Famílias de vítimas de incêndio reclamam de falta de sensibilidade do Flamengo

O calvário de Marília Barros é ainda maior, de modo que o incêndio que vitimou seu filho no CT do Flamengo não é a primeira tragédia com a qual tem de lidar. Ela ficou viúva depois que seu marido foi assassinado a tiros. Dez anos depois, perdeu seu único filho, Arthur Vinicius, batizado com esse nome em homenagem ao maior ídolo da história do Flamengo, Arthur Antunes Coimbra, o Zico.
"Não tenho mais um telefonema, um abraço do meu filho. O que ficaram foram as recordações boas, as lembranças, mas é uma dor que a gente sabe que nunca mais vai passar. Nunca mais vou ser feliz novamente. Por que eles não resolvem essa pendência, para acabar com isso?", questionou Marília, que tatuou no braço esquerdo a imagem do filho trajado com a camisa do Flamengo.
Arthur faria 15 anos justamente no dia em que foi enterrado em Volta Redonda, sua cidade natal. Foi para comemorar o aniversário do colega que vários meninos dormiram na concentração naquela noite. "Lembro que quando fui falar com o diretor da base, eu chorei. Eu disse que tinha medo de levar meu único filho para uma cidade violenta como o Rio. Essa era minha única preocupação. E olha só, no lugar onde meu filho deveria estar mais seguro foi onde ele perdeu a vida", recordou Marília. A mãe de Arthur desenvolveu ansiedade, teve alguns problemas de saúde e hoje se apega à fé para atenuar a angústia.
Insensibilidade
A principal reclamação das famílias no caso é quanto à inexistência de diálogo do Flamengo. Eles alegam que o clube só se mostrou presente nos dias seguintes à fatalidade. Depois disso, os dirigentes, dizem os familiares, sequer mantêm contato. Eles entendem que falta sensibilidade por parte do clube.
"O que faltou dessa diretoria é a sensibilidade. Se após o acidente tivessem ido à casa de cada familiar, já estaria tudo resolvido. Queremos um abraço, nos sentir acolhidos", pontuou Darlei Pisetta, pai do ex-goleiro Bernardo, morto aos 14 anos. "A gente já perdeu nosso maior bem que a gente tinha. Mexer com essa ferida é difícil. Até tentei uma aproximação, mas o clube não conversa com as famílias", acrescentou o gerente de compras, que reside em Indaial (SC).
A fala de Darlei é corroborada por Alba Valéria, mãe de Jorge Eduardo, que morreu aos 15 anos. "Não tenho nenhum contato com eles. Nunca recebemos um telefonema. Do presidente e dessa diretoria do Flamengo esperamos justiça e que eles sejam mais humanos", opinou a auxiliar de serviços de educação básica, moradora de Além Paraíba (MG).
O defensor público do Rio, Eduardo Chow, também criticou a conduta flamenguista. "É uma situação desigual, mesmo com as instituições públicas presentes, porque o Flamengo tem toda a estrutura e as famílias não. O clube tem uma postura de não dialogar. Não compreendemos as razões dessa postura intransigente", ressaltou. A Defensoria Pública do Rio representa a família de Samuel Rosa e também atua no caso na ação coletiva.
Procurado pelo Estado, o Flamengo não quis falar sobre o assunto O clube preferiu se pronunciar a respeito das negociações por meio de um vídeo divulgado pela Fla TV em que os dirigentes rubro-negros responderam a perguntas previamente selecionadas.
"O clube esteve sempre aberto a negociação, mas, depois de muito discutir internamente, nós estabelecemos um teto. Nós estamos dispostos a dentro desse teto discutirmos com as famílias, tentarmos adaptar a cada necessidade específica de família, uma forma de atendê-los dentro daquele teto estabelecido pelo clube", afirmou o presidente Rodrigo Landim, na ocasião.
"Esse valor que nós oferecemos, três famílias e meia aceitaram. Não podemos tratar a tragédia de uma forma para uma família e de outra forma para outra família. O nosso valor oferecido, que nós consideramos satisfatório, e três famílias e meia também consideraram, é a nossa oferta. A gente tem um limite", disse o vice-jurídico, Rodrigo Dunshee.
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