Águas que contam histórias do Espírito Santo
O Rio Itapemirim foi fundamental para que cidades surgissem e o Estado pudesse se desenvolver, de acordo com historiadores
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As águas do Rio Itapemirim contam boa parte da história do Estado. No ritmo do garimpo e do cultivo do café e da cana-de-açúcar, foi nele que surgiu o primeiro pedágio capixaba, o primeiro quartel militar próximo a águas doces e onde os jesuítas desembarcaram para catequizar os índios da região Sul.
De acordo com o historiador Gilson Eleutério, 52 anos, não consta que alguém tenha presenciado a constituição de rios no mundo porque eles são mais antigos que a humanidade.
Portanto, só se conhece a história por meio dos indícios geológicos, hídricos e biológicos que eles deixaram.
Segundo ele, o Rio Itapemirim nasce no município de Laginha, na Zona da Mata Mineira, e deságua no oceano Atlântico, na cidade de Marataízes, Sul do Estado.
A bacia, ao todo, conta com cerca de 687 mil hectares e 17 municípios se organizaram ao seu redor: Alegre, Atílio Viváqua, Conceição do Castelo, Castelo, Ibatiba, Ibitirama, Irupi, Jerônimo Monteiro, Muniz Freire, Muqui, Vargem Alta, Venda Nova do Imigrante, Itapemirim, Cachoeiro do Itapemirim, Marataízes, Iúna e Lajinha.
“Muito comum é afirmar que um rio nasce num determinado município, que banha tal cidade. Fica a impressão de que um rio se desviou do seu rumo para banhar tal cidade ou tivesse ficado orgulhoso de nascer num determinado município. O rio Itapemirim não banha Cachoeiro do Itapemirim. A cidade é que se ergueu em suas margens”, ressaltou Gilson.
Segundo Gilson Eleutério, o nome da cidade deriva de um aspecto geográfico: os cachoeiros ou as cachoeiras do Rio Itapemirim. Por causa disso, o município, como muitos outros do País, desenvolveu-se a partir do rio.
“Logo após o ciclo do ouro, veio o da cana-de-açúcar e o do café, com os fazendeiros portugueses que tinham, como mão de obra, os escravos. Com a abolição da escravatura, teve início a imigração de europeus que entraram pelo porto de Itapemirim, subindo o rio do mesmo nome, para ocupar o lugar dos escravos e formar colônias e, posteriormente, desbravar as terras disponíveis”.
* De Paula Comunicação
Primeiro quartel às margens do rio
Foi o então governador do Estado, Francisco Alberto Rubim, seguindo orientação da Carta Régia que recebeu em 1816, quem mandou proteger a colonização do interior do sul espírito-santense, de acordo com a professora de História Márcia Lopes.
Na gestão de Francisco, de 1812 a 1819, consta a criação de um destacamento policial, com 30 soldados, denominado Quartel da Barca, localizado à margem do Rio Itapemirim, em frente à primeira cachoeira e a seis léguas acima da Vila de Itapemirim, justamente onde é hoje a cidade de Cachoeiro de Itapemirim. Foi o primeiro às margens de um rio.
Segundo a historiadora, a proteção era garantida por patrulhas de soldados, que saíam da Vila de Itapemirim atingindo, pela praia, o Quartel de Boa Vista, próximo à Ponta do Siri, e, alcançando, a estrada, penetravam pelo interior até ao Quartel da Barca, de onde retornavam a Vila de Itapemirim pelo rio.
Porém, outra patrulha saía do Quartel da Barca e por outra estrada atingia Piúma, seguindo pela praia até a Vila de Itapemirim e, subindo o rio, alcançava o ponto de partida. Enquanto uma patrulha seguia estas direções, outra fazia o caminho inverso.
Pouco depois, foram criados dois novos quartéis, tendo em vista a crescente abertura de fazendas.
Eram os quartéis de Duas Barras, na junção do Rio Castelo com o Rio Itapemirim, e Aquidabã – este situado em frente ao bairro Ilha da Luz –, que, com o Quartel da Barca, protegiam Cachoeiro.
Pedágio em ponte de Cachoeiro
O primeiro pedágio do Estado, de acordo com o historiador Gilson Eleutério, ocorreu com cobranças para quem fosse atravessar a Ponte Municipal, inaugurada em 1887, que ligava uma margem à outra do Rio Itapemirim, em Cachoeiro.
A obra foi particular, mas a Câmara Municipal, presidida por Carlos Bernardino Maciel, decidiu os valores a serem cobrados.
No primeiro pedágio do Estado, quem atravessasse tinha de pagar a tarifa e não havia diferença no valor se a pessoa estivesse calçada ou descalça.
Gilson Eleutério disse que “há documentos históricos que mostram que os administradores da ponte municipal estabeleceram uma tabela detalhando muito bem os valores”.
De acordo com ele, pessoas calçadas pagavam 60 réis apenas para uma travessia. Para ir e voltar, o valor era de 100 réis. Por cabeça de gado, a cobrança era de 120 réis. Se o dono fosse passar com mais de um animal, pagava 100 réis por cada um deles.
As aves não ficaram de fora da cobrança. Se fossem conduzidas ou tocadas, o proprietário teria que pagar 20 réis por cada uma.
Já os carros de boi com eixo fixo carregados pagavam 1 mil réis. Com eixo móvel, a cobrança era de 1.500 réis para os carregados e 600 réis para os vazios.
Carroças com duas rodas carregadas pagavam 500 réis. Vazias, 200 réis. Os carrinhos liteira, aquelas cadeiras portáteis sustentadas por duas varas e levadas por homens ou animais de carga, de duas rodas, pagavam 500 réis.
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Datas relativas ao Rio Itapemirim - Algumas curiosidades com o passar dos anos
1503
o navegador português Gonçalo Coelho visita a costa capixaba, chegando a foz do Rio Itapemirim em 1° de julho de 1503.
1556
Pero de Magalhães de Gándova publica, em Lisboa, a obra “História da Província de Santa Cruz”, que relata a descoberta do Rio Itapemirim por Gonçalo Coelho. Fernão Cardim ratifica e registra a obra, incluindo também a descoberta do manate (peixe-boi), que foi descoberto pelos índios puris e goytacazes e era encontrado em grande quantidade no rio.
1560
O padre José de Anchieta, também em Carta Provincial Geral, faz referência ao manate e ao grande Iguaraguã (nome dado ao Rio Itapemirim pelos índios).
1815
Constituição do Quartel da Barca, às margens do rio Itapemirim (hoje bairro Baiminas).
1887
Surge o primeiro pedágio do Estado, sobre o rio Itapemirim.
Fonte: Especialistas entrevistados.
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