Jornada de Educação Inclusiva discute mudanças para garantir inclusão nas escolas
O aumento significativo da prevalência do Transtorno do Espectro Autista nos últimos anos exige os ajustes, dizem especialistas
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O aumento significativo da prevalência do Transtorno do Espectro Autista (TEA) nos últimos anos tem exigido de escolas mudanças para garantir o acolhimento e a inclusão.
Segundo o neurocientista Fernando Lauria, dados recentes do CDC, órgão americano responsável por estudos epidemiológicos, apontam que a incidência de TEA nos Estados Unidos é de 1 para 31 nascidos — ou seja, uma criança autista a cada 31 nascimentos.
Essa taxa representa uma mudança expressiva em relação a 2007, quando era de 1 para 93. “As escolas têm que estar preparadas, porque essa é uma realidade”. Ele explica que, embora no Brasil ainda não haja dados oficiais publicados, pesquisas indicam que a incidência pode ser ainda maior.
A inclusão no ambiente escolar foi o centro dos debates na última quarta-feira (14), durante a 2ª Jornada de Educação Inclusiva, promovida pelo Sindicato das Empresas Particulares de Ensino do Espírito Santo (Sinepe-ES), com participação do Ministério Público.
O evento, realizado no Auditório do Senac-ES, em Vitória, reuniu cerca de 150 educadores, especialistas e gestores de todo o Estado para discutir práticas que garantam o direito de aprender com equidade.
Durante sua fala, Fernando Lauria reforçou que o cérebro humano possui plasticidade, ou seja, capacidade de mudar ao longo da vida. “Precisamos entender que um diagnóstico ou um laudo jamais será uma sentença ou um rótulo. Se eu entendo que esse cérebro é plástico – ainda que ele tenha alguma divergência na sua construção – eu tenho a possibilidade de potencializar habilidades que possam se mostrar deficitárias”.
Fernando Lauria ainda enfatizou a necessidade das escolas e da sociedade se prepararem para receber crianças com TEA.
“Não é uma pessoa atípica que tem que se adaptar ao ambiente, mas nós temos que preparar o ambiente para que tenhamos possibilidade de receber essa pessoa e, através disso, eliminar todas as barreiras que possam existir para que ela possa se desenvolver”.
Essas barreiras, segundo ele, são não só físicas, mas barreiras comportamentais e de atitudes, que são as que mais prejudicam.
Fernando Lauria diz que o cérebro é plástico e que intervenções precoces podem promover mudanças significativas no desenvolvimento dessas crianças. “Quanto mais cedo nós interviermos, maior é a possibilidade de desenvolvimento.

“Escola e família devem estar juntas”
Ao debater formas de construir caminhos para a inclusão nas escolas, o presidente do Sindicato das Empresas Particulares de Ensino do Espírito Santo (Sinepe-ES), Moacir Lellis, enfatizou a importância das famílias atuarem em parceria nesse processo.
“Após a pandemia, as dificuldades relacionadas à inclusão se agravaram. Esse evento do Sinepe-ES, em sua segunda edição, traz esse debate não só para escolas particulares, como também para as escolas da rede pública, que estão representadas”.
Para Moacir Lellis, as famílias precisam estar juntas com as escolas. “A função da escola é ensinar e da família é educar. Um problema que temos hoje é que, muitas vezes, a família terceiriza a parte da educação e cobra apenas a responsabilidade da escola”.
Um outro problema, segundo ele, são famílias que resistem aos diagnósticos de crianças que têm alguma indicação de transtornos como do Déficit de Atenção ou do Espectro Autista. “Temos muitos casos em que os pais não aceitam, e quem mais perde é a criança”.
Por outro lado, ele destacou a necessidade das escolas acolhedoras, não só na teoria, como também na prática. “Além de adaptar, incluir é transformar a escola para que todos se sintam parte dela”.

Neurocientista alerta para uso excessivo de telas na infância
Ao destacar a importância de entender o desenvolvimento do sistema nervoso para potencializar o aprendizado, o neurocientista Fernando Lauria chamou a atenção para o uso excessivo de telas na infância.
Ele afirma que o uso excessivo da tecnologia está relacionado a falsos diagnósticos do Transtorno do Espectro Autista e de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).
Ele enfatiza, no entanto, que o aumento na prevalência dessas condições é real. “Não sou contra o uso de telas, mas precisamos desenvolver uma educação digital. A tela inibe conexão sinaptica em uma região córtex orbitofrontal, que é a região do cérebro responsável por controlar as emoções”.
Fernando Lauria explicou que isso significa que tela em excesso faz com que a pessoa tenha dificuldade maior em controlar suas emoções e isso tende a ficar permanente ou por um longo período de tempo, se transformando em transtornos de humor.
O uso precoce das telas e a mudança no padrão do brincar têm impactado no desenvolvimento intelectual de meninos e meninas, de acordo com o neurocientista.
“Não tenho dúvidas de que isso tem trazido falsos diagnósticos de autismo e TDAH. Não é que telas causem autismo e TDAH, pois essas são condições que as pessoas já nascem. Mas as telas diminuem as conexões sinapticas que fazem com que esses meninos fiquem menos atentos ou se isolem mais”.
E completou: “O déficit persistente na interação e comunicação social está entre os critérios de diagnósticos de autismo. Se o profissional que faz o diagnóstico clínico não tiver esse refinamento sobre os critérios, pode provocar falsos diagnósticos”.
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