Aposentados vão à Justiça contra risco de calote em precatórios
Intenção das entidades é retirar os precatórios da Previdência Social do texto da proposta que vai ser votada pelos senadores
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A possibilidade de parcelamento no pagamento dos precatórios tem tirado o sono de aposentados e pensionistas do País. A preocupação é tanta que os sindicatos que representam a categoria estão estudando o que pode ser feito para ajudar quem tem dinheiro a receber da União.
Uma das medidas já foi tomada. O Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), juntamente com a Força Sindical e a Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM), vai ingressar na Justiça contra a proposta.
A intenção é retirar do texto os precatórios da Previdência Social. “Isso tem preocupado muito. Imagina a pessoa esperar a vida toda para receber um precatório e agora correr esse risco? Isso são créditos alimentícios. Tem gente que se programou há muito tempo. São pessoas que estão no final da vida, no momento que mais precisa de socorro financeiro”, afirmou Jânio Araújo, presidente do Sindnapi do Espírito Santo.
De acordo com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o governo federal tem R$ 89,1 bilhões em precatórios para pagar até o final de 2022. Somente no Estado, cerca de 1.500 pessoas estão esperando para receber o dinheiro.
A PEC já passou pela Câmara e precisa ser aprovada em dois turnos pelo Senado. Caso também receba o aval dos senadores, o teto de pagamentos previsto para o ano que vem será de R$ 44,5 bilhões.
O texto prevê algumas possibilidades para que a pessoa consiga receber o dinheiro à vista, caso não seja contemplada com o pagamento no ano que vem. Uma delas é aceitar receber no ano seguinte, com desconto de 40%.
Mas a advogada previdenciarista Tamires Freitas alertou sobre as perdas. “Não vale a pena perder esse montante bem considerável, a não ser em casos urgentes em que o cidadão não pode esperar. Como por exemplo, gastos com saúde e garantia de financiamento de uma casa própria”, explicou.
Outra possibilidade para quem não quiser esperar é vender o precatório para alguma instituição financeira. Mas, nesse caso, a pessoa também teria um desconto.
Segundo Tamires, esse mercado tem ganhado força para quem quer garantir o dinheiro sem burocracia. “Mas só indico em último caso, devido a perda financeira, o deságio em si”, ressaltou.

Medo da aprovação
Uma família que está com medo da aprovação da PEC dos Precatórios é a da pensionista Domingas Nascimento Coutinho, de 77 anos, e da filha dela, Angelina do Nascimento Coutinho, de 54.
Elas estão na fila para receber os valores no ano que vem, referente à revisão de aposentadoria do pai de Angelina, que morreu em 2017.
“Minha mãe precisa desse dinheiro para fazer um tratamento médico e temos medo de isso afetar a gente. Esse dinheiro é para cuidar dela, fazer com que ela tenha uma qualidade de vida melhor”, disse.
Disputa para garantir o pagamento deve ir ao STF
A PEC dos Precatórios deve ser alvo de contestações judiciais no Supremo Tribunal Federal (STF) caso seja aprovada no Senado. Isso porque, segundo especialistas, adiar o pagamento de precatórios já expedidos pela Justiça contraria o princípio de coisa julgada, que é cláusula pétrea da Constituição.
Ao criar um teto para o pagamento de despesas do governo decorrentes de decisões judiciais, na prática a PEC adia o pagamento de precatórios já expedidos.
A decisão de uma possível inconstitucionalidade pode demorar anos, de acordo com Cristina Daher, advogada especialista em Direito Público. “O Judiciário tem um universo de demandas que acaba inviabilizando julgamentos mais céleres”, explicou.
Ela destacou ainda que os motivos de a proposta poder ser declarada inconstitucional são muitos. Um deles é o próprio parcelamento dos valores, proposto pelo texto que está em votação no Congresso.
“Esse valor pode ser pago em até nove anos a partir do momento da expedição. Ou seja, o sujeito esperou todo o trâmite, recebeu a ordem de pagamento que entrou numa fila e, quando chegou no momento de pagar, o valor ainda pode ser parcelado em até nove anos.”
Ainda de acordo com Daher, outra possibilidade que a PEC abre é a compensação dos valores com bens da União. “Não é um bom negócio porque a pessoa não vai receber o dinheiro e sim um patrimônio da União. A pessoa terá que assumir um série de ônus, como por exemplo, alguns registros”.
A advogada também destacou a taxa de juros aplicada em caso de parcelamento, que é a Selic. “Atualmente, não representa muita coisa”, finalizou.
Proposta para viabilizar Auxílio Brasil
O que é precatório?
- O precatório é uma requisição de pagamento feita ao poder público, pelo Judiciário. Por meio dele, o poder público realiza o pagamento de dívidas relativas aos processos nos quais está envolvido e que já transitaram em julgado.
- Como não cabe mais contestação, essas dívidas devem ser cumpridas.
- Essas ações são demoradas. As pessoas ficam um bom tempo para conseguir ganhar na Justiça, e o processo pode levar anos.
Valores
- Os precatórios envolvem valores acima de 60 salários mínimos, o que equivale hoje a R$ 66 mil. Valores abaixo disso são pagos com Requisições de Pequenos Valores.
Algumas mudanças
- A proposta de emenda à Constituição (PEC) muda o pagamento de despesas do governo decorrentes de sentenças judiciais e altera o cálculo do teto de gastos. Ela é apontada como solução pelo presidente Jair Bolsonaro para viabilizar o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400.
- Se a PEC for aprovada no Senado, cerca de 1.500 ações de empresas e pessoas físicas podem ser afetadas no Estado.
- Os precatórios que não forem expedidos por causa do teto terão prioridade para pagamento nos anos seguintes, reajustados pela taxa Selic, acumulada mensalmente.
- O texto oferece aos credores a possibilidade de fechar acordo para receber o valor até o final do exercício seguinte, caso concordem com um desconto de 40%.
- A PEC também permite que empresas e pessoas físicas credoras da União usem seus precatórios para quitar débitos junto ao governo, e comprar imóveis da União.
- Prefeituras e governos estaduais poderão usar seus precatórios para quitar dívidas com a União.
Insatisfação
- A PEC vem sendo considerada por especialistas como um calote do governo federal.
- Para tentar retirar do texto os precatórios de natureza previdenciária, o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi) vai ingressar com uma ação na Justiça.
- Já a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) emitiu uma nota técnica afirmando que a PEC dos Precatórios é a sexta tentativa de calote nos brasileiros nos últimos anos.
- Ainda de acordo com a nota técnica, a medida é inconstitucional. De acordo com a Ordem, o texto descumpre decisões judiciais anteriores, que já foram declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Fonte: Especialistas ouvidos, Jornal O Globo, Portal UOL, CNN e pesquisa A Tribuna.
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