Cinco mil demissões por mau uso das redes sociais
Número de casos mais que dobrou em 1 ano no Estado. Popularização de novas ferramentas e vídeos em redes sociais estão entre os motivos
As redes sociais, que até há pouco tempo eram utilizadas mais em caráter pessoal, passaram a ter um grande peso para construir uma boa imagem profissional. Mas especialistas alertam: cuidado com a relação do ambiente digital com o mercado de trabalho, já que excessos estão resultando em demissões.
No Estado, um dado chama a atenção: o número de demissões por uso das redes sociais mais que dobrou em um ano e já chega a cerca de cinco mil, segundo estimativas de especialistas do setor.

Em abril do ano passado, por exemplo, o mau uso das redes sociais resultou em 150 demissões por mês. Nos últimos 12 meses, o número de desligamentos mensais, em média, superou 400.
Especialistas ouvidos pela reportagem, a exemplo do psicólogo e consultor de carreiras Elias Gomes e da psicóloga e especialista em pessoas e carreiras Gisélia Freitas, apontam que a popularização de novas ferramentas e vídeos em redes sociais estão entre os principais motivos.
“As pessoas estão muito expostas online, muitas vezes usando uniforme, identificação profissional, no ambiente de trabalho, e isso pode acabar em demissão dependendo conteúdo”, explica Elias Gomes.
Ele comenta que não só dancinhas e vídeos têm causado demissões, mas também posicionamento político, comentários racistas, homofóbicos, xenofóbicos e opiniões que de alguma forma possam manchar a imagem da empresa.
Já Gisélia comenta que as empresas estão muito rígidas atualmente e não querem ter seu nome associado à pessoas com comportamentos que possam trazer prejuízos para elas.
“Muitas pessoas não estão sabendo separar o trabalho do mundo virtual e nem entendem que as empresas não aceitam mais certos comportamentos. Elas perderam a paciência com os profissionais que não prezam pela imagem de onde trabalham e não pensam duas vezes antes de demitir alguém assim”, comenta Gisélia.
Doutor em Direito, o juiz titular da 7ª Vara do Trabalho de Vitória, Marcelo Tolomei Teixeira, confirma que demissões por essa motivação têm parado na Justiça do Trabalho.
“Temos diversas decisões sobre esses temas, até mesmo casos de demissões por justa causa”, finaliza o magistrado.
Empresa monitora os empregados
Atento a publicações nas redes sociais, um analista do setor de Recursos Humanos de uma empresa no segmento de transportes, que pediu para o seu nome não ser revelado para preservar o grupo onde trabalha, admitiu que monitora o comportamento dos seus funcionários no ambiente digital.
Apesar do rigor na tentativa de evitar que postagens possam prejudicar a imagem da empresa, ele assegura que algumas publicações em redes sociais são vistas com bons olhos.
“Incentivamos algumas dancinhas no nosso setor comercial, por exemplo, com intuito de divulgar nas nossas redes sociais”.
Ele lembra porém que essas ações devem passar pela aprovação das supervisão geral e do setor de marketing da empresa.
Limites e as consequências
Liberdade de expressão
Apesar do empregado ter liberdade de expressão em sua vida privada, alguns cuidados devem ser tomados na utilização das redes sociais, como forma de garantir um bom ambiente de trabalho.
Atenção ao sigilo
Cuidado com postagens envolvendo ambiente de trabalho ou durante o expediente. Muitas vezes, o profissional pode sem querer, sem saber, mostrar coisas ou revelar informações sigilosas da organização. Isso pode causar um transtorno não só dentro da empresa, mas também judicialmente.

Informação nunca é demais
Antes de tomar qualquer atitude que possa impactar de forma negativa na relação de trabalho e até mesmo prejudicar a imagem da empresa, informe-se com o chefe sobre qual a política da empresa em relação as rede sociais.
Comentários
Cuidado em relação a comentários e fofocas dentro da empresa. Não ajude a propagar comentários maldosos de colegas e chefes. A orientação é ficar em silêncio diante de algum tipo de fofoca.
Se é para falar alguma coisa, que seja algo positivo, que vai melhorar o ambiente de trabalho, que vai fazer com que as pessoas estejam ainda mais felizes trabalhando.
Penalidades
Dependendo da gravidade da publicação nas redes sociais o empregado poderá ser demitido até com justa causa.
Além disso, diante de casos graves ele poderá ser condenado a pagar indenização por danos morais ou materiais à empresa.
Fonte: Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-ES) e Marcelo Tolomei Teixeira, juiz de Direito.
Casos de fofoca assustam empresas
As empresas acenderam o alerta com o aumento das fofocas e conversas paralelas no ambiente de trabalho. A situação vem crescendo e está assustando com a volta do modelo presencial, após muitas empresas terem adotado o home office durante o pico da pandemia da covid-19.
O fluxo maior de pessoas trabalhando juntas tem criado situações que fazem os setores de gestão pessoal de empresas ficarem de olho no que é dito pelos funcionários.
Eliú Junior, analista de Recursos Humanos, conta que agora é comum escutar conversas que antes nunca chegavam ao departamento. “Algumas pessoas vão até o RH perguntar sobre assuntos que ainda não foram divulgados oficialmente e que até o momento eram de conhecimento de um grupo bem restrito, ainda sendo preparado para divulgação”.
Ele comenta também que um dos temas das fofocas são os rumores de demissões de funcionários. “É nítida a diferença do número de comentários em relação a um ano atrás”, comenta.
Sarah Rosado Pereira, CEO da Suprema Consultoria RH, fala sobre o retorno ao trabalho presencial após meses no home office. “As pessoas ficaram isoladas e, sem supervisão direta, alguns colaboradores enxergavam uma certa liberdade para fazer postagens variadas nas redes sociais. Mesmo retornando para o trabalho presencial, muitos continuam se achando livres para postar e até falar do chefe, dos colegas de trabalho”.

