Suspeito de matar bancária em Gaibu é preso novamente, agora por preventiva
Luan Lucas, companheiro de Érica Francisca, é apontado como autor do feminicídio; defesa nega crime e cita falta de provas materiais
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O motorista de aplicativo Luan Lucas Ribeiro da Silva, 27 anos, voltou para a prisão nesta terça-feira (19), suspeito de assassinar a bancária Érica Francisca da Silva, 38 anos, encontrada morta no dia 20 de fevereiro em Gaibu, no Cabo de Santo Agostinho.
Ele havia sido solto na segunda (18), após cumprir 60 dias de prisão temporária, mas retornou à cadeia por força de um mandado de prisão preventiva. O caso foi divulgado no Brasil Urgente, com exclusividade, e depois no JT1.
Segundo a investigação da Polícia Civil, Érica foi vítima de feminicídio cometido pelo companheiro, com quem morava há cerca de um ano. Familiares relataram que ela vivia uma relação abusiva, marcada por episódios de controle e violência psicológica.
Pouco antes de desaparecer, no dia 18 de fevereiro, a bancária havia informado à mãe, em uma chamada de vídeo, que estava com medo de Luan. A bancária contou que ele estava na casa de praia com ela. O nome da mãe não foi divulgado.
Último contato com a mãe
“Aí eu disse assim: se tu tá com medo, então vem embora. E ela simplesmente desligou. Aí na terça-feira (19) a gente ficou até 22 horas da noite ligando, nada dela responder.
Quando foi na quarta-feira (20) ele foi lá (em casa), dizendo que a amava, dizendo que não fez nada com ela, dizendo que ela foi pra praia. Eu disse: ‘ela foi pra praia?’ Ele disse: ‘sim, foi pra praia’.
Eu digo, ‘como é que ela foi pra praia? Ela disse a tu?’ Aí a ficha caiu.
Segundo a mãe, o ex-marido era extremante ciumento e acompanhava os passos da mulher até quando ela ia fazer unha.
“Ela não vivia feliz. Não vivia feliz, vivia curso, bem dizer. Porque o homem, a cara do homem assustava a gente. Inclusive a família todinha se afastou dela, porque ninguém ia com a cara do cara”, contou a mãe da vítima.
O corpo de Érica foi localizado em uma área deserta de Gaibu. De acordo com familiares, além de sinais de asfixia, a vítima apresentava múltiplos ferimentos, incluindo lesões graves na cabeça. Ela estava de roupa de dormir, o que reforça a suspeita de que o crime tenha ocorrido dentro da residência do casal.
Incêndio e transferências bancárias
Meses antes, quando pediu a separação, Érica sobreviveu a um incêndio registrado em sua casa. O fogo teria começado embaixo da cama, e a bancária ficou com os pés queimados.
Após a morte, a polícia descobriu que duas transferências via Pix, de R$ 5 mil cada, foram feitas da conta de Érica para a de Luan. O carro da bancária também foi retirado por ele em uma loja onde havia sido comprado.
Defesa nega crime
O advogado de Luan, Johan Barboza, nega a participação do cliente no feminicídio.
“O laudo da perícia que foi realizado na casa do investigado, o laudo que foi realizado no carro do investigado, o exame sexológico realizado na vítima, em nada aponta o nosso cliente ali presente.
O que existem são relatos de familiares, o que existe são relatos de amigos, que foram até a delegacia de polícia e mencionaram esse eventual relacionamento abusivo. Mas não consta sequer um boletim de ocorrência, nem por parte da família, nem por parte dos amigos e nem por parte da própria vítima, que ateste esse histórico de violência”, disse.
Sobre as transferências bancárias, o defensor reconheceu a movimentação, mas negou que isso seja prova de autoria do crime.
“Não nega em nenhum momento isso. Não nega e a defesa pediu ao delegado, pediu à juíza prolatora da ordem que segregou a liberdade do nosso cliente que o sigilo bancário do nosso cliente, não apenas do nosso cliente, mas da vítima fosse quebrado para verificar se aquilo foi algo pontual ou se existia habitualidade. A defesa não se opõe em nenhum momento em dizer que não houve a transferência.
Houve, é provado e o paciente assume que fez a transferência. Então assim, eu não posso segregar a liberdade de uma pessoa porque fez uma transferência, mas em que circunstância? Nós cobramos que haja outras linhas de investigação e não aquela que aponta para o nosso cliente e diz você transferiu dois pixes de 5 mil reais e você é o culpado. É isso o que nós cobramos”, afirmou.
O risco de não registrar a violência
A fala do advogado mostra não só o risco de não denunciar um relacionamento abusivo, como o risco da omissão. Hoje, é possível fazer denúncias anônimas pelo Disque 100. A denúncia pode salvar uma vida e facilitar, posteriormente, investigações. Érica Francisca foi morta e deixou dois filhos. E uma família de luto, sabe-se lá por quanto meses ou anos.
O Tribuna Online PE conversou com uma psicóloga do Tribunal de Justiça, em reserva, sobre os danos provocados por um relacioamento abusivo nas crianças. Ela trabalha na área de violência contra a mulher.
Segundo a psicóloga, que não terá o nome revelado, um relacionamento abusivo, quando presenciado por crianças, pode deixar marcas profundas no desenvolvimento emocional, social e até físico, mesmo que a violência não seja dirigida diretamente a elas.
De acordo com ela, especialistas em psicologia infantil, psiquiatria e serviço social alertam que a exposição constante à violência doméstica é considerada uma forma de violência psicológica contra a criança. Eis os principais danos apontados:
- Danos emocionais e psicológicos
-Ansiedade e depressão: a criança cresce em constante estado de alerta, com medo de quando será o próximo episódio de briga.
- Baixa autoestima: tende a internalizar a violência como algo “normal” ou acreditar que não merece afeto saudável.
- Culpa e responsabilidade indevida: muitas vezes, a criança se sente culpada pela violência ou acredita que poderia “salvar” o genitor agredido.
- Transtornos do sono e pesadelos: dificuldade para dormir, insônia ou terrores noturnos são comuns.
- Impactos no comportamento
- Agressividade ou isolamento: podem reproduzir os comportamentos violentos ou, ao contrário, se fechar totalmente, evitando contato social.
- Problemas escolares: queda no rendimento, dificuldade de concentração e maior evasão.
- Reprodução do ciclo de violência: meninos têm maior risco de se tornarem agressores no futuro; meninas, de aceitarem relações abusivas como algo esperado.
- Efeitos físicos
- Somatização: dores de cabeça, problemas gastrointestinais e alergias podem aparecer como reflexo da tensão emocional.
- Atraso no desenvolvimento: dificuldades na fala, na coordenação e no aprendizado podem surgir em crianças menores expostas ao ambiente abusivo.
- Especialistas destacam
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) classifica a violência doméstica como um fator de risco para o desenvolvimento integral da criança. A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece que crianças que crescem em lares violentos têm risco duas vezes maior de desenvolver depressão, abuso de substâncias e comportamento suicida na adolescência e na vida adulta.
Segundo a Associação Brasileira de Psicologia (CFP), a violência psicológica, ainda que indireta, deixa marcas invisíveis, mas profundas, podendo comprometer o senso de segurança e confiança básica da criança no mundo.
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