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O cinismo

Como a cultura do calote público persiste há décadas, transformando dívidas do Estado em dramas humanos ignorados sob o manto da burocracia


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Imagem ilustrativa da imagem O cinismo
Pedro Valls Feu Rosa é desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo

Dia desses, lendo o noticiário, fiquei a recordar uma passagem da vida do meu saudoso pai. Nos idos de 1960 estava ele a visitar um dos responsáveis pela administração pública, recém empossado, quando adentrou na sala um secretário com aspecto preocupado, carregando uma pasta recheada de documentos.

Relatou, de forma grave, que aqueles papéis eram relativos a débitos pretéritos do Estado - para ouvir como resposta que “dívidas antigas não seriam pagas”. Algo desconcertado, o angustiado secretário observou que algumas delas eram recentes. Ouviu, então, que estas deveriam permanecer em alguma gaveta até ficarem antigas. Simples assim.

Embasbacado, o pobre secretário ainda balbuciou algo sobre a reação dos credores. Eis que Sua Excelência, com ar de enfado, disparou uma memorável frase:

Fique calmo. Afinal, para que serve a Justiça?

Algumas décadas se passaram. Apregoa-se que nosso país - e mesmo o mundo - modernizou-se. Trombeteia-se que episódios assim viraram reminiscência histórica. Será? Decidi realizar uma rápida pesquisa em meu modesto banco de dados.

Descobri que, em Portugal, “se o Estado pagasse as faturas em atraso, a indústria, o comércio e a hotelaria podiam saldar o malparado e sobravam 2 bilhões de Euros, tanto quanto os subsídios cortados aos reformados e aos funcionários públicos” (Jornal de Notícias, 17 de agosto de 2012).

Talvez a explicação para um quadro desses esteja na pequena cidade de Vallejo, nos EUA. Há algumas décadas as “dívidas antigas”, em um montante de US$ 400 milhões, acabaram liquidadas por meros US$ 6 milhões, dado o cansaço dos credores.

Cheguei ao Brasil, onde calculou-se, em 2010, que a administração pública devia R$ 60 bilhões em dívidas já reconhecidas pela Justiça. Naqueles dias, o então presidente do STF desabafou: “trata-se de uma completa insensibilidade com a vida dos cidadãos, como se as necessidades materiais das pessoas fossem algo supérfluo”. Observou, em seguida, que estas dívidas “escondem dramas humanos, de famílias prejudicadas pela falta de compromisso de administradores públicos”. “Algumas gerações já foram sacrificadas”, complementou, pois os créditos passaram para os netos e bisnetos, que também não receberam.

Denunciou, então, algo muito sério: “A irresponsabilidade vem se tornando uma marca constante no setor público. Já foram feitas três moratórias - em 1988 o setor público ganhou oito anos para o pagamento, em 2000 ganhou mais 10 anos, e em 2009 outros 15 anos - e nenhum dos prazos foi cumprido”.

Agora levante-se. Vá à janela. Olhe, com olhos de ver, a imensa quantidade de dívidas da administração pública. Entenda que surgiram em função dos mais variados motivos - inclusive por conta da corrupção, que tem vitimado principalmente a parcela mais vulnerável da população. Perceba que no mais das vezes são débitos perfeitamente claros e líquidos. E surpreenda-se - ou não - com o fato de que, uma vez mais, estão sendo judicializados. Afinal, e retorno aos idos de 1960, para que serve a Justiça?

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