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14 anos da Política Nacional de Resíduos Sólidos

"Somos adolescentes rumo a adultos, mas ainda não totalmente responsáveis"

Isabela de Deus Cordeiro | 07/08/2024, 15:34 h | Atualizado em 07/08/2024, 15:56

Imagem ilustrativa da imagem 14 anos da Política Nacional de Resíduos Sólidos
Isabela de Deus Cordeiro é Promotora de Justiça e presidente do Fórum Capixaba de Resíduos Sólidos (FCRS) |  Foto: Acervo Pessoal

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela Lei nº 12.305 de 02 de agosto de 2010, representa um dos principais marcos regulatórios na busca pela efetivação do Direito Fundamental ao Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado (art. 225 da CF/1988) e, notadamente, dos objetivos fundamentais da República de construção de uma sociedade livre, justa e solidária e de redução das desigualdades sociais (art. 3º, inc. I e III, CF/1988).

No seu 14ª aniversário, a PNRS é responsável pela promoção de inovações normativas significativas para a gestão adequada e para o gerenciamento de resíduos sólidos no Brasil, impulsionando a difusão de práticas sustentáveis de economia circular e da educação ambiental, mediante o estabelecimento de diretrizes e metas.

Ao dispor sobre a responsabilidade compartilhada entre governo, mercado e sociedade civil, evidencia a necessidade de envolvimento e cooperação entre os múltiplos atores sociais, sem desconsiderar o relevante papel dos consumidores. Assim, o Plano de Logística Reversa de atribuição de fabricantes, importadores, distribuidores, transportadores e comerciantes, aponta para a importância das entidades gestoras para a inclusão das OCMR e consolidação da perspectiva “do berço ao berço”.

A previsão da Educação Ambiental (EA) na PNRS, pilar fundamental para a conscientização da separação correta dos resíduos e adoção de práticas cotidianas comprometidas com a proteção ambiental, corrobora a necessidade de que os Planos de EA não se restrinjam a ações pontuais e isoladas, mas incluam campanhas de sensibilização e programas educativos em escolas e espaços comunitários, permanentes e contínuos, para a sedimentação da cultura de sustentabilidade. A logística reversa reforça, ainda, que as ações de EA não constituem tarefa exclusiva do Poder Público ou das OCMR, enfatizando a responsabilidade daqueles que licenciam as atividades e tipologias, dos sujeitos a ela obrigados, e do consumidor.

Com isso, a PNRS sedimenta o compromisso com a inclusão social e destaca duas estratégias: a primeira consistente na contratação de OCMR para gestão de resíduos recicláveis; e, a segunda, relativa à possibilidade de que o licenciamento ambiental de estabelecimentos comerciais e de serviços, enquadrados como grandes geradores e obrigados ao plano de gerenciamento, destinem seus materiais recicláveis para as OCMR.

Tais estratégias integram o Plano Estadual de Resíduos Sólidos do Espírito Santo e compõem os Eixos Estratégicos 7.1 e 7.7 de contratação prioritária de OCMR e de segregação dos resíduos recicláveis como exigência no processo de licenciamento ambiental municipal, priorizando a destinação para as OCMR, e vêm sendo recomendadas pelo Fórum Capixaba de Resíduos Sólidos (FCRS), espaço de controle social, que congrega diversos atores: sociedade civil organizada, setores acadêmicos e científicos, instituições governamentais e não governamentais, além dos Ministérios Públicos do Estado e do Trabalho, foi criado em 2020 com o objetivo de promover o debate ampliado e propositivo das políticas nacional e estadual de resíduos sólidos, mediante o fortalecimento de catadoras e catadores de materiais recicláveis.

Esse coletivo vem desempenhando fundamental importância no alcance dos avanços das medidas necessárias à eliminação dos lixões capixabas e na promoção de ações voltadas ao fortalecimento da categoria profissional dos catadores, e está organizado em três Comissões Temáticas: a de Fortalecimento das Associações de catadoras e catadores de materiais recicláveis, que conta, atualmente, com a coordenação importante e singular da ADERES – Agência de Desenvolvimento das Micro e Pequenas Empresas e do Empreendedorismo; a de Instrumentos Jurídicos e Econômicos, cuja atuação volta-se à fiscalização das disposições inadequadas de resíduos sólidos e instituição e cobrança da taxa/tarifa de RSU; e de Logística Reversa, coordenada pelo IFES, e orientada pela colaboração na produção normativa e fiscalização da Logística Reversa no Espírito Santo.

Em meio à comemoração é preciso relembrar algumas conquistas do fórum: a regularização das OCMR (92% com regimento interno; 96,8% com conselho fiscal; 63% com licenças ambientais); a contratação delas pelos poderes públicos municipais (71% das OCMR); o aumento de OCMR (16, em 2012, para 74, em 2024); a redução da informalidade (100% com CNPJ); a diminuição dos resíduos encaminhados para lixão (48% dos municípios destinam para áreas de transbordo; 24% têm empresas para a execução da atividade e 26% não destinam para transbordo); ampliação dos programas de coleta seletiva e reciclagem (84% dos municípios capixabas tem recolhimento segregado).

Por outro lado, os desafios vão desde à falta de infraestrutura de trabalho das OCMR, comprometendo a coleta seletiva e a reciclagem; ao inexpressivo quantitativo de municípios capixabas (05) que iniciaram as ações de logística reversa; passando pela ausência do sistema eletrônico de acompanhamento que inviabiliza o cruzamento dos dados extraídos das notas fiscais dos resíduos que circulam no território capixaba; pela fata de compromisso do mercado em se organizar e implementar a logística reversa; somada à ausência e precarização de fiscalização municipal, despidas de caráter estruturante da cadeia da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto; além do desconhecimento ou desídia de 92% dos municípios na fiscalização da destinação de resíduos da logística reversa para aterros sanitários.

Sobre esse ponto, sobreleva destacar o prazo derradeiro do dia 2 de agosto de 2024, de cidades com menos de 50 mil habitantes, para disposição inadequada dos resíduos sólidos urbanos, significando a proibição de encaminhamento para lixões. Infelizmente, sobre isso, ainda há pouco a comemorar: atualmente o Espírito Santo convive com a existência de “lixões” nos municípios de Ecoporanga, Barra de São Francisco, Água Doce do Norte, Águia Branca e Guarapari.

Em meio ao aniversário da lei, muitas reflexões se propõem, e mais do que isso, a tomada de ações pelo estado e pelos municípios capixabas. Sigamos! Aguardamos o dia em que ao aniversário da lei corresponderá a plena responsabilidade do adulto: o pleno respeito ao meio ambiente capixaba.

Isabela de Deus Cordeiro é Promotora de Justiça e presidente do Fórum Capixaba de Resíduos Sólidos (FCRS)

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