Exposição “ELAS” exalta as mulheres do acervo da Fundação Joaquim Nabuco
Mostra foi aberta nesta quinta-feira (15) celebrando os 75 anos da Fundaj e os 45 anos do Museu do Homem do Homem do Nordeste
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Onde estão as mulheres nos acervos da Fundaj? A exposição “Elas”, inaugurada nesta quinta-feira (15), traz essa reflexão e expõe cerca de 300 itens produzidos ou reunidos por mulheres, como publicações, vídeos, fotografias, obras de arte, discos, rótulos comerciais, cartões-postais e outras peças preservadas pela Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj).
Todo o acervo é proveniente de aquisições e doações de entidades e acervos pessoais, em sua maioria sob a guarda do Centro de Estudos da História Brasileira (Cehibra) e do Museu do Homem do Nordeste (Muhne).
A mostra vai ampliar a área de exibição do Museu em 450m², marcando a reabertura do primeiro andar, fechado desde 2008. O Cehibra e o Muhne são vinculados à Diretoria de Memória, Educação, Cultura e Arte (Dimeca) da Fundaj.
A exposição “Elas: onde estão as mulheres nos acervos da Fundaj?” é um exercício de autocrítica institucional e um aceno para um horizonte de mudanças, que propõe reflexões sobre o que é ser mulher na sociedade.
“A mostra tem significado especial para todas as mulheres e homens do nosso país, de Pernambuco e da Fundação Joaquim Nabuco porque traz um olhar direcionado para toda a riqueza do universo feminino. É uma exposição muito significativa, que narra a história tanto da formação do acervo quanto da própria Fundação”, destaca a presidenta da Fundaj, a professora doutora Márcia Angela Aguiar.
Dos mais de 800 mil documentos e itens preservados pela Fundação ao longo de seus 75 anos e levantados pelos curadores, apenas uma pequena parte foi produzida por mulheres, sem contar que, quando representadas, elas foram fotografadas, pintadas, desenhadas, esculpidas e descritas quase sempre por olhares masculinos.
“O próprio nome do Muhne pode ser entendido como uma síntese de práticas institucionais que antecedem sua criação e que, por muito tempo, persistiram. Essas práticas influenciaram a criação de um acervo cultural, histórico e artístico que, consistentemente, priorizou autores homens, notadamente os brancos, em detrimento de autoras mulheres, principalmente as negras”, destaca o coordenador-geral do Muhne, Moacir dos Anjos.
A mostra tem curadoria de três mulheres: Sílvia Barreto, chefe do Serviço de Estudos Museais do Muhne, Sylvia Couceiro, coordenadora do Centro de Documentação e Pesquisa (Cdoc) do Cehibra, e Cibele Barbosa, pesquisadora e historiadora do Cehibra.
A expografia também é assinada por uma mulher, a cenógrafa e diretora de arte Séphora Silva. “Era importante para nós que o tema da exposição fosse algo que chamasse a atenção do público, que fizesse a sociedade se envolver”, pontua Silvia Barreto.
A curadora acrescenta que o mais interessante durante a pesquisa foi ver, ao acessar imagens do passado com os olhos do presente, quanta misoginia havia condensada num mero rótulo de cachaça, numa escultura de barro ou na capa de um disco. Imagens que circularam e naturalizaram o desrespeito.
Durante o processo de curadoria, ficou evidente como a desigualdade de gênero também atinge o processo artístico e compromete a preservação do patrimônio material e imaterial. Sylvia Couceiro conta que o objetivo deste trabalho foi de busca pelas mulheres.
“A proposta foi torná-las visíveis - pois estamos cientes do manto de invisibilidade que as cobre e não seria diferente nos acervos da Fundação, já que os acervos refletem a sociedade - e deixar clara a necessidade de acabar com essas fases de exclusão e apresentar essas mulheres como protagonistas da história, mostrando o pioneirismo de muitas delas”.
No acervo de esculturas do Muhne, por exemplo, menos de 15% das peças têm autoria feminina. No Cehibra, os dados não diferem.
Dos 3,5 mil folhetos de cordel, apenas 2,3% foram escritos por elas; dos 1.166 autores identificados no acervo, somente 14,3% foram são mulheres; das 156 coleções iconográficas, apenas 5% possuem nomes femininos e das 233 coleções textuais, apenas 3,5% têm nomes de mulheres.
E apesar da desvalorização e do pouco reconhecimento, as mulheres deixaram sua marca em produções intelectuais, artísticas, literárias e musicais.
“Em meio a tantos apagamentos e exclusões, revelar as obras dessas artistas é uma forma de contar suas histórias na luta por reconhecimento, visibilidade e igualdade”, evidencia Cibele Barbosa, que cita ainda alguns itens de destaque da mostra, como uma videoarte da sérvia Marina Abramović, a partitura original Marcha Número Um do Vassourinhas, composição de Joana Batista Ramos, e a calunga Dona Joventina, que passou 30 anos nos Estados Unidos até ser doada ao Muhne em 1996. “O que faz parte do acervo da Fundaj nós fazemos questão de compartilhar com o público.”
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