Não basta pensão! Lei agora obriga pais a dar afeto aos filhos
Legislação sancionada na última semana prevê o abandono afetivo como ilícito civil, abrindo caminho para o processo na Justiça
O cuidado e a presença dos pais na vida dos filhos deixaram de ser apenas um gesto de afeto: passaram a ser um dever legal.
Uma nova lei, sancionada na última semana, prevê o abandono afetivo como ilícito civil, abrindo caminho para que os pais possam ser responsabilizados na Justiça.
A advogada atuante na área do direito das famílias, mestre e professora universitária Bruna Pereira Aquino explicou que o abandono afetivo ocorre quando o pai ou a mãe deixam de oferecer afeto, atenção, convivência e suporte emocional ao filho, causando danos de ordem moral e psicológica.
“Na prática, a nova lei prevê que a omissão afetiva e a ausência de participação nos cuidados cotidianos podem gerar o dever de indenizar, reconhecendo que o abandono emocional também fere direitos fundamentais da criança”.
Apesar do reconhecimento legal, ela destacou que a avaliação continua sendo feita caso a caso, considerando as circunstâncias familiares, a idade da criança, o histórico de convivência e os impactos emocionais comprovados.
“O juiz deve verificar se houve negligência afetiva relevante e se essa conduta causou dano moral ou psicológico mensurável ao filho”, pontua.
O advogado especialista em direito de família, professor da FDV e presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões no Estado, Thiago Vargas Simões, explicou que, embora a legislação ainda não trouxesse de forma explícita o termo “abandono afetivo”, o tema já vinha sendo reconhecido pelo Judiciário desde uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2012, que admitiu a possibilidade de indenização quando um pai ou mãe se omite do vínculo emocional com o filho.
“Agora, com a mudança no Estatuto da Criança e do Adolescente, reconhece-se como dever jurídico, de forma expressa, estar presente e participar da vida da criança”, explicou Simões.
A advogada especialista em direito das famílias e conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Espírito Santo (OAB-ES), Bruna Suellen Sartori, ressaltou que a Justiça não pode obrigar ninguém a amar, no entanto, obriga a cuidar.
“Cuidar é uma função, um dever. O dever de cuidado – afetivo e moral – é participar da vida do filho, orientar, dar apoio emocional, conviver”.
Segundo ela, a mudança na lei traz segurança jurídica.
“O problema é que, como não era lei, existia muita subjetividade nos casos e a discussão ultrapassava as provas do processo e dependia da interpretação dos juízes”.
Entenda
Nova lei
Foi sancionada na última semana uma lei que prevê que pais e responsáveis que se omitirem no cuidado emocional, no convívio familiar e na atenção aos filhos podem ser responsabilizados pela Justiça.
A lei altera o Estatuto da Criança e do Adolescente, reconhecendo o abandono afetivo como “ilícito civil”.
Assistência afetiva
O texto estabelece que os pais devem prestar aos filhos assistência afetiva, por meio de convívio, que permita seu “acompanhamento da formação psicológica, moral e social”.
Também considera assistência afetiva: orientação quanto às principais escolhas e oportunidades profissionais, educacionais e culturais; solidariedade e apoio nos momentos de sofrimento ou de dificuldade; além de presença física espontaneamente solicitada pela criança ou adolescente quando possível.
O que muda na prática
Como Era
Antes da nova lei, o Estatuto e o Código Civil já impunham aos pais o dever de educar, assistir e sustentar os filhos, mas não mencionavam expressamente o cuidado afetivo e emocional.
Além disso, mesmo sem previsão expressa, já havia decisões reconhecendo o dever de indenização decorrente do abandono afetivo.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconhecia o direito de filhos serem indenizados pelo abandono afetivo, desde que comprovado o dano emocional.
Como fica
A Lei nº 15.240/2025 alterou o ECA para reconhecer o abandono afetivo como ilícito civil.
Assim, a ausência injustificada de afeto e convivência passa a ser uma violação dos deveres parentais e pode gerar obrigação de indenizar.
Ilícito civil
A nova lei estabelece o abandono afetivo como um ilícito civil.
Diferentemente de um crime – que pode ter pena de prisão prevista – o ato ilícito, previsto no Código Civil, ocorre quando alguém causa dano a outra pessoa por ação ou omissão voluntária.
No caso do abandono afetivo, a sanção é civil, com reparação financeira e eventual repercussão em processos de guarda, convivência e poder familiar.
Comprovação
Apesar de a lei estabelecer que deixar de prestar assistência afetiva é um ato ilícito, o processo continua sendo analisado caso a caso por um juiz.
Para que o magistrado determine uma indenização, será preciso provar no processo, de forma robusta, a omissão e o dano.
É preciso comprovar, portanto, que o afastamento foi injustificado e resultou em prejuízo concreto ao desenvolvimento psicológico ou social da criança ou adolescente.
De acordo com a lei, se houver negligência, maus-tratos ou abuso, a Justiça pode determinar o afastamento dos pais ou responsáveis.
Fonte: Especialistas e pesquisa AT.
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