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Brasil

Pioneira em tatuagem ocular no Nordeste devolverá olhar a idoso que a inspirou

A dor de seu João comoveu a médica do Hospital Santa Luzia, que aprendeu a nova técnica e a trouxe para a região nordestina


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Imagem ilustrativa da imagem Pioneira em tatuagem ocular no Nordeste devolverá olhar a idoso que a inspirou
|  Foto: Divulgação/arquivo pessoal do paciente

A porta do edifício Village Gurgel, no bairro dos Aflitos, Zona Norte do Recife, abre-se quase todas as manhãs para João Alfredo Barros, de 66 anos, durante seu plantão. Há anos, o porteiro conhece cada rosto que entra e sai. Mas nem sempre consegue ver como queria.

Desde 2009, o olho esquerdo de seu João, antes castanho como o direito, tornou-se uma neblina esbranquiçada, um traço da conjuntivite e outras complicações sérias que lhe tiraram a visão de forma irreversível. Os óculos escuros passaram a ser parte de sua rotina. O desconforto, um companheiro silencioso.

Nesta sexta-feira (31), por volta de meio-dia, a rotina de seu João mudará. Ele se submeterá a um procedimento chamado ceratopigmentação, que devolverá ao seu olho esquerdo uma aparência semelhante ao direito, com a mesma simetria e cor.

Castanha, a cor da esperança

A mudança não trará de volta a visão perdida, mas lhe dará algo que ele já não esperava sentir: a sensação de se enxergar por inteiro. O procedimento utilizado visa deixar um olho semelhante ao outro. E, para ele, a cor da esperança é castanha.

“Dou glória a Deus”, ele diz. “No dia 11, tive a consulta com a doutora Manuela. Fiquei muito ansioso, muito emocionado. Eu uso óculos escuros todos os dias porque tenho vergonha. Acredito que vai ser muito bom para minha autoestima. É muito ruim ter um olho diferente.”

Pioneirismo e humanidade: a história de seu João e a Dra. Manuela

Imagem ilustrativa da imagem Pioneira em tatuagem ocular no Nordeste devolverá olhar a idoso que a inspirou
A oftamologista Manuela Tenório conheceu seu João há cerca de um ano |  Foto: Dayvison Nunes/divulgação

A história de seu João encontrou um novo caminho quando cruzou com a de Manuela Tenório Cardoso, a oftalmologista que o atenderá. Eles se conheceram há cerca de um ano. Moradora do edifício onde ele trabalha, foi no dia a dia das idas e vindas que a médica percebeu o desconforto do porteiro, que trabalha em escala de 12h por 36h.

“Seu João é porteiro do prédio em que moro. Uma pessoa muito gentil e atenciosa, mas que demonstra desconforto por sua condição ao estar sempre de óculos escuros. Ele foi uma motivação para que, em 2024, eu fosse conhecer de perto o que Dr Alexandre Costa tem feito no país”.

No ano passado, ao se aprofundar no assunto, a oftalmologista encontrou a técnica desenvolvida na Coreia do Sul e aprimorada por especialistas no Brasil. Dra Manuela decidiu ir além e se especializar na área para ajudar seu João e outras pessoas com problemas semelhantes. Agora, no Hospital Santa Luzia, ela é pioneira em ceratopigmentação no Nordeste.

“Acompanhei o trabalho de Dr. Alexandre Costa, que conheci na Unifesp (em São Paulo). Ele e Giovani Garotti desenvolveram técnicas e se envolveram na aprovação de materiais que possibilitam o procedimento hoje”, conta Manuela. “Eles têm feito a diferença na vida de muitas pessoas, resgatando a autoestima e reinserindo-as na sociedade.”

O que é tatuagem ocular?

A ceratopigmentação é um procedimento cirúrgico em que o estroma da córnea é pigmentado para modificar sua coloração. O tempo de recuperação pode durar até 30 dias.

No Brasil, só é permitido em olhos sem prognóstico visual, como o de seu João. Segundo dra. Manuela, existem diferentes técnicas, cada uma adequada a um tipo específico de condição ocular. No caso dele, a escolha foi feita com base na opacidade da córnea.

