Taxa de fecundidade: falta de jovens no trabalho preocupa
Queda na taxa de fecundidade e falta de jovens no mercado de trabalho acendem alerta sobre futuro econômico e sustentabilidade da Previdência
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O número cada vez menor de filhos por mulher, o envelhecimento acelerado da população e o adiamento da maternidade já deixaram de ser apenas dados demográficos: tornaram-se um problema econômico urgente.
No Espírito Santo, a baixa taxa de fecundidade e a queda na entrada de jovens no mercado de trabalho têm preocupado empresários e especialistas.
O vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado (Fecomércio-ES), José Carlos Bergamin, afirma que a preocupação se estende a todos os segmentos produtivos.
Ele alerta para um verdadeiro apagão de mão de obra, que atinge desde funções de baixa até alta qualificação. “Pior é que não vislumbramos melhora”.
Marcel Lima, head de Dados e Tendências Macroeconômicas do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Espírito Santo (Ibef-ES), cita os setores mais impactados, que são aqueles que exigem elevada capacitação por parte dos profissionais.
“A dificuldade em encontrar mão de obra aumenta conforme o nível de especialização necessária para o cargo. Adicionalmente, uma eventual substituição desses profissionais por novas ferramentas tecnológicas é menos provável, reduzindo alternativas para o empregador”, disse Marcel Lima .
Presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Estado (ABIH-ES), Fernando Otávio Campos salienta que o cenário aponta que cada geração terá menos trabalhadores com potencial para sustentar uma base crescente de inativos.
“Na hotelaria, que depende de serviços intensivos em mão de obra, já sentimos na prática: queda no número de candidatos para recepção, cozinha e camareira, pressão salarial e maior rotatividade”, ressaltou Fernando Otávio.
Para ele, quem sair na frente investindo em automação, qualificação constante e políticas de atração de talentos terá vantagem competitiva.
Pablo Lira, diretor-geral do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), aponta que, a cada década, a população em idade ativa vem diminuindo devido à queda no número de nascimentos.
“Isso é preocupante, especialmente para as próximas décadas. Mas vale destacar que, atualmente, o Estado registra a menor taxa de desemprego – ou desocupação – dos últimos 40 anos”, finaliza.
Superar o problema
A redução de jovens na pirâmide etária é uma realidade. Mas qual o caminho para driblar esse cenário? Para Pablo Lira, diretor-geral do Instituto Jones dos Santos Neves, a resposta está na integração entre políticas públicas e ações da iniciativa privada voltadas à qualificação da mão de obra.
Ele destaca também a importância de programas de intercâmbio de conhecimento e formação profissional, inclusive possibilitando que profissionais locais estudem no exterior.
“China e Coreia do Sul investiram em seus cientistas e profissionais, enviando-os para se capacitar nas melhores universidades do mundo. Esses profissionais voltaram para seus países e multiplicaram esse conhecimento, contribuindo fortemente para o desenvolvimento local”.
O que eles dizem
Atividade econômica
“Sob a ótica individual, os jovens que não se inserirem no mercado de trabalho, na média, terão mais dificuldade de conseguir emprego posteriormente. A falta de experiência e idade avançada são componentes detratores no geral. Em um contexto mais amplo, a falta de jovens no mercado de trabalho impacta diretamente a atividade econômica, reduzindo a prosperidade da população como um todo”.
Marcel Lima, head de Dados e Tendências Macroeconômicas do Ibef-ES
Apagão
“Vejo esse cenário com muita preocupação em todos os segmentos produtivos. Já enfrentamos um apagão de mão de obra e não vislumbramos melhora no curto prazo. A nossa economia ainda não está aquecida. Portanto, se projetamos um crescimento econômico para o futuro, precisaremos de mais profissionais qualificados. Mas, se já enfrentamos escassez agora, imagine como será nos próximos anos”.
José Carlos Bergamin, vice-presidente da Fecomércio-ES
“Importação” de equipes do Nordeste vira saída
Diante da dificuldade de mão de obra, a contratação de idosos e “importação” de equipes do Nordeste viram alternativa. Vice-presidente da Fecomércio-ES, José Carlos Bergamin, disse que a contratação de idosos, que era comum na Europa pela falta de jovens, já é também realidade no Brasil, e tem sido uma alternativa bastante razoável e com ótimos resultados.
“A vida se alinhou e os chamados jubilares, pessoas com mais de 50 anos, estão com muita saúde e vigor, além de muito comprometidos com as suas obrigações”.
Presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Estado (ABIH-ES), Fernando Otávio Campos, também confirma que isso já é realidade.
“Hotéis e construtoras capixabas vêm recrutando profissionais do interior do Nordeste, via feiras de emprego, oferecendo alojamento e treinamento. A migração interna é vantajosa pois o Nordeste ainda mantém taxa de fertilidade acima de 1,8 e uma população relativamente jovem. Paralelamente, profissionais 60+ tornam-se imprescindíveis em áreas onde a experiência pesa mais que o vigor físico (governança, reservas, compras)”.
Marcel Lima, head de Dados e Tendências Macroeconômicas do Ibef-ES, no entanto, aponta que, no curto prazo, pode ser uma alternativa, mas é importante estruturar projetos de longo prazo. “Contar com profissionais em idade avançada e fluxos migratórios para suprir necessidades internas não parece uma solução perene”.
Problema para a Previdência e futuro sem aposentadoria
A Previdência Social está estruturada no chamado regime de repartição. Isso significa que as contribuições dos trabalhadores em atividade financiam os benefícios dos aposentados.
Nesse contexto, como explica Marcel Lima, head de Dados e Tendências Macroeconômicas do Ibef-ES, a falta de trabalhadores impacta diretamente as aposentadorias, e isso deve se agravar no futuro.
“É natural que, com a urbanização e o desenvolvimento social, os casais tenham cada vez menos filhos. Com menos trabalhadores, novas reformas previdenciárias serão necessárias”.
No seu entendimento, uma solução alternativa seria a conversão do sistema de regime de repartição para capitalização (onde o trabalhador acumula recursos para a própria aposentadoria no futuro).
“Muito semelhante ao que acontece nas previdências privadas”, comparou.
Já o empresário José Carlos Bergamin, vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado (Fecomércio-ES), afirmou que, nos moldes em que a Previdência é operada atualmente, ela está, certamente, com os dias contados.
“As pessoas se aposentam jovens e vivem muitos anos recebendo benefícios. As contribuições são baseadas na folha de pagamento, então, se substituímos um posto de trabalho por uma máquina, nada é recolhido para a Previdência. Para não colapsar, o sistema precisa ser completamente reformulado – e com urgência”, destacou o vice-presidente da Fecomércio-ES.
Análise: “A escassez pode ser um impulso positivo”

“A queda na taxa de fecundidade e o adiamento da maternidade revelam novos tempos e mudanças significativas de comportamento.
Com menos jovens entrando no mercado de trabalho, empresas de diferentes setores já enfrentam desafios crescentes para atrair, formar e reter talentos.
O futuro exigirá mais inclusão produtiva, valorização da diversidade geracional e combate ao etarismo. Será essencial adaptar práticas de gestão, investir em tecnologia e repensar o papel dos trabalhadores com 50 anos ou mais.
Nesse novo cenário, a escassez de mão de obra pode, paradoxalmente, funcionar como um impulso positivo: um estímulo à construção de um mercado de trabalho mais inovador, humano e estratégico — capaz de aproveitar o melhor de todas as gerações”.
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