A guerra e a paz na Ucrânia
Iniciada há mais de 110 dias, a guerra na Ucrânia é vista, em geral, como a agressão da Rússia a um país menor. Contudo, constitui também um conflito entre Rússia e Otan (o pacto militar entre EUA e países europeus), onde as partes buscam o equilíbrio pela força e Moscou responde à possibilidade da Ucrânia integrar a aliança.
Comumente, na Europa, a Otan é tida como uma organização defensiva para desencorajar países terceiros (leia-se: a Rússia) a agredir um dos integrantes. Assim, associa-se a Otan aos “mocinhos” e a Rússia aos “bandidos”, em visão simplista que desconsidera o legítimo interesse de Moscou em sua própria segurança.
Após o fim da União Soviética, surgiu uma “nova Otan” acionada mesmo sem ameaça ou ataque efetivos a um país membro. A tutela dos interesses do bloco liderado pelos EUA passou a ser um dos objetivos do pacto. Assim, vendo a Otan como instrumento do poder americano, Moscou opõe-se à entrada da Ucrânia na Otan, que a ameaçaria de cerco militar, dado que quase todos os países do Leste europeu já se aliaram aos EUA.
Por outro lado, não se justifica a invasão russa a um Estado soberano, ainda mais pela destruição de alvos não militares e o massacre de civis. Como já em 1999 (Chechênia), em 2008 (Geórgia) e em 2014 (Ucrânia), os russos agridem um país vizinho, em clara violação do direito internacional, visando recuperar o domínio perdido nas últimas décadas e preocupando os países europeus.
Em suma, duas políticas imperiais disputam espaço na Europa e se enfrentam nos campos de batalha da Ucrânia, mesmo sem a presença direta de soldados da Ota. A paz entre países é resultado tanto da diplomacia quanto da força militar, que não deve ser exercida, mas usada para inibir ataques inimigos.
Com relação à eficácia da diplomacia, seria ingênuo confiar apenas nos tratados entre nações, que – a depender dos interesses dos signatários – podem se tornar “pedaços de papel”, fáceis de rasgar. Sobretudo quando o conflito envolver grandes potências (EUA, Rússia e China), os órgãos multilaterais que arbitram as controvérsias internacionais não têm dado conta do recado, esbarrando no poder de veto delas no Conselho de Segurança da ONU.
Entretanto, seria míope acreditar na garantia da paz entre países apenas pelo poder das armas. De fato, a grande força militar de uma potência desestimula agressões externas, porém incentiva também a corrida armamentista de outras, pondo assim em risco a paz. Ainda, mesmo após uma guerra com claro vencedor, carecem acordos diplomáticos para regular as relações internacionais.
Cabe, inclusive, atender minimamente aos interesses do país perdedor, para evitar que um novo conflito seja apenas questão de tempo, como no fim da 1ª guerra mundial com o tratado de paz punitivo da Alemanha.
A guerra na Ucrânia, em boa medida, decorreu da falta de empenho diplomático. Hoje, Rússia e Otan se envolvem cada vez mais na luta. O conflito é de desfecho incerto e possivelmente longínquo.
LUCIANO FAZIO é matemático e consultor em Previdência