Redes sociais “privadas” usadas por adolescentes preocupam pais e especialistas
Especialistas alertam que ambientes como o Dixx podem ser usados para expor intimidade, propagar discurso de ódio e outras práticas prejudiciais
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Você já teve um segredo só seu? Algo que não contava para os pais, mas compartilhava com os amigos mais próximos? Para muitos adolescentes de hoje, o Dixx – um perfil secundário e privado no Instagram – tem justamente esse papel. Nele, jovens postam desabafos, pensamentos e até conteúdos mais sensíveis. Especialistas estão preocupados.
“Não estamos fazendo uma caça às bruxas. A internet é fantástica, as redes sociais são maravilhosas. O problema é o que as pessoas estão fazendo com isso”, afirma a comunicóloga Carla Afonso.
Para ela, o uso de plataformas on-line tão poderosas exige a presença de adultos atentos aos riscos que o ambiente digital pode apresentar.
Um desses riscos é a falsa sensação de anonimato. Para Eduardo Pinheiro, especialista em segurança digital, o caráter fechado desses perfis pode abrir espaço para atitudes perigosas.
“Pode incentivar comportamentos como exposição da vida íntima de colegas, onde ofensas e humilhações se intensificam pela ausência de supervisão, bem como a propagação de discursos de ódio, racismo, machismo ou homofobia”, exemplifica.
Para o especialista, a combinação entre anonimato, privacidade e ausência de supervisão dos pais torna esses ambientes suscetíveis a crimes e riscos à integridade física e mental de adolescentes.
Já a ciberpsicóloga Bárbara Alves faz um contraponto. Por um lado, ela reconhece o papel desses perfis como um espaço de respiro emocional para os jovens. Mas, por outro, aponta os riscos.
Um deles é a possibilidade de vazamento do que é postado ou o seu uso fora de contexto, “o que pode afetar diretamente a autoestima e a confiança nas relações do jovem”, destaca ela.
Além disso, ressalta a ciberpsicóloga, se o jovem sente que só pode ser ele mesmo em um perfil escondido, isso pode gerar sofrimento. “Pode levar a um sentimento de esgotamento, de estar sempre em adaptação, sem saber qual versão é a 'verdadeira'”.
Para Bárbara, essas contas Dixx “podem ser, ao mesmo tempo, respiro e armadilha”. Explica ainda que tudo depende do lugar que essas plataformas digitais ocupam na vida psíquica do jovem e da qualidade das relações que ele constrói dentro e fora das redes sociais”.
Monitoramento

Suellen Mathiello, de 40 anos, monitora o celular dos dois filhos: João Vitor, 13, e Miguel, 11. Ela explica que instalou um aplicativo que permite conhecer usos e tempo de navegação. Além disso, usa uma ferramenta do Instagram que a permite analisar o que eles estão postando e assistindo. “Sou enfermeira, faço muito plantão. Então, quando estou ausente, é uma forma de acompanhar o que eles estão fazendo. O celular é uma ferramenta que pode gerar grandes danos, e está dentro de nossa casa”, conta.
Fique por dentro
Surgimento em 2016
Os perfis Dixx surgiram em 2016, quando o Instagram passou a permitir contas secundárias de um mesmo usuário. O termo ganhou destaque recentemente após uma briga entre as influenciadoras Antonela Braga e Duda Guerra, motivada por um pedido para seguir o perfil Dixx de Benício Huck, filho de Angélica e Luciano Huck. O caso viralizou e até Angélica precisou se manifestar publicamente.
Qual a polêmica?
Essas contas podem parecer inofensivas, mas expõem crianças e adolescentes a riscos. Entre eles, vazamento de imagens íntimas, cyberbullying, extorsão e outros crimes. Além disso, o uso excessivo delas pode reforçar o isolamento e aumentar a sensação de inadequação do menor de idade.
Dixx
São contas secundárias e “secretas” no Instagram. Jovens da Geração Z (entre 15 e 28 anos) usam esses perfis para compartilhar pensamentos, experiências, memes, trechos da rotina e conteúdos mais íntimos. O termo deriva da gíria “dixar”, usada para se referir a um conteúdo postado “sem filtro”, despreocupado.
A principal característica é o formato fechado: apenas pessoas do círculo mais próximo têm acesso — pais, familiares, chefes ou professores geralmente ficam de fora.
Enquanto isso, a conta oficial funciona como vitrine pública, mostrando apenas o que é “bonito” ou socialmente aceito.
Discord
A plataforma se consolidou como um dos principais meios de interação entre adolescentes, por permitir a criação de servidores privados, chats por voz e identidade anônima.
Por isso, também é usada como uma espécie de “rede paralela”, fora do alcance dos adultos.
Segundo o projeto Protocolo Eu Te Vejo, coordenado pela juíza Vanessa Cavalieri, o Discord é uma das plataformas mais usadas por criminosos para aliciar crianças e adolescentes.
Segundo o projeto alerta, o aplicativo não realiza verificação etária, não exige dados dos usuários e não possui moderação ativa de conteúdo violento ou criminoso.
Por que os jovens criam perfis privados?
Liberdade e anonimato. Fuga da comparação e aprovação pública. Busca por identidade, segurança e pertencimento. Esses são alguns dos motivos pelos quais adolescentes criam perfis como o Dixx, de acordo com especialistas.
Segundo a ciberpsicóloga Bárbara Alves, esse tipo de perfil nas redes sociais nasce da necessidade que jovens têm de criar espaços mais controlados e seguros na internet.
“Muitos adolescentes se sentem sobrecarregados com as exigências dos perfis principais, que costumam funcionar como palcos. Nesse contexto, os Dixx funcionam como uma espécie de bastidor — um quarto com a porta encostada dentro da casa aberta, que é a vida digital”, explica.
Ressalta ainda que são uma tentativa dos adolescentes de proteger a intimidade e preservar a saúde mental.
“Não há um único perfil, mas, em geral, são adolescentes que desejam escapar, ainda que momentaneamente, das dinâmicas públicas de comparação e aprovação. Dixx podem funcionar como esse espaço acolhedor”, afirma.
A neuropsicopedagoga Geovana Mascarenhas complementa que “muitos adolescentes, na busca por identidade e pertencimento, recorrem ao anonimato digital como uma forma de liberdade”.
Fonte: Pesquisa AT e especialistas consultados.
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