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Brasil

Cemitério colonial encontrado no Recife tem mais de 180 ossadas: ‘É um campo minado’, diz arqueóloga


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Um cemitério do período colonial brasileiro foi encontrado no Recife, sob o chão da comunidade do Pilar, no centro histórico da capital pernambucana. O imenso acervo de pelo menos 400 anos de história soterrados está sendo revelado aos poucos no Bairro do Recife, mais conhecido como Recife Antigo. Mais de 180 esqueletos de diferentes períodos históricos foram retirados do local desde o início das escavações, em 2010. Esse número, no entanto, pode ser muito maior.

Na retomada dos trabalhos em 2025, a descoberta de novas zonas de concentração de ossadas surpreendeu os arqueólogos. Somente nas primeiras semanas de janeiro cerca de 20 esqueletos foram retirados. “É um campo minado, onde a gente mexe tem esqueleto. Hoje mesmo apareceram quatro”, revela Ana Nascimento, arqueóloga da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e coordenadora de campo das escavações. O Sítio do Pilar já é considerado o maior achado arqueológico urbano do Brasil.

O nome da região faz referência à Igreja de Nossa Senhora do Pilar, inaugurada em 1680 na zona portuária do Recife. Ao longo das últimas décadas, a comunidade se estabeleceu ao redor da igreja do Pilar, em meio a prédios abandonados e construções históricas. Ana Nascimento explica que, no início do mês, a equipe decidiu escavar uma parte da Rua de São Jorge, que passa pela lateral da Igreja do Pilar, com o objetivo de confirmar o encerramento dos trabalhos nessa parte do sítio.

“Para nossa surpresa, só numa área de 2 metros por 15 a gente achou 20 esqueletos. Em uma área de 2 por 5 (metros) a gente encontrou 11 indivíduos sobrepostos”, ressalta a pesquisadora. A enorme quantidade de esqueletos dispostos em diferentes camadas e posições levanta diversos questionamentos para arqueólogos e historiadores. O próximo passo das escavações é verificar se existe uma conexão entre essas áreas de concentração, o que aumentaria ainda mais o tamanho do cemitério.

Mesmo com o processo de pesquisa ainda em andamento, a alta profundidade em que alguns esqueletos foram encontrados revela que os enterros ocorreram desde o início da colonização da capitania de Pernambuco, a partir de 1534. Entre os esqueletos já analisados, a maioria apresenta características europeias, de acordo com a arqueóloga. Entretanto, ela ressalta que muitas ossadas aguardam análise e a tendência é que novas sejam encontradas.

Apenas dois esqueletos são de mulheres, sendo uma adolescente. Há um caso de um bebê enterrado em um caixão de madeira. Embora outros esqueletos também tenham sido encontrados em caixões, a posição dos ossos indica que a maioria dos enterros aconteciam com o uso de mortalhas, um tipo de tecido que envolve o corpo. Alguns esqueletos apresentam desgaste nos dentes, o que pode indicar doenças e hábitos típicos do período colonial, como o uso excessivo de cachimbo.

Para encontrar essas respostas, a UFRPE está desenvolvendo pesquisas com amostras de DNA para identificar a origem dessas pessoas e construir um panorama dessa população. Além disso, os pesquisadores do Sítio do Pilar encontram diariamente objetos de diferentes períodos históricos, como balas de canhão, cachimbo, louças, cerâmicas e garrafas que já somam cerca de 200 mil fragmentos.

O Sítio do Pilar foi descoberto em 2010, após o início dos procedimentos para a construção do conjunto habitacional do Pilar. Por se tratar de uma região tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o local passou por uma vistoria arqueológica protocolar, que identificou os primeiros vestígios. Nos primeiros anos de escavação, a Fundação Seridó, vinculada à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), encontrou 30 esqueletos.

A partir de 2015, a UFRPE assumiu as escavações, por meio da Fundação Apolônio Salles (Fadurpe). Com o avanço das pesquisas, principalmente após a pandemia de covid-19, os arqueólogos constataram que se tratava do maior achado arqueológico urbano do Brasil. Em 2025, as escavações têm demonstrado que esse acervo pode ser ainda maior.

