Mais de 10 mil casos de obesidade infantil no Espírito Santo
Além de comprometer o bem-estar da criança no presente, o excesso de peso pode gerar sérios problemas no futuro
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A obesidade infantil tem se tornado um dos principais desafios de saúde pública no Espírito Santo. Só nos três primeiros meses de 2025, foram registrados 10.902 casos de sobrepeso ou obesidade entre crianças atendidas na Atenção Primária à Saúde do SUS, de acordo com dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).
Em 2024, o total foi de 31.983 casos — número que já havia superado os 31.288 registrados em 2023.
Além de comprometer o bem-estar da criança no presente, o excesso de peso pode gerar sérios problemas no futuro. A obesidade infantil está associada a uma série de doenças crônicas, muitas delas antes restritas à vida adulta.
“Ela pode evoluir com colesterol alto, aumento da pressão arterial, resistência insulínica e até mesmo o desenvolvimento de diabetes tipo 2”, explica o pediatra Rodolfo Nicolau Soares.
Ela também pode causar distúrbios respiratórios, além de problemas ortopédicos, puberdade precoce e baixa autoestima. “Crianças com obesidade tendem a sofrer bullying e exclusão, o que pode levar a quadros de ansiedade e depressão.”
A pediatra Isadora Vencioneck reforça que, se não for tratada, a obesidade pode deixar sequelas permanentes. “Além da diabetes tipo 2, gordura no fígado e hipertensão podem se tornar crônicas. Além disso, o impacto emocional pode acompanhar a criança até a vida adulta. Crianças obesas têm mais chance de se tornarem adultos obesos, hipertensos e com transtornos alimentares.”
Entre os principais fatores que explicam esse avanço estão a má alimentação, o sedentarismo e o aumento do tempo de tela. A falta de atividades físicas também contribui para o agravamento do quadro.
“As crianças estão passando muito mais tempo em frente a telas, como celular, tablet e televisão, e brincando cada vez menos”, aponta a pediatra Talyne Bolzan. “Isso reduz o gasto energético e favorece o acúmulo de gordura corporal.”
Diante de um problema tão complexo, a solução não é simples, mas é possível. E começa dentro de casa. De acordo com os especialistas, a criança precisa ser acolhida, não culpada. Victor Batitucci Ribeiro, gastropediatra, reforça que a alimentação é um dos principais fatores para o caso de obesidade, mas não o único.
“A obesidade é uma condição multifatorial, ou seja, uma combinação de fatores, entre eles maus hábitos, ambiente familiar, fatores genéticos e emocionais. Nesse cenário, os pais são espelhos. A melhor forma de incentivar bons hábitos é mostrar pelo exemplo. Se os pais comem bem, fazem exercício, a criança tende a seguir esse modelo.”
Crescimento da obesidade infantil no Espírito Santo
A obesidade infantil tem avançado de forma preocupante no Estado. De acordo com dados da Secretaria da Saúde (Sesa), só nos três primeiros meses de 2025 foram registrados 10.902 casos de crianças com sobrepeso ou obesidade atendidas na Atenção Primária à Saúde.
Em 2024, o total foi de 31.983 casos — número superior ao de 2023, que já era alto (31.288). A maior incidência está na faixa etária de 5 a 10 anos.
Faixa etária mais atingida
Crianças entre 5 e 10 anos concentram a maior quantidade de novos casos. Em março de 2025, foram registrados 2.096 casos nesse grupo, o dobro do observado em janeiro de 2024.
Mas o aumento também atinge os menores de 5 anos, com 1.804 casos registrados em março deste ano. Até bebês e lactentes estão sendo afetados, especialmente por erros na introdução alimentar e excesso de fórmulas infantis.
Riscos à saúde física
Os especialistas alertam que a obesidade infantil não é uma questão apenas estética. Entre os problemas associados estão colesterol alto, hipertensão, diabetes tipo 2, problemas respiratórios, apneia do sono, puberdade precoce e alterações ortopédicas causadas pela sobrecarga nas articulações.

Impactos emocionais e sociais
Além das complicações físicas, a obesidade pode gerar graves consequências emocionais. Crianças com sobrepeso sofrem mais bullying, isolamento social, ansiedade e até depressão. “Temos visto um aumento de crianças com baixa autoestima e problemas emocionais relacionados à imagem corporal”, afirmou a pediatra Talyne Bolzan.
O papel dos ultraprocessados
Refrigerantes, biscoitos recheados, salgadinhos e sucos industrializados são alimentos ultraprocessados com alto teor de açúcar, gordura e sódio. Esses produtos têm sabor agradável, são baratos e viciam o paladar, favorecendo o consumo excessivo. “Mais de 30% das crianças brasileiras de 2 a 5 anos consomem esses produtos diariamente”, destacou Rodolfo Nicolau.
Sedentarismo e tempo de tela
O tempo excessivo em frente a telas — celulares, tablets e TVs — reduz ainda mais a prática de atividades físicas. O sedentarismo, combinado com má alimentação, é um dos principais fatores de risco.

O papel da família
Os pais têm papel central na prevenção e tratamento da obesidade infantil. “A criança segue o exemplo dos pais. É fundamental que a família toda adote hábitos saudáveis”, afirmou Isadora Vencioneck. Isso inclui evitar dietas restritivas, respeitar a saciedade da criança, não usar comida como recompensa e criar uma rotina alimentar mais natural e equilibrada.
Atividade física na infância
Praticar esportes, brincar ao ar livre, correr, andar de bicicleta ou participar de atividades em grupo são formas saudáveis e naturais de queimar calorias. “Criança tem que brincar, suar, pular. Isso ajuda muito na prevenção da obesidade”, disse Rodolfo Nicolau.
A importância do acompanhamento profissional
O tratamento da obesidade infantil deve ser feito com acompanhamento de uma equipe multidisciplinar: pediatras, nutricionistas, psicólogos e, se necessário, endocrinopediatras.
O objetivo é identificar as causas, personalizar os cuidados e promover uma mudança de hábitos sustentada.

Aleitamento materno e prevenção precoce
Entre os bebês, o aleitamento materno exclusivo até os seis meses é uma estratégia eficaz de prevenção. Ele ajuda a regular o apetite e evita a introdução precoce de alimentos industrializados. “Muitos casos de obesidade em lactentes estão ligados ao uso excessivo de fórmulas e introdução alimentar inadequada”, explicou Nicolau.
Consequências de longo prazo
Se não for tratada, a obesidade infantil pode deixar sequelas para toda a vida.

Mesmo que a criança perca peso no futuro, algumas dessas doenças são crônicas e exigem tratamento contínuo.
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