“A cirurgia não melhora a acuidade visual. O objetivo é devolver a autoestima, permitir que ele se sinta confortável sem precisar esconder o olhar. É devolver o contato visual que deixou de existir sem as lentes escuras”.

Curiosidade

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O estroma da córnea é a camada intermediária do olho, composta principalmente por colágeno, e tem um arranjo em camadas que contribui para a transparência da córnea e sua capacidade de focar a luz |  Foto: Tribuna Online

O estroma da córnea é a camada intermediária do olho, composta principalmente por colágeno, e tem um arranjo em camadas que contribui para a transparência da córnea e sua capacidade de focar a luz. Essa estrutura fibrosa e organizada, se observada ao microscópio, pode lembrar padrões geométricos que, em alguns casos, podem ter semelhanças com a maneira como as pétalas de um girassol se organizam ao redor de um centro, mas a analogia é mais estilística do que biológica. Ele fica entre o epitélio (camada externa) e o endotélio (camada interna).

Um novo olhar, uma nova vida: a história de superação de João

O olhar que seu João escondeu por tanto tempo guarda histórias. Nascido em Vitória de Santo Antão, ele vive há mais de 40 anos em Moreno, na Região Metropolitana do Recife. Tem dois filhos, Bruno (40) e Bruna (31).

Ele vem de Moreno para o Recife exercer seu trabalho. Seu dia a dia como porteiro se desenrola entre cumprimentos, diálogos e a atenção constante às entradas e saídas. Foi nesse cotidiano que encontrou o olhar atento da doutora Manuela.

Ela se lembra da conversa em que mencionou pela primeira vez a possibilidade do procedimento.

“Ao voltar do meu curso (no ano passado), comentei com seu João que poderíamos fazer isso. Ele ficou muito feliz e emocionado. Contou que, em 2009, desenvolveu uma úlcera que não melhorou com o tratamento. Houve perfuração e necessidade de um transplante para salvar o olho, mas não a visão.” O transplante foi rejeitado. Mais tarde, novas complicações exigiram um novo procedimento, mas a visão nunca voltou.

A beleza da ciência e a ciência da beleza

Pelo olho esquerdo, João percebe a claridade, mas não enxerga formas. Quando seu olho receber a pigmentação, ele se verá de forma diferente no espelho. “Entre as melhores coisas do ser humano, está a visão”, ele diz. “Se Deus quer fazer o milagre, ele faz.”

A comunidade médica ainda se adapta à técnica. Muitos ouviram falar dela apenas por causa da polêmica em torno da mudança estética da cor dos olhos, um uso que ainda não é autorizado no Brasil.

Nos Estados Unidos, na Espanha e no Panamá, já é possível modificar a cor de olhos saudáveis, mas ainda não há estudos suficientes para garantir a segurança da prática. No caso de olhos sem visão, no entanto, a técnica vem se consolidando como uma solução estética e funcional.

“O procedimento precisa ser bem indicado”, explica Manuela. “É importante alinhar as expectativas do paciente, avaliar o quadro clínico e garantir que não haja doenças ativas. A escolha da técnica e a realização em ambiente hospitalar reduzem riscos. Além disso, o acompanhamento no pós-operatório é essencial.” O tempo de recuperação varia, mas, em geral, em 30 dias o paciente recebe alta.

Para João, a espera tem sido longa. Ele aguarda a sexta-feira com uma mistura de ansiedade e esperança. O que muda quando o espelho volta a refletir um olhar completo? Ele ainda não sabe. Mas imagina.

“Eu não esperava por isso. Só tenho a agradecer à doutora Manuela. Fiquei muito emocionado.”

Mudança no olhar de muitos

Manuela compartilha da mesma expectativa. Depois de João, virão outros pacientes, outras histórias e outras possibilidades de reconstrução. A técnica ainda é recente no Brasil, mas os avanços são promissores.

“Estou entusiasmada com os avanços trazidos para pigmentação da córnea e com a possibilidade de ajudar pessoas como seu João. No depoimento das pessoas que passaram pelo procedimento, é marcante a mudança que ele traz”, diz a médica. “É um verdadeiro um pingo de tinta no coração.”

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