Ex-presidiários viram jogo e se tornam empresários
Regenerados depois de cumprir pena, eles superam o preconceito e fazem investimentos, obtendo sucesso com o próprio negócio
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Apesar de todo o estigma que carregam por serem ex-presidiários, muitos egressos do sistema prisional conseguem abrir caminho em meio às barreiras que se levantam para quem saiu da cadeia.
Oportunidades se fecham e o preconceito passa a ser um novo desafio para quem cumpriu a pena e foi rumo à liberdade. Ainda assim, muitos deixam as prisões decididos a mudarem de vida.
“Eu já quis sair do País. Perdi oportunidades porque fiquei fichado. As portas se fecham e a gente percebe o erro que cometeu no passado. Ele não é perpétuo, mas até ele passar você tem contas para pagar. A gente precisa ter um sustento. Isso me motivou a buscar uma profissão”, conta o barbeiro Fabio Vinicius, de 36 anos.
Condenado por assalto, o barbeiro considera que tenha ficado cerca de 10 anos na prisão, entre idas e vindas.
“Perdi muitas pessoas. Da última vez que isso aconteceu, eu decidi mudar totalmente de vida. Quando a mudança vem de dentro, a pessoa tem sucesso”.
Fabio conta que começou a cortar cabelo quando ainda estava preso e os elogios que recebia o motivaram a seguir a profissão.
“Eu cortava o cabelo de alguns internos lá dentro. A gente tinha um pentezinho de plástico. Falavam que eu levava jeito, que eu seria um bom barbeiro. Coloquei em prática isso aqui fora. Hoje temos uma clientela muito boa. Meus clientes sabem da minha história e me apoiam muito”, relata.
Fabio explica que a barbearia é fonte do seu sustento. Com o negócio, ele consegue pagar as contas da casa em que mora com a esposa e atualmente está conseguindo emitir a carteira de motorista.
“Chegamos na porta da barbearia em Vila Velha e já tem 7 ou 8 clientes esperando. Tem gente que sai de Vitória, Campo Grande, Terra Vermelha... Eu vejo isso com muito carinho”, admite.
Fabio continua estudando e fazendo cursos e admite que pretende abrir mais uma barbearia.
“A gente sempre tem o pensamento em crescer, meu pensamento é de abrir em outros lugares. Já fomos até olhar ponto”.
Apaixonado por caminhões
Apaixonado por caminhões desde a infância, o operador de máquinas Maxwell Lopes, de 32 anos, sonhava em trabalhar como caminhoneiro enquanto ainda estava cumprindo pena por tráfico.
“O caminhão foi o primeiro projeto que eu tive, logo que eu saí da cadeia. Eu estava decidido a mudar de vida. Mas assim que saí, as coisas não foram tão fáceis. Não era só ter disposição de trabalhar e mudar de vida, a realidade não é assim”.
Em liberdade, Maxwell começou a trabalhar e juntou dinheiro para realizar o sonho. Após sete anos, ele conseguiu comprar o veículo.
Na mesma época, o pai dele, Sebastião Pereira de Souza, ficou desempregado. Então, eles resolveram empreender no ramo de logística e hoje trabalham como sócios.
Maxwell organiza as viagens e entregas, enquanto o pai dele pega a estrada. “Parecia impossível, mas eu coloquei na cabeça que não iria desistir. Agora já planejo comprar outro caminhão”.
Emprego diminui retorno ao crime
Ainda que seja amplamente difundido por especialistas em políticas penitenciárias, estudos e levantamentos demonstram que o trabalho e o emprego diminuem a taxa de reincidência de egressos do sistema prisional.
Um levantamento mostrou que o retorno às penitenciárias é de apenas 2% entre os ex-detentos que conseguiram um emprego.
A situação foi observada pelo Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF) do Mato Grosso.
Para o professor de Gestão e Negócios da Faesa, Henrique Hamerski, uma das formas de tentar amenizar essa situação é estimular uma mentalidade empreendedora nos detentos das penitenciárias.
“Eu vejo no empreendedorismo a grande oportunidade para egressos do sistema prisional. Para eles que já receberam tantos nãos, essa área é uma oportunidade de botar em prática suas características, habilidades e deixar um pouco de lado o histórico que foi criado”.
A professora de Administração da Fucape, Amanda Zambelli, considera que é preciso mostrar aos detentos que é possível trilhar um caminho diferente.
“A gente consegue sonhar quando vemos que o outro também conseguiu. Tem que trazer pessoas que passaram por isso para conversar com eles”.
OS NÚMEROS
>>> 98% dos que conseguem emprego jamais voltam para a prisão
Raio X
População carcerária
Número total - 22.838
Mulheres - 1.002
Homens - 21.836
Faixa etária
de 25 a 29 anos- 6.040
de 18 a 24 anos - 5.603
de 35 a 45 anos- 5.160
de 30 a 34 anos- 4.274
de 46 a 60 anos- 1.876
de 61 a 70 anos- 369
*Dados mais incidentes
Grau de escolaridade dos presos
Ensino médio completo -17,73%
Ensino médio incompleto - 14,32%
Ensino fundamental completo - 13,76%
Ensino fundamental incompleto -50,39%
Superior completo -0,52%
Superior incompleto - 1,18%
Analfabeto - 1,09%
Alfabetizado sem estudo formal - 0,23%
Crimes mais cometidos
| Masculino
Tráfico de drogas/Associação ao tráfico - 7.940
Homicídio -3.135
Roubo -2.805
Estupro de vulnerável - 1.179
Furto - 947
| Feminino
Tráfico de drogas/Associação ao tráfico - 624
Homicídio - 142
Roubo - 64
Furto -58
Estupro de Vulnerável - 21
Sobre os dados
Dados referentes a 13/09/2022.
O quantitativo é referente aos presos provisórios e condenados.
Segundo a sejus, os números não incluem todos os crimes.
Fonte: Secretaria de Justiça
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