Sem teto para morar, famílias ocupam prédios históricos no Centro
Um grupo de 20 famílias ocupa colégio tradicional do centro de Vitória
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A falta de moradia é um problema social que já atinge cerca de 142 mil famílias em todo Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No Espírito Santo, essa realidade não é diferente e não fica difícil encontrar pessoas que sonham em, pelo menos, ter um teto para morar.
Sem um lar para chamar de "seu", muitos vivem em moradias improvisadas e chegam até a ocupar áreas restritas ao governo.
Em Vitória, por exemplo, um grupo de 20 famílias passou a peregrinar pela capital. Sem emprego e dinheiro para conseguir pagar aluguel, a maioria dessas pessoas passaram a ocupar terrenos e até prédios públicos abandonados.
São pessoas que residiam em bairros como Santo Antônio e São Pedro, mas devido as dificuldades financeiras, passaram a ocupar terrenos e até acampar em frente a órgãos públicos.
Em 2017, o grupo foi expulso de uma região conhecida como "Fazendinha". Na época, cerca de 40 famílias passaram a ocupar prédios históricos do Centro.
"A Defensoria nos ajudou, fornecendo um aluguel social de R$ 600, por seis meses, mas esse tempo acabou. Como não temos dinheiro para pagar o aluguel, fomos obrigados a vir para cá", conta a líder do movimento, denominado Chico Prego ,Rafaela Regina Caldeira, de 40 anos.
Ela afirma que o objetivo das pessoas que ocuparam o local não é danificar o patrimônio histórico. "Pelo contrário, nós nos comprometemos em cuidar dele, não depredar. Esse não é nosso intuito. Estamos aqui porque não temos emprego, dinheiro para pagar um aluguel, porque não temos para onde ir", afirma a líder.
A dona de casa Miriam Alves Souza Santos, de 44 anos, está no mesmo grupo de famílias que invadiram um prédio histórico no centro de Vitória, por não ter para onde ir. Para ela o sonho de ter uma casa própria é ainda algo muito distante.
Mãe de 4 filhos, todos menores de idade, a mulher vem peregrinando há cerca de 6 anos, em busca de um teto, onde ela possa dormir sem se preocupar em ser despejada.
O tão almejado sonho fez com que Miriam estudasse e descobrisse uma nova profissão: a de doceira.
"Só que eu não tenho dinheiro para comprar o material para produzir. Vivo com o dinheiro do Bolsa Família e não dá para comprar. Meu sonho é empreender para juntar dinheiro e comprar minha casa própria", disse a mulher.
Defensora pública estadual, Marina Dalcomo, destacou que a defensoria tem o papel importante em garantir os direitos humanos à essas famílias.
"A Defensoria é um órgão constitucional de proteção aos direitos humanos de pessoas hipossuficiência que são aquelas que estão em alguma vulnerabilidade social", ressalta.
A defensora pontuou que o órgão atua na construção de políticas públicas para cobrar o poder público.
"A Defensoria atua com essa demanda de moradia na construção de políticas públicas para que as pessoas tenham acesso à moradia com dignidade", destacou.
Atuando por meio do Núcleo de Defesa Agrária e Moradia (NUDAM), a defensora fez um levantamento de dados sobre ameaças a ocupações coletivas no Espírito Santo. Foram selecionados os casos que envolvem ameaças de remoções em áreas urbanas e rurais no Estado, existentes em março de 2023, administrativas ou judiciais, por entes públicos ou particulares, chegando-se ao total de 39 casos atuais, e 3.906 famílias com suas moradias ameaçadas.
"O número de famílias ameaçadas de forma mais grave, por haver decisão de reintegração de posse nos processos, ainda que a maioria ainda esteja suspensa, em razão da ADPF 828, é de 2.076".
“Minha maior dor é ver meus filhos pedindo comida e não ter para dá-los”
Aos 40 anos e com várias experiências na vida, a dona de casa Sabrina Alves da Silva nunca imaginou passar pelo que passou nos últimos dias ao ver os filhos, de 12, 8 e 3 anos, não terem o que comer.
"Minha maior dor é ver meus filhos pedindo comida e não ter nada para dá-los. É não ter um biscoito e até uma fralda para colocar neles", disse a mulher emocionada.
Sem emprego e mãe solo, a dona de casa diz que está desesperada com a situação que vive. "A gente fica sem expectativa. Me dói olhar para meus filhos e não poder dar o melhor para eles", disse.
"Um dia eu vou contar para meus filhos que nós vencemos"
“Fé” é uma palavra que sempre andou lado a lado da jovem Thais Lorrane Alves de Souza, de 23 anos. Mãe solo de três filhos pequenos, a menina-mulher relata que já passou muita coisa ao lado dos pequenos, em busca de um lar. Entre vários despejos sofridos e situações onde ela e as crianças quase passaram fome, a jovem ainda encontra motivos para agradecer.
"Hoje, estou mais tranquila porque tenho um teto, mesmo que por um tempo. Apesar de tudo, hoje eu sou feliz por ter pelo menos água para dar banho nos meus filhos”, disse a mulher se referindo a um período que viveu em um terreno, onde a água foi cortada pelos responsáveis do local.
A mulher e as crianças vivem hoje em um local ocupado por 20 famílias, no centro de Vitória, o antigo prédio do Colégio São Vicente de Paulo, que fica na Cidade Alta.
A reportagem de A Tribuna esteve no local e encontrou um lugar totalmente precário e sem condições de moradia, com os rebocos das paredes caindo, mofo e muita poeira.
"Não temos o que fazer. Meu sonho é poder ter uma casa, dar o melhor para meus filhos. Até fiz um curso de unha de gel, mas como vou comprar os materiais para trabalhar, se não tenho dinheiro nem para alimentar meus filhos direito?", desabafou a mulher.
Infográfico
Segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD contínua), realizada em 2019, o estudo Síntese de Indicadores Sociais mostrou que pretos e pardos moram com maior frequência em domicílios com algum tipo de inadequação.
O estudo esclarece que 45,2 milhões de pessoas residiam em 14,2 milhões de domicílios com pelo menos uma de cinco inadequações - ausência de banheiro de uso exclusivo, paredes externas com materiais não duráveis, adensamento excessivo de moradores, ônus excessivo com aluguel e ausência de documento de propriedade.
Entenda no infográfico a situação de moradia irregular no Brasil.
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