Bullying pode virar trauma
Coluna foi publicada no domingo (24)
Recentemente uma paciente me falou que tinha vergonha de transar de luz acesa. Ela também não mudava a roupa em frente ao parceiro e morria de vergonha da região que marcava muito na calcinha.
Geralmente quando chega esse tipo de questionamento eu ligo meu alerta. Esses são alguns indicadores que devem ser analisados com cuidado, pois muitas mulheres sofrem desde a infância com situações que podem parecer corriqueiras.
Vou contar um caso. Uma moça de 25 anos chegou ao meu consultório querendo informações sobre cirurgia íntima, e como de costume perguntei a ela o que a incomodava. A resposta foi que ela achava os grandes lábios dela enormes, e tinha muita vergonha na hora do sexo.
Então pedi para examiná-la e para minha surpresa os lábios dela, na verdade, eram muito pequenos, inclusive bem menores do que o normal. Assim procurei entender o motivo dela achá-los desproporcionais.
E advinha de onde veio o trauma? Tratava-se de bullying que ela havia sofrido na infância e, pasmem, da própria mãe, que falava que a região íntima da criança era feia, gorda e horrível. E ela levou isso para a vida.
Conversei com a moça, mostrei fotos de cirurgia em que realmente havia um excesso, e isso ajudou um pouco, porém na cabeça dela algo precisava ser mexido, pois quando a pessoa tem um transtorno dismórfico, ela vê algo mesmo que não exista. Na cabeça dela há uma distorção da realidade. Meu trabalho acabou sendo mais psicológico.
Esse caso me surpreendeu, pois nos leva à reflexão de que, na frente da criança, são feitos comentários desagradáveis, às vezes nem por maldade, mas que marcam profundamente a pessoa. Por isso é necessário um olhar atento e um cuidado quando falamos com nossos filhos.
“Tira a mão daí, fecha as pernas, senta que nem moça, cuidado que você vai ficar malfalada, que periquita feia, que nariz feio, que pé torto”.
Essas são frases que são ditas com frequência e por mais que sejam utilizadas para educar, quando colocadas em tom acusatório, brigando com a criança, podem levar a dificuldades nos relacionamentos futuros.
Realmente atendo muitas pessoas com alterações que podem ser mexidas e melhoradas. Nesses casos sim, eu indico a cirurgia. Porém é preciso ter um olhar atento por parte do cirurgião de modo a entender qual a verdadeira dor da paciente, alinhar as expectativas e as realidades.