Passado de guerras

As escavações no Sítio do Pilar também revelaram que a Igreja do Pilar foi construída sobre as bases do antigo Forte de São Jorge, erguido entre 1597 e 1603. O Recife Antigo é uma ilha que se conecta com Olinda por meio de um istmo, uma estreita faixa de areia entre duas porções de terra. A comunidade do Pilar está situada entre o Porto do Recife e o começo do istmo que levava até Olinda. O historiador Bruno Miranda, da UFRPE, ressalta que antes do governo holandês (1630-1654) o Recife funcionava como um porto de Olinda, por meio do istmo.

Miranda explica que a região do Sítio do Pilar era local de passagem constante de pessoas e mercadorias, além de localização estratégica para defesa militar. Em 1630, os holandeses atacaram Olinda, então capital da província, e transformaram Recife na capital da colônia neerlandesa. Ao menos 12 novas fortificações foram construídas no Recife e o Forte de São Jorge passou a funcionar como enfermaria.

Em substituição ao Forte de São Jorge, foi construído o Forte do Brum. Atualmente o local funciona como museu e é aberto à visitação pública. O funcionamento do Forte de São Jorge como enfermaria é outro dado histórico que pode ajudar a entender a prática de enterros no local e a origem dos esqueletos.

Bruno Miranda, autor de uma tese de doutorado sobre o exército holandês durante a colonização em Pernambuco, ressalta que as doenças mataram mais soldados do que as guerras. Ao todo, foram mais de 26 mil militares da Companhia das Índias Ocidentais, como eram chamados os holandeses, enviados para Pernambuco entre 1629 e 1951. Entre esses soldados, a maior parte era oriunda dos países baixos, mas parte significativa das tropas era formada por soldados alemães, espanhóis e franceses.

Após a retomada de Pernambuco pela colonização portuguesa, a Igreja do Pilar foi construída em 1680, por cima das ruínas do antigo Forte e da enfermaria. A pesquisadora Ana Nascimento ressalta que o local continuou sendo utilizado para enterros, já que era comum do período colonial a realização de sepultamentos em igrejas.

Além disso, nos anos seguintes a população do Recife foi acometida por diversas epidemias, como a cólera, febre amarela, varíola, gripe espanhola e outras. Os vestígios arqueológicos incluem ainda fragmentos do período da revolução industrial, quando o bonde do Recife passava pela região do Pilar, entre o fim do século XIX e início do século XX.

Projeto habitacional e turístico

O projeto das unidades habitacionais do Pilar pretende construir 588 apartamentos para famílias cadastradas. Desde o início das obras, 192 moradias foram entregues. O presidente da Autarquia de Urbanização do Recife (URB), Luís Henrique Lira, afirma que uma das quadras que ainda restam será entregue neste semestre, com um total de 128 novas moradias.

Segundo o presidente da URB, o projeto urbano do Pilar envolve a construção de uma creche, um posto de saúde e uma escola municipal primária, que já foram entregues.

As outras duas quadras, a 55 e 60, aguardam a inspeção arqueológica. A quadra 55 é a que está em processo de escavação atualmente, onde estão sendo encontrados diversos esqueletos. Com a descoberta de novos pontos de concentração de esqueletos na Rua de São Jorge, que fica próxima a quadra 55, o processo de escavação pode ganhar novas etapas. O terreno analisado, no entanto, é restrito à parte que será ocupada pelos prédios. Para expandir as análises arqueológicas para além do terreno que será ocupado pelas unidades habitacionais, seria necessário um projeto especial do Iphan.

A Prefeitura do Recife pretende transformar o espaço em um circuito turístico, aproveitando a proximidade da Igreja do Pilar com o Terminal Marítimo de Passageiros. A ideia é criar um circuito turístico, transformando as ruínas do Forte de São Jorge em um museu a céu aberto, conectado com as ruínas da antiga muralha do Recife, na Rua do Bom Jesus. A muralha foi construída durante a colonização holandesa como forma de proteção às tentativas portuguesas de retomada da capitania de Pernambuco.

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