O valor da arte não se mede em likes
Na era das curtidas, especialistas alertam: visibilidade digital não garante relevância — colecionar exige pesquisa, sensibilidade e visão crítica
Em tempos de superexposição digital, não é raro que o número de seguidores nas redes sociais seja confundido com legitimidade artística. É tentador tomar a visibilidade como sinônimo de valor, uma armadilha que, muitas vezes, atravessa o olhar do colecionador iniciante e até mesmo o de instituições. Mas arte não é algoritmo. E o lugar do artista na história, na crítica e no mercado não se mede por curtidas.
Escolher obras de arte com base apenas na performance digital do artista é reduzir o campo vasto da criação à lógica da popularidade. Embora as redes sociais sejam ferramentas potentes de divulgação, operam por critérios que nem sempre têm afinidade com os fundamentos que sustentam a trajetória de um artista: consistência de pesquisa, inserção institucional, participação em exposições relevantes, formação, interlocução com curadores e críticos, pertencimento a grandes coleções, entre outros.
Um colecionador atento sabe que, para construir uma coleção coerente, é necessário olhar além da superfície. Isso significa estudar, acompanhar, visitar ateliês, conversar com profissionais da área, frequentar feiras e exposições. É nesse processo de escuta e observação que se revela a singularidade do artista, não apenas pelo que ele mostra, mas pelo que sustenta sua prática ao longo do tempo.
Colecionar é, acima de tudo, um gesto de compromisso: com a arte, com a cultura e com a própria história que se escreve por meio das obras reunidas. Cada aquisição deve ser pensada como parte de um conjunto que se constrói com tempo, pesquisa e sensibilidade. Por isso, o colecionismo responsável exige mais do que bom gosto: exige informação, ética e discernimento.
As coleções privadas, assim como as dos museus e galerias, são importantes fontes de informação e pesquisa, e desempenham um papel essencial na disseminação da arte para as futuras gerações.
No mercado de arte, visibilidade e valor são dimensões distintas. Um artista pode ser celebrado nas redes e ainda estar em formação conceitual. Outro pode ser discreto, mas com uma trajetória sólida, com passagens por bienais, instituições, coleções públicas e prêmios. São esses elementos: currículo, percurso, consistência, que, somados, fortalecem o lugar da obra no tempo.
A pressa dos números e a lógica imediatista das redes não devem ditar os rumos de uma coleção que almeja atravessar décadas. É preciso tempo para que o valor simbólico, estético e histórico de uma obra se revele. E, nesse tempo, cabe ao colecionador o papel de curador da própria sensibilidade: alguém que escolhe com profundidade e acompanha, com generosidade, o amadurecimento da arte que decidiu abrigar.
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