Mente dos jovens está sobrecarregada e pedindo socorro, afirmam médicos
Compromissos e preocupações são levados hoje na palma da mão, por meio do celular, deixando-os sobrecarregados

Se antes o cansaço era sinônimo de um corpo que trabalhava demais, hoje ele habita sobretudo a mente. Diferente das gerações passadas, que descansavam quando o expediente acabava, os jovens de hoje levam o trabalho, as preocupações e as comparações na palma da mão, no celular.
Essa rotina, segundo explicam especialistas, tem sobrecarregado a mente dos mais jovens, que anda pedindo socorro.
Para se ter uma ideia, em 2019, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas no Espírito Santo 10.515 jovens entre 18 e 29 anos tinham diagnóstico de depressão e faziam psicoterapia. Com a pandemia, a estimativa é que esse número tenha aumentado.
Levantamento do Project Management Institute (PMI) América Latina aponta que 48% das pessoas com menos de 30 anos estão mais propensas ao burnout (esgotamento físico e mental causado por questões relacionadas ao trabalho), em comparação com 40% daquelas com 30 anos ou mais — reflexo do fato de estarem mais conectadas do que as gerações anteriores.
Diretora da Associação Psiquiátrica do Espírito Santo (Apes), a psiquiatra Letícia Mameri-Trés destaca que os jovens hoje estão com a mente mais cansada pelo excesso de estímulos. A médica explica que, com o aumento do uso digital, há uma sobrecarga cognitiva, além do tempo ser cada vez mais escasso e o descanso sem qualidade.
Para a psiquiatra Karen de Vasconcelos, professora do Unesc, os espaços que antes amorteciam o estresse (comunidade escolar presencial, laços sociais cotidianos, ritmo de trabalho previsível) foram remodelados pela pandemia e pela digitalização — como a difusão massiva do trabalho remoto e a mistura entre tempo de trabalho e tempo pessoal — reduzindo intervalos naturais de recuperação mental.
“Enquanto para alguns a maior flexibilidade diminui o estresse, para muitos essa ruptura das fronteiras casa-trabalho contribuiu para um maior isolamento, jornadas prolongadas e a sensação de nunca 'desligar', favorecendo o burnout e a fadiga”.
Lícia Colodete, psiquiatra e presidente da Apes, destaca que essa sobrecarga não está restrita aos jovens, assolando todas as faixas etárias, inclusive crianças.
“Considerando que crianças e jovens não têm plenamente desenvolvidas as funções cerebrais superiores, como o controle inibitório, é possível afirmar que são especialmente vulneráveis à superestimulação, com consequências que podem ir para além do simples cansaço”, destaca.
Excesso de estímulos

No automático. É assim que a engenheira de requisitos Isauflânia Suelen Ribeiro Timoteo, 30 anos, define o excesso de estímulos digitais que recebe e a pressão que sente para ser mais produtiva.
“Vivemos tão imersos nesse ritmo acelerado, entre trabalho, estudos e as redes sociais, que nem percebemos o quanto estamos sempre tentando dar conta de tudo. Mesmo quando não existe uma cobrança direta, existe uma sensação constante de que você precisa estar produzindo, aprendendo algo novo e se destacando”, relata.
E as redes sociais, segundo ela, intensificam essa sensação. “Acho que, sem perceber, a gente entra num ciclo de comparação e autocobrança que é muito desgastante”.
Sobrecarga
Aos 27 anos, o engenheiro de dados Leandro Furlam relata que a hiperconectividade e as redes sociais muitas vezes têm sobrecarregado sua mente no dia a dia.
Além disso, Leandro conta que sente cansaço ao tentar “dar conta de tudo”. “Já pensei em procurar ajuda (psicológica). Conversar com algum profissional sempre ajuda a colocar as coisas em perspectiva”.
Outro ponto que Leandro aborda é sobre a “exigência” de se ter sucesso antes dos 30 anos.
“Parece que todo mundo tem de ser 'bem-sucedido' antes dos 30, mas estou tentando aprender que cada um tem seu próprio ritmo. É muito difícil tentar acompanhar quem já atingiu esse 'bem-sucedido', mas são principalmente essas pessoas que as redes sociais colocam como comparação. Não tenho a mesma realidade que elas, e tenho consciência disso”, afirma.
Home Office
Menos tempo de tela

Um programador de 29 anos, que preferiu não se identificar, contou à reportagem que, como trabalha de home office, não tem muita separação entre trabalho e casa. “Também sinto que as redes sociais dão uma sobrecarregada e preciso conscientemente tomar medidas para diminuir meu tempo de tela e ser menos afetado”.
Por ansiedade e outros problemas, o jovem procurou ajuda psicológica e psiquiátrica. “Desde antes já percebia que a ansiedade tinha alguma relação com o quanto eu consumia redes sociais, mesmo que as redes sociais não fossem a causa em si”.
Principais doenças
Depressão
42. 175 jovens de 18 a 29 anos do Estado recebem diagnóstico de depressão por profissional de saúde mental.
Desses, 10.515 fazem psicoterapia e 10.883 usaram medicamento para depressão.
Estresse
Levantamento do World Mental Health Day 2024, feito pela Ipsos, mostrou o peso do estresse especialmente entre os mais jovens. A geração Z — formada por quem nasceu entre 1997 e 2012 — é a que mais sente os efeitos da sobrecarga emocional, de acordo com a pesquisa. Entre as mulheres dessa faixa etária, 46% afirmam que o estresse afeta de forma significativa sua rotina, enquanto entre os homens o índice é de 33%.
Burnout
O levantamento do Project Management Institute (PMI) América Latina aponta que:
48% das pessoas com menos de 30 anos estão em risco de desenvolver burnout, contra 40% entre os que têm 30 anos ou mais.
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