O fim da era dos antibióticos
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Antes do advento dos antibióticos, respostas imunológicas conseguiam driblar infecções. Com a descoberta desses fármacos, permitimos que o sistema imune entrasse em férias, deixando que as drogas resolvessem os processos infecciosos.
Passamos décadas acreditando que os antibióticos iriam oferecer proteção eterna. Esquecemos que a ciência evolui se alimentando dos próprios erros.
O uso dos antibióticos começou em 1944, pouco depois de Alexander Fleming e colaboradores repassarem à Pfizer a descoberta da penicilina. O produto chegou rapidamente ao mercado, a tempo de salvar soldados combatentes na Segunda Guerra Mundial.
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Além do uso humano, os antibióticos foram introduzidos em rações, fazendo os animais ganharem mais peso e adquirirem menos enfermidades infecciosas, proporcionando lucros aos criadores.
A entrada dessas modalidades farmacológicas na cadeia alimentícia aumentou os casos de resistência microbiana nos animais, imediatamente transmitida para o ser humano. Entretanto, não se deve criticar unicamente a avicultura e pecuária. Os profissionais de saúde carregam uma fatia de responsabilidade.
Uma das atitudes para alguns médicos tranquilizarem seus pacientes é prescrever um antibiótico, ainda que, muitas vezes, as indicações sejam questionáveis.
Caso nada seja feito, em poucas décadas a inexistência de novas famílias de antibióticos no mercado, aliada à resistência crescente às drogas disponíveis, remeterá a humanidade para uma época pré-antibiótica. Pacientes voltarão a sucumbir de infecções varridas da memória.
Nem a microbiota intestinal permanecerá incólume, diante de tamanho assédio microbiano.
Antes do advento dos antibióticos, empregava-se a denominada fagoterapia para o tratamento de infecções bacterianas.
Em decorrência do aumento da resistência aos antibióticos e avanços na compreensão do microbioma humano, surge um renovado interesse pelo emprego dos bacteriófagos, vírus com a capacidade de infectar bactérias, de modo a inativá-las, evitando seu crescimento dentro do hospedeiro.
Há mais de 100 anos, os fagos chegaram a ser usados como antibacterianos, até a chegada das sulfas e dos antibióticos.
O aparecimento de bactérias resistentes e a forte correlação entre o microbioma intestinal e a saúde humana levaram a um novo interesse pela fagoterapia.
Todavia, convém lembrar os desafios envolvidos nessa terapêutica. A via de administração, o movimento gastrointestinal e o desenvolvimento de resistência do alvo bacteriano, representam barreiras a serem vencidas.
Apesar da especificidade e da segurança dos fagos, seus possíveis efeitos fora do alvo, incluindo a ativação da resposta imunológica e a redução das bactérias comensais, devem ser igualmente considerados.
Conta-se que, depois do pecado original, Deus trancou a serpente no corpo do homem. Trata-se do intestino, essa cobra enrolada dentro do abdome, animal insaciável que condiciona a saúde aos desejos de seus micróbios.
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