O caos trumpiniano
Confira a coluna de domingo (09)
Vocês viram a cara do Netanyahu quando Trump anunciou o “plano” de transformar Gaza numa Riviera francesa? Ele ficou visivelmente surpreso, gostou, mas não esperava.
Ninguém esperaria que, naquele cenário de pompa e circunstância, a primeira visita de Estado recebida pelo novo governo americano, Trump largaria de mão o discurso escrito e se entregaria a fantasias, como um adolescente diante de um tabuleiro de War. Que belo negócio imobiliário, devaneou ele. Que leviandade, lamentou-se o mundo.
A Faixa de Gaza tem cerca de 360 km e pelo menos 2 milhões de habitantes, sobreviventes dos pesados bombardeios sofridos desde o atentado terrorista de 7 de outubro de 2023.
Corresponde a cerca de quatro vezes a extensão e seis vezes a população de Vitória. Imaginem, por um momento, se todos os habitantes de nossa ilha fossem deslocados agora, na marra, para cidades vizinhas. Propriedades, projetos, vidas inteiras abandonadas e removidas para lugares em que os flagelados seriam tratados, no mínimo, como intrusos.
Fora os problemas de infraestrutura, imaginem o sofrimento humano que a operação desencadearia, sobretudo se Vitória viesse enfrentando bombardeios e guerras nos últimos 70 anos.
Como seria de esperar, a repercussão do discurso de Trump foi péssima. Árabes, europeus, russos e chineses discordaram, e nós, brasileiros, também. Só quem apoiou foram os militares da extrema direita israelense (o que não é bom) e Milei (que não conta, por óbvio).
Junte-se o episódio das tarifas impostas ao Canadá e ao México no dia 1 e suspensas no dia 3, e a ainda mal explicada negociação sobre o Canal do Panamá. E fica a impressão de que a atual política externa norte-americana é uma nau sem rumo.
O Panamá fazia parte da Grã-Colômbia. Na virada para o século XX, os Estados Unidos apoiaram grupos separatistas panamenhos, que obtiveram a independência em 1903. Já no ano seguinte, teve início a construção do canal, operado pelos EUA durante seis décadas, com crescentes dificuldades causadas por grupos nacionalistas.
No fim dos anos 70, negociações bilaterais redundaram, durante o governo Jimmy Carter, na completa transferência do canal para o Panamá, apesar dos protestos de muitos políticos americanos, em particular do senador republicano Samuel Hayakawa, autor do célebre comentário: “Deveríamos manter o Canal. Afinal, nós o roubamos honestamente!”.
Dois dos cinco portos adjacentes ao canal, um no Pacífico, outro no Atlântico, são operados pela Hutchison Port Holdings, que venceu a licitação internacional em 1997. A empresa é vinculada a um conglomerado baseado em Hong Kong, que opera em 24 países, entre os quais o Reino Unido. Secas vêm causando dificuldades operacionais e aumentos das taxas, onerando o tráfego de navios, 70% do qual se origina ou se destina a portos americanos.
O encarecimento, que está na base dos protestos de Trump, ensejou a negociação do último dia 3 entre o novo secretário de Estado Marco Rubio e o presidente panamenho José Raul Molino. Só não se sabe, até o momento, o conteúdo negociado.
Enquanto Rubio afirmou que foi dado “um grande passo adiante”, Molino negou que haja uma ameaça de retomada do canal, embora o Panamá tenha assumido o compromisso de desligar-se da iniciativa chinesa da Nova Rota da Seda. Xi Jinping condenou a “mentalidade de guerra fria” do presidente americano, mas a Hutchison continua operando o canal.
Desde a criação das Nações Unidas, o mundo vivia sob o que se convencionou chamar de “Pax Americana”. Embora fosse uma paz precária, o fato é que desde 1945 o mundo se beneficiou de uma certa estabilidade e prosperou, sob a liderança global dos Estados Unidos.
Trump não quer mais isso. Em seus discursos escritos, considera as alianças militares um desperdício de recursos financeiros, prefere dividir o globo em zonas de influência, e demanda a supremacia absoluta do mundo ocidental. Nos discursos improvisados, a coisa piora, parece que quer substituir a “pax americana” pelo “chaos trumpinianus”. Se é isso, ele até aqui está indo bem.
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