A manada
Quando a vida imita a savana e nos ensina sobre vigilância e sobrevivência
Dia desses assisti a um documentário sobre os cuidados que a maioria dos bichos deve ter lá na África por conviver com espécies ferozes em um mesmo ambiente. Achei interessante o ritual da hora de beber água. O primeiro a ir até o rio é o chefe da manada. Ele chega cauteloso, certificando-se de que lá não está nenhuma besta feroz à espreita.
Se a barra estiver limpa ele retorna e chama o restante da manada. Vão todos às pressas, em uma correria desesperada causada não pela sede, mas pelo medo. É assim que chegam na beira do rio e começam a beber água nervosamente, sempre olhando para os lados e controlando o ambiente. Ao redor, sempre vigilante, o chefe da manada - pronto a dar o alarme caso alguma fera apareça.
Neste caso, cada animal sabe o que fazer: sair numa correria desesperada. O último é sempre o chefe - que, para salvar o restante da manada, acaba virando comida de alguma besta feroz.
Choca-me principalmente a falta de dignidade imposta aos animais mais pacíficos, sempre obrigados a viver às escondidas ou correndo de um lado para o outro. As atividades mais banais, tais como pastar ou beber água, se transformam em momentos de risco, nos quais a dignidade vai cedendo espaço ao instinto de sobrevivência.
Pois é. Mas, mudando de assunto, há alguns dias saí para jantar fora com um casal amigo. Eles resolveram levar os dois filhos, ainda crianças. Vivemos momentos agradáveis. Por volta das oito da noite fomos embora.
Impressionou-me, então, o treinamento da família. O primeiro a sair do restaurante foi o meu amigo. Olhou para um lado e para o outro, foi até o carro, contornou-o, certificando-se de que não havia ninguém perto e, de lá, fez um sinal de positivo para a esposa e os dois filhos.
Estes, então, disciplinadamente, saíram quase correndo rumo ao carro. Cada um já sabia o que fazer, abrindo sua porta e entrando apressadamente. Enquanto isso o motor foi ligado e o veículo preparado para sair.
Conversando depois com meu amigo, fui informado de que toda a família passou realmente por um treinamento. E acrescentou que em caso de emergência todos já estão preparados. Assim, ele deverá ficar e encarar a situação do jeito que for possível - e se não for possível, que se sacrifique pelos demais. Quanto à esposa e filhos, deverão sair correndo, cada um para um lado, abanando os braços e gritando por socorro.
Mas, perdoem-me, ainda sobre a África aprendi algo interessante naquele documentário. Disseram que uma das maneiras de diferenciar um animal pacífico de outro violento é através dos olhos.
Eis aí algo curioso: os olhos dos animais mansos ficam na lateral da cabeça - posição que torna mais fácil controlar o ambiente ao redor. Em resumo, dá para vigiar melhor se alguma fera está se aproximando. Já quanto a estas, os olhos invariavelmente ficam na frente do crânio, possibilitando um maior foco nas vítimas e uma caçada mais eficiente.
E é assim, inspirado pela vida nas selvas, que fico a pensar se não deveríamos ter os olhos ao lado das orelhas.
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