“Sobrecarga do cérebro afeta memória e imunidade”, diz especialista
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As mudanças do cenário pandêmico já duram mais de um ano e se somam a outros fatores estressantes de âmbito profissional, familiar ou social. Tudo junto leva a uma sobrecarga no cérebro que tem repercussão em todo o organismo e pode provocar ansiedade, problemas de memória e até baixa imunidade.
Isso ocorre porque vivenciar uma situação prolongada de estresse altera os níveis hormonais e de neurotransmissões, explica o doutor em Neurocirurgia e professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Walter Fagundes.
“Os neurotransmissores são mensageiros químicos. São substâncias que fazem a intermediação entre um neurônio e outro. Então é importante que a gente tenha uma quantidade adequada de diferentes neurotransmissões para que os neurônios se comuniquem e façam o controle de absolutamente todas as nossas atividades corporais.”
Uma forma de aliviar o peso é descansar a mente, afastando-se do fator estressante, recomenda Walter. Isso associado a um estilo de vida saudável, com alimentação equilibrada e prática de exercícios.
“É fundamental que a gente reserve momentos na nossa semana ou no nosso dia para ter momentos de lazer e prazer. Durante esses momentos, nós produzimos neurotransmissores específicos de alegria”, afirma.
Bater um papo com amigos, tomar um vinho, ver um filme, ler... O que quer que proporcione prazer, o que pode variar muito de uma pessoa para outra.
A Tribuna - As pessoas já vinham em um ritmo acelerado mesmo antes da pandemia. O cenário pandêmico aumentou a sobrecarga?
Walter Fagundes - Não acho que isso se intensificou. Percebo que é uma questão crônica de estresse que ocorre com muita gente e que agora tem outro aspecto envolvido, que é a questão social de pandemia, de confinamento, de isolamento social, de perda de emprego. Normalmente, o estresse crônico tem alguns aspectos, que geralmente são relacionados à profissão, à família e à sociedade.
O que causa a sobrecarga é o estresse?
O estresse é uma sobrecarga que pode existir em diferentes aspectos. Pode ser no trabalho, então se está trabalhando demais, ou se tem dois ou três empregos, por exemplo. Ou então se tem um parente doente que cuidar, além de outros aspectos da própria sociedade, como ter de pegar dois ou três transportes para ir ao trabalho.
Associado a esses problemas, que pode ser dessas esferas profissional, familiar e social, há nessa condição pessoas que têm uma alimentação ruim, que não fazem uma atividade física regular e que não têm uma atividade intelectual. Tudo isso acaba levando a uma sobrecarga, que é o que a gente chama de estresse.
O funcionamento do cérebro é afetado?
Sem dúvida! Essa sobrecarga leva a um desequilíbrio orgânico, com repercussão nos níveis de hormônios, principalmente o cortisol; e de alguns neurotransmissores, principalmente a serotonina, o glutamato, o GABA e a adrenalina.
Os neurotransmissores são mensageiros químicos. São substâncias que fazem a intermediação entre um neurônio e outro. Então é importante que a gente tenha uma quantidade adequada de diferentes neurotransmissores para que os neurônios se comuniquem e façam o controle de absolutamente todas as nossas atividades corporais.
Existem diferentes neurotransmissores e cada um tem funções específicas. Alguns relacionados à memória, por exemplo, o GABA.
Tem a serotonina, relacionada à ansiedade, à depressão e ao humor. Um paciente deprimido usa medicação que aumenta a quantidade de serotonina no cérebro e a serotonina melhora o humor desse paciente e reduz um pouco a ansiedade.
Então esses neurotransmissores são fundamentais para que o cérebro funcione de maneira normal.
Os sintomas são psicológicos ou existem sinais físicos?
Tem sinais físicos e psicológicos. Os mais comuns são dores (de cabeça ou no corpo). Pode ter irritabilidade; depressão; ansiedade; distúrbio de memória, com esquecimento; alteração no apetite, que às vezes é uma compulsão alimentar e às vezes é falta de apetite; sensação de cansaço; distúrbios gastrointestinais, que pode ser tanto diarreia quanto constipação; baixa de imunidade com infecções oportunistas; e até manifestações mais graves, como hipertensão arterial, gastrites e doenças autoimunes. Tudo tem correlação com essa sobrecarga.
No ponto de vista social, é comum o aumento no consumo de bebida alcoólica ou de drogas como consequência desse desequilíbrio hormonal e de neurotransmissores.
Como lidar com o estresse para evitar as consequências?
O ideal é ter uma vida saudável e buscar equilibrar diferentes pilares da vida. Todo mundo quer viver 200 anos, mas ninguém quer fazer o que precisa ser feito. Já sabemos que o que prolonga a vida e a vida com qualidade, é uma seguir uma alimentação saudável; se exercitar regularmente; ter atividade intelectual, como ler livro, ver filmes, estudar músicas, colocar o cérebro para pensar.
Ter ambiente de trabalho saudável e ambiente familiar saudável. E também momentos de lazer. Sair, passear, ir a um parque, ir à praia, praticar algum esporte. Associado a questões de controle de estresse.
Claro que estamos falando de um ponto de vista de estresse crônico. Porque tem episódios de estresse agudo (que passa) que são naturais, como com a perda de um familiar ou emprego que gostava.
Em relação à pandemia, foge do nosso controle. Então temos de tentar trabalhar algumas coisas como conseguimos. As academias estão fechadas, mas podemos nos exercitar em casa.
Também temos que pontuar a questão de tratamentos medicamentosos, que conseguem trazer os neurotransmissores para um equilíbrio e proporcionam melhora importante no quadro de estresse.
Além de outros tratamentos não medicamentosos, como psicoterapia, e alguns não tão comprovados como aromaterapia, massagens e ioga. São medicinas holísticas que de alguma forma podem ajudar.
Como os momentos de lazer contribuem para o alívio da sobrecarga?
Esses momentos são fundamentais. Fico triste quando paciente fala que há cinco anos não tira férias, um período para repor a energia.
É fundamental que a gente reserve momentos na nossa semana ou no nosso dia para ter momentos de lazer e de prazer, que podem variar muito de pessoa para pessoa. Pode ser bater um papo, tomar um vinho, ver um filme, jogar com os filhos. Durante esses momentos, produzimos neurotransmissores específicos de alegria.
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