Jovens usam Inteligência Artificial em busca de companhia, diz pesquisa
Levantamento aponta que 39% das crianças e adolescentes utilizam algumas ferramentas de inteligência artificial com esse objetivo

Recentemente uma pesquisa apontou que adultos têm recorrido à Inteligência Artificial, como o ChatGPT, para “fazer terapia” e buscar aconselhamento. Só que agora o uso dessa ferramenta deixou de ser apenas por pessoas maiores de 18 anos.
Isso porque já existem crianças e adolescentes usando ela em busca de companhia e de apoio emocional – aproximadamente 39%, segundo levantamento da empresa de cibersegurança Gen.
O dado faz parte do relatório “The AI Generation: How kids and teens are using AI tools (tradução livre - A Geração IA: Como crianças e adolescentes estão usando ferramentas de IA)”, divulgado em julho.
A pesquisa foi realizada, de forma on-line, pela Dynata no Brasil, entre os dias 30 de abril e 8 de maio de 2025, com 1.001 adultos.
Para a psicóloga clínica Elisa Lima, existem inúmeras possibilidades que levam crianças e adolescentes a buscarem companhia em ferramentas de inteligência artificial, como não receber apoio emocional ou não se sentir realmente compreendido no ambiente que está inserido.
“Essa falta de ser acolhida e ouvida pode fazer a criança buscar a inteligência artificial, porque lá terão respostas que validam o que ela quer ouvir. Nessas ferramentas nunca terão falas de desaprovação ou negativas. Sempre estará voltada para falas mais positivas, de validação”.
Na avaliação da psicóloga clínica Henza Rafaela Morandi, especialista pós-graduada em Terapia Cognitivo-Comportamental com foco no público infanto-juvenil e feminino adulto, quando essa aproximação com os pares é substituída por interações com a inteligência artificial, há um risco: o adolescente pode deixar de vivenciar trocas sociais reais, essenciais para o amadurecimento emocional.
“Isso pode favorecer o isolamento, dificultar a prática das habilidades sociais e até contribuir para o surgimento de quadros como fobia social”.
O psicólogo Breno Rosostolato destaca que a inteligência artificial pode ser uma ferramenta que crianças e adolescentes utilizem como recurso, porém não deve ser o principal.
“O ambiente virtual precisa ser também um lugar de cuidado, ter responsabilidade, não pode ser solto. Precisa haver regras, leis específicas e regulamentações”, destaca.
Monitoramento
De olho nos filhos
A manicure Inaiara Maria Oliveira, 34, tem 6 filhos e diz monitorar o uso deles na internet. Segundo ela, com tantos recursos na internet, é um “desafio manter o monitoramento, mas não impossível”.
A filha mais velha, Ana Lívia Oliveira, 16, usa o ChatGPT para estudo, inspirações de decoração e conteúdos para redes sociais. Tudo isso com a supervisão atenta da mãe.
“Tento manter um diálogo com a Ana, até mesmo para ela se sentir acolhida”.
Saiba mais
88% dos pais dizem impor limites
Pesquisa
Um levantamento da empresa de cibersegurança Gen revelou que 39% das crianças e adolescentes brasileiros recorrem à inteligência artificial em busca de companhia. O dado faz parte do relatório “The AI Generation: How kids and teens are using AI tools”, divulgado em julho.
A pesquisa foi realizada de forma on-line pela Dynata no Brasil, entre 30 de abril e 8 de maio deste ano, com 1.001 adultos. Os resultados foram ajustados por idade, sexo e região para representar a população nacional. No estudo, o termo “pais” refere-se a adultos com filhos menores de 18 anos.
Ferramenta
Entre os pais entrevistados, 67% disseram que os filhos usam o ChatGPT, apontado como a ferramenta de IA mais popular entre os jovens. Para 64% deles, o uso pode estimular o aprendizado e a criatividade.
Limites
Apesar disso, 88% dos pais afirmaram impor limites ao tempo de tela, mas 58% reconhecem que os filhos conseguem driblar essas restrições. Em muitos casos, a descoberta ocorreu por confissão das próprias crianças (36%) ou por percepção dos pais (24%).
Riscos
O estudo também mostra que os jovens se expõem a riscos on-line: 39% já foram flagrados usando dispositivos após a hora de dormir, 17% acessaram sites bloqueados, 14% assistiram a conteúdo explícito e 6% se envolveram em episódios de cyberbullying.
O que eles dizem
Conexões reais

“Quando as pessoas se sentem mais seguras na internet do que na vida real, existe um problema, uma dificuldade, uma dor e um sofrimento. Pode parecer que a pessoa está envolvida com outras nos ambientes virtuais, mas talvez ela esteja cada vez mais se isolando da vida real.
Muitas vezes, a internet é usada para preencher essa dor, e não é esse o seu propósito. Precisamos conversar com pai, mãe, familiares, amigos e buscar terapia. Precisamos nos relacionar com as pessoas e estabelecer conexões reais”.
Preenchimento do vazio

“O uso da inteligência artificial como companhia pode revelar carências afetivas ou dificuldades de relacionamento tanto no ambiente familiar quanto escolar. Muitas vezes, esse comportamento sinaliza que a criança ou adolescente não está encontrando, em seus vínculos reais, o acolhimento, a escuta ou a sensação de pertencimento de que precisa.
A IA, então, aparece como forma de preencher esse vazio. Pela ótica da Terapia Cognitivo-Comportamental, é possível entender esse movimento como estratégia de evitação: o jovem busca no digital um espaço seguro para fugir das frustrações das relações reais”.
Reforçar crenças

“Os possíveis impactos (do uso da IA para apoio emocional) podem estar relacionados a questões de isolamento ou dificuldade de habilidades sociais. A criança pode ter a tendência de se isolar e não fazer conexões reais. Outro ponto que também pode influenciar é no comportamento da criança.
A IA pode reforçar comportamentos disfuncionais, por conta da validação em excesso que implementa. Nela, nunca há fala de desaprovação, mas concordância e validação, e isso pode reforçar crenças desfuncionais”.
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