‘É como um Game of Thrones’, diz diretor de série sobre brigas políticas e reconstrução do Flamengo
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“Vou montar um chapa para vencer esses escroto”’, escreveu Luiz Eduardo Baptista, o Bap, em um grupo de WhatsApp quando decidiu romper com a gestão Bandeira de Mello, a quem ajudou a assumir a presidência do Flamengo como parte da Chapa Azul, formada por nomes de fora do futebol e ligados ao mercado financeiro, caso também de Rodolfo Landim e Wallim Vasconcellos.
O grupo começou a ruir porque queriam que Bandeira fosse uma espécie de “Rainha da Inglaterra”, nas palavras de Bap, mas ele não seguiu a ideia de ser apenas um representante que só tomaria decisões se aprovadas pelos outros integrantes da Chapa Azul. Essas histórias de bastidores são contadas na série documental A Reinvenção do Flamengo, que estreia às 21 horas desta quarta-feira na SporTV e ficará disponível na plataforma de streaming GloboPlay.
O documentário de quatro episódios, dirigido pelo jornalista Marcelo Pizzi e produzida pela SporTV em conjunto com a Beyond Films, produtora que tem Ronaldo Fenômeno como um dos sócios, mostra como o Flamengo saiu de uma situação quase de amadorismo para a profissionalização, liderado por um grupo que dissolveu, mas conseguiu implementar uma mudança profunda na mentalidade do clube.
“O ponto chave que eu gostaria de deixar ao fim da série é como uma mentalidade de mudança de gestão foi capaz de transformar um clube de uma maneira tão intensa”, afirma Pizzi ao Estadão. “A gente tem essa premissa, de ser informativo, mas que ao mesmo tempo seja entretenimento. É como se a gente fizesse uma coisa tipo Game Of Thrones. Sem esquecer do contexto econômico, mas trazer esse entretenimento das brigas, das polêmicas.”
Ídolos do Flamengo, como Zico, Júnior, Diego Ribas, Bruno Henrique e Gerson dão depoimentos na produção, mas o foco é nos dirigentes. Além do quarteto Bandeira, Wallim, Landim e Bap, participam nomes importantes da cartolagem rubro-negro, como os ex-presidentes Kléber Leite, Márcio Braga e Patrícia Amorim. Os jornalistas Carlos Eduardo Mansur, Eric Faria, Paulo Vinícius Coelho e Rodrigo Capello contribuem com análises e contexto.
No primeiro episódio, é mostrado como o Flamengo era desorganizado: da falta de maca para tirar um jogador do gramado no centro de treinamento à conta de água comparável ao segundo maior salário do elenco, em razão de uma vazamento na piscina do clube.
Traçado o cenário, entre em cena a Chapa Azul e as ações de Bandeira na presidência, como o acordo para quitar dívidas com a Fazenda usando o dinheiro do patrocínio da Adidas e a obtenção da certidão negativa de débito.
“Era um clube gigante, porém afogado em dividias, desempenho esportivo sofrível, eliminações inacreditáveis, e com uma torcida gigante”, diz Pizzi. “Para todo rubro-negro, sempre ficou aquela dúvida. Como o Flamengo não consegue transformar essa massa de torcedores em dinheiro? No fim das contas, é o que toca a atividade profissional. A gente estudando a história descobriu que era muito mais do que isso, era uma trama política, de poder.”
O segundo episódio trata do último mandato de Bandeira, muito questionado por seu desempenho esportivo e a transição para o mandato de Landim. No terceiro, a série entra no delicado tema do incêndio do Ninho.
“É uma tragédia que a gente não podia passar por cima. A gente tem essa abordagem econômica e política, mas a gente não podia desconsiderar o papel que aquilo teve na gestão do Flamengo. Se tornou um jogo de empurra. Bandeira dizia que a culpa era do Landim, o Landim dizia que era do Bandeira. Aconteceu já no mandato do Landim. Quem é responsabilizado no fim das contas é o Bandeira”, conta Pizzi.
A tragédia que matou dez jogadores das categorias de base, com idades de 14 a 17 anos, impactou o clube de forma muito grande e até hoje gera debates sobre a maneira que o caso foi tratado internamento. Em depoimento na série, o ídolo máximo rubro-negro, Zico, fala que a diretoria tinha que “fazer tudo pelas famílias daquelas menino”s.
“Obter desses caras (dirigentes) a informação sobre o sucesso é fácil. Na série, tem muita opinião e muita informação de bastidores de coisas que deram errado. Ao abordar essa tragédia do Ninho, os entrevistados que não são ligados ao Flamengo são quase unanimes ao dizer que o clube deu um tratamento às famílias que não foi o correto. Não em termos de valores econômicos, mas de ter sido mais acolhedor naquele momento”, afirma o diretor.
Ainda no terceiro episódio, a história chega nos momentos de glória de 2019, ano das conquista do Brasileirão e da Libertadores, sob o comando de Jorge Jesus, e explora a figura de Gabigol e sua importância para o Flamengo.
O episódio que fecha a produção aborda os últimos anos da gestão Landim e acompanha as eleições que colocaram Bap na presidência, no final do ano passado. Ele concorreu contra Rodrigo Danshee, representante da então situação comandada por Landim, seu ex-aliado.
Ao se aprofundar no histórico recente da política do clube, o diretor Marcelo Pizzi acredita que o próprio racha dentro do clube que mudou o panorama da gestão rubro-negra foi saudável e ajudou o time a se manter em alta nos últimos.
“Gerou uma renvoação de poder, o que eu acredito que é saudável para toda democracia. As ideias deles não eram tão diferentes uma do outro. Cada um acabou acrescentando algo positivo para o Flamengo”, afirma. “Ninguém era do futebol. Acho que isso acabou sendo uma coisa benéfica, porque não trouxeram os vícios da gestão de futebol vigente. Eles puderam experimentar coisas que acabaram dando certo. Explorar melhor esse potencial econômico.”
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