Por que ler Renato Pacheco?
No conjunto de sua obra, nota-se a relação entre diferentes áreas: o historiador se liga ao juiz, o juiz ao sociólogo e este ao romancista
A gente envelhece e morre (os que têm sorte). No meu caso, estava na passagem para os 30 quando conheci Renato Pacheco e entrevistei-o com um gravador, para transcrever depois. São técnicas desconhecidas dos mais novos, alguns dos quais também não sabem quem é o Renato Pacheco que dá nome à escola onde estudam, em Vitória. O gravador me foi roubado ainda com a fita. Da pesquisa sobre sua vida e obra, no entanto, resultaram dois livros: Nomes pra viagem (Secretaria Municipal de Cultura, 2002) e Renato Pacheco (Protexto, 2007), este publicado após a sua morte.
E, como o tempo passa num Maglev, lá se foi, para lugar desconhecido, a voz firme e suave do entrevistado, com a fita perdida; lá se foi, superada, a própria técnica do gravador com fita magnética, e, em 2004, nos deixou Renato Pacheco, nascido em Vitória em 1928, quando a capital tinha trinta mil habitantes e o transporte coletivo era feito em bondes elétricos. A sua memória, porém, permanece, e a vasta obra aí está, aberta, para quem a queira trilhar.
E por que razão vale a pena ler os seus poemas e romances, os textos sobre cultura popular, estudos da área do Direito, História e Sociologia? Porque grande parte dessa produção segue atualíssima, o que indica, por um lado, o alcance da visão do autor; por outro, pouca transformação na sociedade de que trata. Ler Renato Pacheco é conhecer melhor o lugar onde ele viveu e onde vivemos. Mas isso só se verá lendo. E que tal começar pelo seu romance de estreia, A oferta e o altar, de 1964?
No conjunto da obra, nota-se a relação entre diferentes áreas de interesse: o historiador se liga ao juiz, o juiz ao sociólogo e este ao romancista. Exemplo é o romance Fuga de Canaã, de 1981, em que o narrador dá voz a personagens que se defendem da acusação de um crime, deixando ao leitor o papel de juiz.
Depois de quase vinte anos de magistratura em outras cidades, Renato Pacheco retorna a Vitória em 1972. A partir de então passa a publicar, em média, um livro a cada dois anos.
Em 1984 publica Reino não conquistado, “trilogia vitoriense”. No cinquentenário da morte de Fernando Pessoa (1985) vêm a público os Cantos de Fernão Ferreiro e outros poemas heterônimos. Em 1997 é lançado Eu vi nascer o Brasil, livro sobre o donatário da capitania do Espírito Santo, Vasco Fernandes Coutinho. Em 1998 publica o romance O centauro enlouquecido e o pintor amante. Em comemoração aos 70 anos do autor, é lançada a antologia poética Porto final. 1999 é o ano de lançamento do romance Pedra menina, que encerra a viagem ficcional pelo Estado iniciada com A oferta e o altar. Dessa viagem literária retirei o nome para o meu livro Nomes pra viagem.
Aposentado na UFES, seguiu trabalhando em Vitória. Quando faleceu, em 2004, postava textos num blog. Suas cinzas foram lançadas ao mar na baía de Vitória, entre a Cruz do Papa e o Convento da Penha.