Silêncio faz bem à saúde
Coluna foi publicada nesta terça-feira (24)
Dr. João Evangelista
O coração bate, os pulmões gemem, os rins murmuram, os ossos rangem e o estômago participa da cascata polifônica do aparelho digestivo. Apesar disso, os ouvidos participam pouco desse concerto. O corpo é sábio. Como acontece com as pausas, na música, a saúde sabe que o harmonioso silêncio do organismo conduz à pulsação do ritmo e à condução da melodia.
Diante de uma tonitruante dor, o analgésico pede “psiu”, enquanto o médico avalia a inquietude do órgão doente.
“O caminho para todas as grandes coisas passa pelo silêncio”. Infelizmente, a quietude é um artigo em extinção.
Ondas sonoras vibram os ossos do ouvido, transmitindo movimento para a cóclea, que, por sua vez, converte as vibrações físicas em sinais elétricos, que o ouvido percebe e faz o corpo reagir, imediatamente. Essa atividade sonora nos permite ouvir e assimilar. O silêncio tem tanta importância a existência quanto o som. Animais apreciam o silêncio.
Algumas horas de quietude por dia desenvolvem novas células cerebrais no hipocampo, região cerebral associada à aprendizagem, emoção e memória. Diante disso, o silêncio pode, literalmente, fazer o cérebro crescer.
Antigamente, o silêncio vinha junto com a oração, visando contato com o transcendente, uma espécie de “ignição” para acender o “fogo interior da alma”.
Silêncio não é a mera ausência do som. Trata-se de um mundo completo em si mesmo. Ele já habitava nele, primeiro, antes da criação de todas as coisas.
Curiosa adaptação ao barulho fez o ser humano temer o silêncio que ainda resta no mundo.
É óbvio que a comunicação através dos sons também é uma bênção. Entretanto, devemos sempre calar, ou deixar que nossas palavras valham mais do que o silêncio.
Por que o silêncio assusta? Talvez seja porque o ser humano não se conhece. Ao fugir da quietude, fugimos de nós mesmos. Temos medo de estar a sós com parte do nosso ser, que recusamos ver. O silêncio pode trazer consigo os sons das nossas sombras.
Oxalá o ser humano pudesse voltar a fazer as pazes com o silêncio, pois é nessa plenitude vazia que o cérebro encontra a oportunidade de se refazer. Assim como o corpo precisa de descanso após uma atividade física, a mente também precisa de intervalos para absorver e processar informações.
Para capturar memórias diluídas no tempo, o cérebro exige silêncio e introspecção. Mesmo de olhos abertos, uma rede de pensamento se conecta, em funcionamento intenso, permitindo relembrar, analisar e consolidar os acontecimentos acumulados pela vida.
Silêncio reduz o estresse, estimula a reflexão e a criatividade, melhora a memória e facilita a concentração.
Quietude também conduz à maturidade emocional. Esse intervalo de sons é necessário para adquirirmos uma distância dos acontecimentos e, assim, adotarmos as melhores saídas disponíveis para nossos contumazes obstáculos.
O sofrimento nunca lembra das palavras ditas, mas do silêncio que grita. É nele que viceja todo o vocabulário da compreensão.
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