficazes contra a pirataria digital. O cidadão, usuário da internet, precisa compreender que ele é o maior responsável e curador do modelo atual de comunicação na internet.
A reflexão que se impõe, decisiva para o fortalecimento da democracia, reside na possibilidade ou capacidade da sociedade de enfrentar preocupante tema, sob pena de fragilizar as discussões eleitorais e a própria qualidade dos representantes.
O primeiro desafio é nos reconhecermos como sujeitos, inseridos num contexto sociopolítico que não isenta ninguém, tampouco é capaz de separar os justos dos malfeitores, se cada um não cumprir a sua cota de responsabilidade, no seu microssistema profissional, social ou familiar.
Só assim seremos capazes de unir a sociedade e exigir mudanças estruturais que elevem o grau de confiança na classe política, independentemente dos momentos históricos e episódicos de divisão político-social.
Rodrigo Júdice é advogado e ex-juiz eleitoral da classe dos juristas.