Mais casais decidem viver sem filhos
Pesquisa do IBGE aponta que, em 10 anos, número de famílias com essa configuração subiu de 14,7% para 21,7%
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Para muitas pessoas, é quase automático pensar que, após o matrimônio, o passo seguinte é preencher a casa com filhos. Embora este seja o desejo de muitos, os comportamentos familiares têm se modificado.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontaram um aumento da quantidade de lares compostos por casais sem filhos no Estado.
Em 2005, 14,7% dos arranjos familiares no Espírito Santo tinham essa configuração. Dez anos depois, em 2015, o número saltou para 21,7%.
A reportagem de A Tribuna conversou com casais que compartilharam sua experiência de viver uma vida conjugal plena e realizada sem filhos.
Para a psicóloga Marcelle Paganini, a felicidade de um casal não deve ser medida pela presença de um filho. “É possível ser feliz com e sem filhos. E também é possível ser infeliz das duas formas. O que a sociedade precisa aprender é a respeitar quem vai contra a maré e continuar vivendo sem se incomodar com a decisão do outro”, afirmou.
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Decisão
Juntos desde 2004, a analista de marketing Dalete Campello, 39, e o autônomo Fabiano Campello, 58, compartilham do mesmo planejamento há quase 20 anos.
“Desde que nos conhecemos, fomos bem abertos nessa conversa. Tínhamos o projeto de nos casar, mas não de ter filhos”, explicou Fabiano.
Para Dalete, os valores atribuídos à maternidade e à paternidade, como o afeto e o cuidado, podem ser manifestados de outras formas. O casal é voluntário, desde 2014, em um abrigo na Serra que cuida de 21 crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade.
“Todo final de ano, fazemos o apadrinhamento afetivo no Natal. Dentro do abrigo, a criança não tem a oportunidade de ter essa referência. Para nós, é uma satisfação enorme”, disse Dalete, que nunca alimentou o desejo de ser mãe.
“Há uma cobrança muito grande para a gente seguir esse ‘cronograma’ depois do casamento, mas vejo que esse comportamento tem mudado ao longo do tempo. Hoje, conheço pessoas que também estão convictas dessa decisão”.
Decisão conjunta
Foi a partir de uma conversa franca que a auxiliar administrativo Valdirene de Jesus Santos, 32, e o técnico de enfermagem Elias Morais da Silva, 36, optaram por não priorizar a geração de filhos na relação.
Valdirene lembra que, desde pequena, nunca teve vontade de ter filhos. Antes de comunicar ao marido a opção pela não maternidade, ela se certificou de que esta também não era uma prioridade para o marido.
“Muitas pessoas falam que vamos nos arrepender da decisão, mas a gente não absorve essas críticas”, disse ela.
Liberdade e experiências a dois
Juntos há 10 anos, a fotógrafa Renata Paz, 43, e o engenheiro Gustavo Costa, 42, optaram por não ter filhos logo quando se conheceram.
O casal conta que tem liberdade para viajar e mais tempo disponível para se dedicar aos esportes.
“Saio à noite para fotografar sem preocupações. Em toda a minha vida, nunca tive o desejo de ser mãe. Ainda há muito julgamento, mas as pessoas têm de respeitar essa decisão”, disse Renata.
Na foto, o casal vive a experiência de subir o Pico da Bandeira, entre o Espírito Santo e Minas. “Uma sensação de liberdade incrível”.
Planejamento familiar acessível
No início deste mês, a Lei do Planejamento Familiar (Lei 9.263/96) passou por mudanças importantes. Sancionado em setembro do ano passado, o novo texto promove alterações que facilitam o acesso aos procedimentos de esterilização.
Entre elas, a idade mínima para a realização da cirurgia de vasectomia ou laqueadura caiu de 25 para 21 anos de idade.
Além disso, o novo texto também exclui a necessidade de aval do cônjuge para o procedimento e libera a cirurgia de laqueadura durante o parto.
O urologista Camilo Milanez conta que tem observado no consultório um aumento no número de homens que iniciam relacionamentos sem a expectativa de ter filhos.
O médico destaca que o planejamento é a palavra-chave para qualquer casal.
“Muitos casais se casam e ficam em dúvida se terão filhos ou não. Isso pode causar um desgaste no relacionamento. Quando as pessoas se relacionam já tendo essa decisão (de não ter filhos) tomada, o relacionamento é até favorecido”, observa.
Para Milanez, as novas regras da legislação sobre os procedimentos de esterilização representam avanços importantes.
“As mudanças vêm para contribuir no planejamento familiar desses casais e, ao mesmo tempo, conferem maior individualidade às pessoas”, opinou.
A ginecologista e colunista de A Tribuna Lorena Baldotto pontua que a falta de planejamento pode trazer consequências para os casal.
“Para que um relacionamento seja saudável é preciso haver consenso, justamente para se evitar um problema futuro. É importante que os parceiros se alinhem e vejam se estão com essa expectativa de terem filhos ou não”.
OPINIÃO
"Quando as pessoas se relacionam já tendo essa decisão (de não ter filhos) tomada, o relacionamento é até favorecido. Planejamento é a palavra-chave para qualquer casal”, Camilo Milanez,, urologista
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