Jovens estão mais dependentes de elogios, dizem especialistas
Problema afeta cada vez mais crianças e adolescentes, segundo especialistas. Baixa autoestima e ansiedade são alguns dos sinais
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Quem não gosta de ser elogiado, de ganhar os parabéns por um feito? Mas, como disse o médico e filósofo Paracelso, no século XVI, “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”.
Segundo especialistas, o exagero de elogios das famílias, como forma de incentivo, tem tornado os jovens – crianças e adolescentes – cada vez mais dependentes da aprovação dos outros.
Na tentativa de mudar a forma mais severa de educação do século XX, em que palmadas e castigos eram a visão da época, hoje os pais, buscando evitar traumas, começaram a aplicar uma criação mais baseada no elogio, como explica a filósofa e professora de Psicologia Tania Zagury.
Os choros, a baixa autoestima e a dificuldade de lidar com frustrações são alguns dos sinais que demonstram a dependência de aprovações externas, de acordo com a psicóloga Thayse Spindola.
O sinal mais evidente dessa dependência é quando os filhos não sabem lidar com a desaprovação, segundo o psicólogo e colunista de A Tribuna, Cláudio Miranda. “O fracasso e o erro são inaceitáveis para essas crianças e adolescentes”.
A psicóloga Lana Francischetto explica que crianças e adolescentes são mais suscetíveis no processo de formação da personalidade. “É uma fase em que a aprovação aparece como fonte de validação, impulsionando-os para o desenvolvimento. Mas elogiar nem sempre significa encorajar”, frisa.
Já a psicóloga Maria Alice Fontes faz comparação com o açúcar na alimentação. “Se tem açúcar exageradamente, a pessoa pode passar a se acostumar com o sabor sempre doce, precisando de cada vez mais doces. O elogio também é gostoso, mas, em exagero, pode fazer mal, pois a criança ou o adolescente fica dependente da aprovação do outro e com falta de autoconfiança”.
O elogio pode ser um bom recurso para estimular a capacidade e o potencial de uma criança, mas é preciso ter equilíbrio, como aponta a psicóloga Patrícia Dummer.
“O excesso pode afetar negativamente a autoestima. A criança pode se frustrar ao se sentir responsável em agradar aos pais, temendo perder o amor deles, caso não atenda as suas expectativas”.
Estímulos e carinho
O reforço positivo é o que o casal Luana Pretti Bossoneli Dantas, 31, e Michael Dantas Almeida, 41, tenta aplicar todos os dias na criação da pequena Alice, de 5 anos, para que ela se desenvolva com equilíbrio emocional.
A mãe explicou que eles se policiam para que não haja excessos de elogios e nem de críticas. “O excesso desconecta do objetivo. Por isso, precisamos de muita atenção, para que não haja negligência. Em um contexto que caiba o reforço positivo, incentivamos com palavras de encorajamento e carinho”.
CONSEQUÊNCIAS DO EXCESSO DE ELOGIOS
Falta de autonomia
- A dependência de elogios pode fazer com que a criança não consiga desenvolver suas capacidades e sua autonomia. Isso porque a criança ou o adolescente pode entender que, sem esforço, ganha o mesmo elogio e se sentir desmotivada a fazer mais. Pode não desenvolver autonomia para cuidar de si mesmo, por exemplo.
- Outro efeito do elogio em excesso é que a criança ou adolescente precisa sempre da aprovação de alguém para fazer algo. Dessa forma, ela não consegue desenvolver, por si mesma, sua autonomia e suas escolhas diante dos desafios.
Baixa autoestima
- Mesmo que os elogios possam ajudar a melhorar a autoestima, em excesso, eles podem trazer o efeito contrário.
- Podem fazer com que os jovens tenham a autoestima frágil, que fiquem dependentes de avaliação e aprovação externa para fazer qualquer tipo de tarefa por acreditar que precisam ser sempre os melhores para receber elogios. Acabam acreditando que só são capazes se ouvirem isso de outras pessoas.
Narcisismo
- Uma criança que recebe muitos elogios pode desenvolver um comportamento narcisista, ou seja, tende a se achar superior às demais crianças do seu convívio, sempre se considerando dignos de tratamento superior.
- Não consegue desenvolver um julgamento real, nem ter a habilidade de uma autoavaliação.
- Pode gerar uma série de consequências, especialmente quando esses indivíduos não são admirados pelos outros como acham que deveriam ser. Isso pode causar explosões de raiva, frustrações e até crises de ansiedade.
- No entanto, a autoestima elevada que tem como base o narcisismo também é frágil, por sempre precisar de outras pessoas que atestem sua superioridade.
Falta de empatia
- O comportamento narcisista causado pelos elogios leva a outro reflexo: a falta de empatia – quando a criança ou o adolescente se acha superior e não consegue se colocar no lugar do outro. Isso pode trazer implicações sociais até na vida adulta, no mercado de trabalho e em relacionamentos.
Medo de errar
- Receber aplausos por tudo o que faz pode gerar no filho o medo de errar e decepcionar os pais. Essa criança ou adolescente pode se tornar uma pessoa que vai evitar os erros a todo custo. A criança pode se sentir pressionada a manter os altos padrões de resultados e, dessa forma, conviver com o medo de decepcionar.
- Tal pressão pode até estimular o uso de truques para se destacar. Evitando o fracasso de todas as formas, ela deixa de aprender com seus erros, não desenvolve seus potenciais.
Dificuldade em lidar com o fracasso
- Se, em casa, o jovem sempre faz algo bem feito e é elogiado, quando se depara com situações em que não é tão bom, não saberá lidar com o fracasso. Ele pode acreditar em uma falsa realidade, que tende a deixá-lo despreparado para lidar com frustrações do dia a dia.
- Também corre risco de se tornar um adulto despreparado emocionalmente e ter uma tendência maior de desenvolver ansiedade e depressão.
Dificuldade de autocrítica
- É a partir da mistura de vitórias e fracassos que se desenvolve a autoimagem. O que é dito para a criança sobre ela mesma, com talentos e fraquezas, reforça ou contraria o que uma pessoa avalia de si mesma. Uma pessoa que não escuta pontos de melhora tem dificuldades de se autoavaliar e sempre acha que a culpa é do outro que está fazendo a crítica.
Fonte: Especialistas consultados.
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