Ney Matogrosso: “Matava aula para ir ao cinema”
Famoso por sua carreira musical, Ney Matogrosso contou à reportagem de A Tribuna sobre sua paixão pela sétima arte
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Mais conhecido por sua contribuição na música, Ney Matogrosso, 83, também percorreu um caminho no cinema, onde participou de trabalhos experimentais e associados à produção autoral brasileira.
O artista, que viu nos palcos a chance de mostrar sua performance teatral e intuitiva, sempre sonhou com a carreira de ator e tem uma ligação com a sétima arte que carrega desde a infância.
“Matava aula para ir ao cinema. Estudei num ginásio em Campo Grande, no subúrbio do Rio, que tinha um cinema onde o porteiro deixava a gente ver filmes proibidos, os franceses, porque tinham muita gente nua”, lembrou ele, durante coletiva em Vitória, na última quinta-feira (24).
Ney recordou ainda que foram nessas “fugidas” da escola que ele assistiu ao filme “Os Amantes do Tejo” (1955). Através da produção, conheceu a saudosa atriz francesa Françoise Arnoul e ouviu, pela primeira vez, “Barco Negro”, composição que ganhou releitura na voz dele em seu primeiro disco solo, “Água do Céu - Pássaro” (1975).
“Aquela música nunca me largou. Tinha uma vizinha que cantava e eu pensava: 'meu Deus, essa música me persegue'. E aí gravei no feminino, porque era impossível cantá-la no masculino”.
Ele esteve na capital capixaba para receber o Troféu Vitória, símbolo máximo do Festival de Cinema de Vitória. “Fico feliz com a homenagem, porque então estão me considerando do cinema também, não é isso?!”, sugeriu, com um sorriso largo, o cantor que teve sua vida contada no filme “Homem com H”, de Esmir Filho.
Durante o bate-papo com os jornalistas, ele recordou a sua contribuição para a sétima arte, com destaque para o longa “Luz nas Trevas — A Volta do Bandido da Luz Vermelha” (2010), em que fez sua estreia como protagonista. A obra inaugurou sua parceria com a diretora Helena Ignez, que também estava presente na coletiva.
“A primeira cena que fizemos era dentro de uma cela e tinha um texto enorme. Falei pra Helena: 'bota tudo lá na parede, em letras grandes, porque não preciso ler, só preciso passar os olhos para lembrar. E foi feito assim”, disse, aos risos.
“Você se revelou um ator carismático, único”, elogiou a cineasta.
O que ele diz sobre
Impacto de “Homem com H”
“Sou uma pessoa que sempre viveu a minha vida, independente de mundo, de autoridades, de pai. Fico muito feliz de poder estar estimulando as pessoas a assumirem a sua verdade. Porque a gente tem que viver com a nossa verdade. Não podemos viver submetidos à verdade e nem à vontade de ninguém”.
Cazuza
“O filme ('Homem com H') traz o meu ponto de vista sobre o Cazuza, porque todo mundo fala, 'ah, Cazuza era doidão, Cazuza era agressivo...' Mas todo mundo tem um momento que descompensa, né? Ele comigo era aquela coisa que eu ficava louco, suspirando de amor”.
Convites para atuar
“Eu não tenho feito tantas coisas mais regularmente. Mas eu sou satisfeito com todas as coisas que eu fiz. Se houver convites, e que me interessem, eu faço sim”.
Mosteiro Zen Budista
“Vim aqui visitar uns amigos e fui parar no mosteiro. É que conheci o monge e ele me convidou para passar uns dias lá, e eu fui!
Fiquei lá, não sei, uns cinco dias talvez, só que eles não exigiam de mim as formalidades que eles exigem para quem está lá, né? Eu dormia até tarde, não precisava acordar às cinco da manhã... Mas eu gostei muito dali”.
Primeiro amor capixaba
“Ele morreu, foi assassinado. Era meu coleguinha no quartel e que era daqui do Espírito Santo. Quer dizer, coleguinha, não. Foi meu primeiro amor na vida. Eu tinha 17 anos. Nunca concretizamos nada, mas o amor existia.
Voltei a encontrá-lo aqui no Espirito Santo, quando fiz show. Fomos para o hotel, ficamos a noite inteira conversando, mas não nos tocamos porque ele já era casado, tinha filhos, e eu não queria nada também...”

Enredo de Carnaval
“As escolas de samba me convidavam desde os anos 70 e eu sempre dizia 'não'. Mas, eu vim dizendo 'sim' para tantas coisas nesses últimos anos que, quando os representantes da Imperatriz Leopoldinense me procuraram, eu aceitei.
Por incrível que pareça, eu não sou de Carnaval. Já assisti umas duas vezes aos desfiles das escolas. É lindo. Ali existe uma disciplina e uma organização que poucas vezes eu vi. Que é admirável no brasileiro”.
Desfile na Sapucaí
“Acho que venho como a pessoa, não venho fantasiado de nada. Não é que vou fazer um striptease na avenida. (Risos) Mas eu não sei ainda, a gente não conversou sobre. Mas eu não pretendo vir além de mim porque é cansativo”.
Aniversário dia 1º de agosto
“Não penso em aniversário. Não faço festa já tem muitos anos. Não gosto de dar festa. Todo mundo se diverte e eu fico exausto, sabe? Então não pretendo fazer festa. Vou fazer 84 (no dia 1º de agosto) e vamos nessa!”
Moralismo
“Cada momento é cada momento, mas eu acho que as pessoas estão se esquecendo delas. Na medida em que um jovem fica problemático, moralista, ele está se esquecendo dele, da vida dele. Faço apologia à liberdade de expressão, à liberdade individual”.
Futuro
“Não tenho preocupação com o futuro. Vou vivendo. Enquanto tiver gás, estarei aqui. Mas também na hora que for para ir embora, eu vou”.
Finitude da vida
“Tenho plena aceitação. É a única certeza que a gente tem. Espero chegar na hora e estar tranquilo assim. Vamos viver enquanto podemos porque vamos todos chegar lá. Infelizmente essa notícia eu tenho que dar”, disse, aos risos.
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