'Ouro negro': investigação da PF que envolve Alexandre Pires apura exploração de cassiterita
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A Polícia Federal investiga um esquema de garimpo ilegal que movimentou mais de R$ 250 milhões retirando cassiterita da Terra Indígena Yanomami, em Roraima. O minério, conhecido como ouro negro, devido ao alto valor, teria sido exportado com o uso de notas frias. Nesta segunda-feira, 4, a PF desencadeou a Operação Disco de Ouro, tendo como um dos alvos o cantor Alexandre Pires e seu empresário artístico, Matheus Possebon.
Segundo a PF, o cantor é suspeito de ter recebido pelo menos R$ 1 milhão de uma mineradora envolvida no esquema. Ele foi ouvido e liberado, mas o empresário foi preso. Os dois foram abordados em Santos, no litoral paulista, quando saíam de um navio de cruzeiro, onde o cantor havia se apresentado.
A empresa de entretenimento que cuida da carreira do cantor e da qual Possebon é executivo disse que confia na idoneidade deles. A defesa de Pires também se posicionou declarando que o cantor "não tem e nunca teve qualquer envolvimento com garimpo ou extração de minério" (mais informações abaixo).
Outras pessoas são investigadas e não tiveram os nomes divulgados. A PF cumpriu mandados em cinco Estados: Roraima, São Paulo, Pará, Minas Gerais e Santa Catarina. A Justiça determinou o sequestro de R$ 130 milhões dos investigados.
O que é a cassiterita?
A cassiterita é a matéria-prima do estanho, metal que se tornou muito valorizado quando se intensificou sua aplicação na fabricação de smartphones, tablets e telas de celulares. O estanho entra na composição de placas de circuito eletrônico, reveste internamente embalagens de enlatados e forma ligas como bronze, latão e soldas. Tem ainda aplicação na agricultura, como componente de fungicidas.
Durante a pandemia, com o aumento no uso de celulares e tablets, além do maior consumo de enlatados, a demanda pela cassiterita aumentou. A guerra entre Rússia e Ucrânia, países que exportam o minério, agravou o cenário de escassez e elevou os preços.
No mercado internacional, a tonelada superou os US$ 40 mil - cerca de R$ 200 mil -, o que atraiu a atenção dos garimpeiros, sobretudo os ilegais, já que as maiores reservas estão em terras indígenas.
Apenas nos anos de 2021 e 2022, cerca de 700 mil toneladas de cassiterita foram enviadas para o exterior de forma ilegal, segundo relatório em posse do Ministério Público Federal (MPF). Só a Polícia Rodoviária Federal apreendeu mais de 200 toneladas do mineral procedente da Terra Yanomami, em Roraima, nesse mesmo período.
A maior repressão ao garimpo ilegal de ouro em terras indígenas levou à migração dos garimpeiros para as minas de cassiterita. Conforme o MPF, de agosto de 2020 a fevereiro de 2022, foram registrados mais de três mil alertas de garimpo ilegal na região que pertence à Reserva Yanomami, área que se estende por 10 milhões de hectares nos estados de Roraima e Amazonas.
A Constituição Federal proíbe garimpo em terras indígenas. Em muitos garimpos ilegais, a extração de cassiterita é feita durante a prospecção do ouro, metal mais valioso.
Em maio deste ano, atendendo pedido do MPF, a Justiça determinou à Agência Nacional de Mineração (ANM) que os leilões realizados para a venda de 205 toneladas de cassiterita extraída ilegalmente da Terra Indígena Yanomami fossem revertidos para ações de combate ao garimpo ilegal na região.
Os R$ 10,5 milhões obtidos no leilão foram repassados à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Conforme a PRF, as apreensões de cassiterita acontecem nos Estados que concentram as maiores reservas do minério, como Amazonas, Rondônia e Roraima, mas este ano foram apreendidas 20 toneladas em São Paulo.
Relatório do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) aponta que, nos primeiros quatro meses deste ano, as ações contra o garimpo ilegal resultaram na aplicação de 52 autos de infração no valor total de R$ 28,7 milhões, e na apreensão de 7 aeronaves, 20,7 mil litros de combustível, 3 tratores, 124 motores estacionários, 52 geradores de energia, 20,4 toneladas de cassiterita avaliadas em R$ 2 milhões, 23 barcos, 4,5 quilos de mercúrio e 466 gramas de ouro, além de outros veículos e equipamentos usados na garimpagem.
O que a operação Disco de Ouro investiga?
A Operação Disco de Ouro foi deflagrada para desarticular um esquema de financiamento e logística ao garimpo ilegal de cassiterita na Terra Yanomami. Foram cumpridos dois mandados de prisão e seis de busca e apreensão expedidos pela 4.ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima, em Boa Vista e Mucajaí, naquele Estado, além de São Paulo, Santos (SP), Santarém (PA), Uberlândia (MG) e Itapema (SC).
A operação é um desdobramento de uma ação da PF realizada em janeiro de 2022, quando 30 toneladas de cassiterita extraída da terra indígena estavam estocadas em uma empresa investigada, à espera do embarque para o exterior.
O inquérito indicou que o esquema seria voltado para a "lavagem" da cassiterita ilegal, com a declaração de que o minério seria originário de um garimpo regular no Rio Tapajós, em Itaituba (PA).
O material teria sido supostamente transportado para Roraima para tratamento, mas essa dinâmica aconteceria apenas no papel, já que o minério seria originário desse Estado.
Foram identificadas transações financeiras que se relacionavam com a cadeia produtiva do esquema, com a presença de pilotos de aeronaves, postos de combustíveis, lojas de máquinas e equipamentos para mineração e "laranjas" para encobrir as movimentações fraudulentas.
"O esquema contaria, ainda, com um empresário do ramo musical, de expressão nacional, que seria um dos responsáveis pelo núcleo financeiro dos crimes, bem como um cantor, que teria recebido ao menos um milhão de reais de uma mineradora investigada", diz a nota da PF.
O que diz a defesa dos investigados?
A Opus Entretenimento, empresa que faz a gestão da carreira do cantor e da qual Possebon é um dos executivos, disse confiar na idoneidade de Alexandre e no "completo esclarecimento" do caso. A Opus informou desconhecer "qualquer atividade ilegal supostamente relacionada a colaboradores e parceiros da empresa" que mantém o "compromisso de promover a cultura e levar o entretenimento ao público brasileiro".
Em nota divulgada nesta terça-feira, 5, o advogado criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso, que representa o cantor e compositor Alexandre Pires, disse ter vindo a público esclarecer que "o cantor Alexandre Pires não tem e nunca teve qualquer envolvimento com garimpo ou extração de minério, muito menos em área indígena".
"Destacamos que o referido cantor e compositor é uma das mais importantes referências da música brasileira, sendo possuidor de uma longa e impecável carreira artística. Alexandre Pires foi tomado de surpresa diante da recente operação da Polícia Federal que indevidamente envolveu seu nome", diz a nota.
O texto do advogado afirma ainda que o cantor e compositor Alexandre Pires "jamais cometeu qualquer ilícito, o que será devidamente demonstrado no decorrer das investigações, reiterando sua confiança na Justiça brasileira".
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