Fabricantes e bares apostam na confiança na relação com a clientela
As principais companhias de destilados que atuam no País estão se movimentando no sentido de dificultar a vida dos falsificadores, o que se tornou mais urgente após a descoberta de fábricas clandestinas que forneceram bebidas contaminadas com metanol.
A Diageo, por exemplo, acaba de lançar a campanha “Da nossa fábrica pro seu drink”, cujo pilar central é uma plataforma de comunicação que ajuda o consumidor a comprar de forma segura. O site do The Bar, e-commerce oficial da Diageo, passa também a oferecer novas funcionalidades como uma lista dinâmica de varejistas e revendedores homologados. Além disso, um canal de WhatsApp orienta consumidores, bares e restaurantes sobre onde comprar de forma segura usando geolocalização.
A Brown-Forman, responsável por marcas como Jack Daniel’s, aprimorou o seu atendimento via SAC – informando quem são seus distribuidores homologados. Além disso, a companhia faz parte do grupo de trabalho do governo do Estado e de campanhas da Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD) e Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe).
“Como toda a sociedade, nós também fomos vítimas dos falsificadores e dos comerciantes que, diante de um produto 50% mais barato, sabiam o que estavam fazendo ao comprá-los”, disse André Duarte, Senior Public Affairs Managers da Brown-Forman.
Já Benoît Laug, CEO da Pernod Ricard Brasil, afirmou que a empresa “opera sob os mais rigorosos padrões de qualidade nacionais e internacionais, apoiados por certificações reconhecidas, auditorias rigorosas e controles abrangentes em todas as etapas de nossa cadeia de produção”. “Isso inclui protocolos de testes avançados para cada ingrediente e em cada lote antes do engarrafamento e envio para o mercado. Essas medidas são projetadas para garantir que nossos produtos atendam aos mais altos padrões de segurança e autenticidade.”
Companhias como a Bacardi-Martini, a Beam Suntory e a Campari também mantêm e ampliaram programas de combate à falsificação.
O movimento de bares especializados em coquetelaria chegou a cair até 80% no auge da crise do metanol. Para recuperar a confiança do consumidor, as casas estão aprimorando procedimentos internos e a comunicação com os clientes. “A questão é mostrar para o cliente que trabalhamos com seriedade”, disse Fernando Dlouhy, gerente do Cascasse il Mondo Bar, na Pompeia, zona oeste. “A crise foi um momento de estreitar o laço com nossos clientes e de personalizar ainda mais o nosso atendimento”, afirmou Ricardo Miyazaki, do The Punch Bar, no Paraíso, na zona sul.
Luciano Ricarte Silva, proprietário do Mundi Bar, no centro, lembrou a pandemia. “Não tem vacina. A vacina é a confiança, que precisa ser recuperada.” Silva tem promovido masterclass sobre destilados, convidando o consumidor a conhecer melhor os produtos.
Gabriel Santana, do Santana Bar (Pinheiros, zona oeste) e do Cordial (centro), articula a criação de uma “rede de confiança” em que bares recomendam outros estabelecimentos idôneos para clientes. “A ideia é que os bares de uma mesma região criem essa sinergia, e todos se responsabilizem por todos”, disse Santana.
Já Jean Ponce, proprietário do Guarita (Pinheiros), Fechado (Consolação) e outros, aponta atitudes práticas para resguardar a qualidade dos produtos. “Temos toda a equipe treinada para receber mercadorias. Todo mundo aprendeu a fazer conferência. Só aceitamos fornecedores certificados. Se não tiver o registro da empresa, não recebemos o produto”, afirmou Ponce.
Além disso, Ponce está fechando uma parceria para adquirir uma máquina de descarte de garrafas. “A ideia é que bares vizinhos possam usar a máquina para garantir que nenhuma garrafa seja reaproveitada por falsificadores.”
Já Cairê Aoas, da Fábrica de Bares, destacou a criação do selo Drink Seguro e a assinatura de termo de responsabilidade com a Diageo que garante a compra apenas de distribuidores homologados em todas as casas do grupo. “A lição que fica é o risco de comprar produtos com preços distantes da realidade. É um risco sanitário e um risco para a saúde pública. Não se pode colocar ninguém em risco por conta de diferença de valores.”
O Grupo Carrefour Brasil e todas as suas bandeiras (Carrefour, Atacadão e Sam’s Club) informou que adquire bebidas destiladas exclusivamente de fabricantes oficiais, em lotes controlados. “As embalagens chegam lacradas e vedadas pelo produtor, o que assegura autenticidade, qualidade e segurança. A companhia mantém procedimentos rigorosos de controle no recebimento, com verificação documental e conferência física das mercadorias, garantindo total rastreabilidade desde a origem até as prateleiras.”
Hellen Tatiana Lima, diretora comercial do Assaí Atacadista, afirmou que mantém critérios rigorosos de controle. “Nossos fornecedores passam por qualificação cadastral e de compliance. No recebimento, realizamos uma checagem que concilia as informações documentais com a verificação física de lotes, datas de fabricação/validade e integridade de lacres/selos e embalagens, além do registro sistêmico do lote e do destino por loja e/ou centro de distribuição. Trabalhamos exclusivamente com fabricantes oficiais”, disse.
O Grupo Pão de Açúcar informou, em nota, que todas as bebidas alcoólicas comercializadas pela rede Pão de Açúcar e Extra Mercado são adquiridas diretamente da indústria fabricante e distribuidoras próprias, cumprindo requisitos legais e regulatórios do setor, e dentro de rigoroso e responsável processo de compra. “A companhia segue comprometida em atuar de maneira responsável, prezando pela segurança e a qualidade na comercialização de produtos vendidos nas lojas e canais online.”
Segundo a Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), o setor realiza cerca de 350 mil eventos por ano. “Trabalhamos com treinamentos para a identificação de produtos adulterados. E aderimos a uma campanha da Diageo em que apresentamos ao público dos eventos que os produtos saem direto das fábricas”, disse Doreni Caramori Jr., presidente da Abrape. “Essa é a oportunidade de profissionalizar todo o setor”, disse.
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Inicialmente, o Sindicato dos Clubes do Estado de São Paulo (Sindi Clubes) recomendou a associados que parassem de vender destilados e sugeriu a análise de estoques. “Agora, estamos começando o processo de retomada. Com parcerias com a indústria e seguros da procedência, recomendamos aos clubes que retomem a comercialização de destilados”, disse Sérgio Nabhan, presidente do sindicato. A retomada marca também a parceria com a Diageo.
Desde o início dos registros de intoxicações, consumidores adotaram a confiança como critério na opção pelo consumo. A designer e produtora de conteúdo Luísa Carvalho, de 23 anos, disse que ficou bastante preocupada no início, mas retomou a confiança e visitou bares que já conhecia. “Fiquei quase um mês longe dos bares, mas agora estou voltando aos poucos e muito mais segura.”
A fotógrafa Graziella Widman, de 49 anos, relatou como tem atravessado esse período. “A primeira reação foi evitar tomar destilados fora de casa. Aos poucos foram aparecendo as notícias de onde vieram as bebidas adulteradas. Consultei um amigo que entende de bar e fomos a um bar confiável. Bebemos tranquilas”, contou.
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