Em um dos casos, um funcionário espalhou fofocas para o chefe, dizendo que dois colegas do setor administrativo ficavam mais de cinco horas diárias nas redes sociais e ele estava ficando sobrecarregado. Após apurar o caso, a empresa descobriu que quem estava priorizando as redes sociais era justamente quem estava fazendo a fofoca. Ele foi advertido.
Bruna Oliveira Galon Nobre advogada especialista em Direito e Processo do Trabalho destaca que as empresas não querem vincular o nome delas a polêmicas para não se “sujar”. Isso, segundo ela, acontece muito quando alguém faz uma declaração racista, por exemplo, ou piadas machistas publicamente.
“Com as empresas cada vez mais aderindo a programas de compliance, essa prática de demissão por postagens ou comportamentos inadequados fora do local de trabalho que geram essa revolta pública e que podem atrelar o nome do funcionário a uma empresa, tem gerado demissões por não seguir os programas de normas, procedimentos internos e ética empregados no local de trabalho”.
Empregado pode ser punido com indenização à empresa
Na hora de postar conteúdos, lembre-se que dependendo do que for dito nas redes sociais as informações poderão trazer consequências, como demissão que pode ser por justa causa, além do empregado ter de pagar indenização à empresa.
O juiz titular da 7ª Vara do Trabalho de Vitória, Marcelo Tolomei Teixeira, ressalta que cabe ao empregado compreender que as redes sociais são ambiente quase sempre públicos.
“Assim, deve evitar falar mal da empresa e de seus colegas, assim como expor suas imagens em situações vexatórias , principalmente quando atende a clientela da empresa”.
Da mesma forma, ainda segundo o magistrado, é preciso tomar cuidado com declarações racistas, homofóbicas entre outras, que atentem contra a lei ou contra, como destaca, “vamos chamar assim –de uma moralidade média”.
“Dependendo da gravidade poderá ocorrer punição até com justa causa. Tem que ser feita uma avaliação da gravidade. Agora, se situação for muito grave, cabe até pagamento de indenização por danos morais (se afetar a imagem da empresa) ou materiais (se houver prejuízo certo)”.
Sobre isso, Tolomei exemplificou: “O empregado faz acusação sobre a precariedade da cozinha do restaurante que trabalha, isso gera terrível dano na imagem da empresa e pode afetar a clientela”.
Outra coisa que se tem observado, segundo ele, é quando o empregado alega estar doente ou enfermo e faz postagens em baladas ou praticando esporte. “Essa conduta também que demonstra sua mentira é que pode gerar a quebra da confiança com aplicação de demissão por justa causa”.
Por fim, ele avisa: “Embora se deva admitir a liberdade do empregado em sua vida privada algumas prevenções devem ser tomadas, na utilização das redes sociais, como forma de garantir um bom ambiente de trabalho”.
Premiação acaba criando conflitos
Algumas ações de empresas pensadas para promover um aumento da performance dos empregados tem gerado desconforto em alguns dos colaboradores.
Premiações e incentivos para os funcionários que batem metas ou os que mais produzem no mês são táticas conhecidas pela maioria dos trabalhadores, mas elas têm motivado conflitos por parte daqueles que não se sentem privilegiados.

Segundo o analista de recursos humanos Eliú Junior, na sua empresa tem acontecido de alguns empregados ficarem chateados com os benefícios que alguns conseguem. “Temos os formatos de trabalho presencial e híbrido que é a alternação do home office com dias trabalhando na sede da empresa. Nos setores que precisaram voltar 100% ao presencial, houve um sentimento de injustiça por parte deles”, comenta.
Ele comenta que o critério pra esse diferença em formatos foi a produtividade, que em alguns casos caiu durante o home office, portanto a empresa recompensa os setores que estão entregando mais.
Eliú Junior conta que em certas áreas da empresa que estão trabalhando presencialmente, os gestores têm usado como estratégia que quem tiver os melhores índices do grupo poderão ficar trabalhando de casa no próximo mês.
“Certos funcionários não conseguem distinguir as coisas e não compreendem, nem aceitam como algum colega está sendo premiado por fazer um bom trabalho e atingir as metas estabelecidas”.
Além dessas premiações visando proporcionar trabalho em homme office, Eliú Junior conta que eles promovem outros benefícios em cima da produtividade e que, apesar da reclamação de alguns empregados, essas ações de incentivo têm dado retorno positivo para a empresa.
Análise
“Em algumas situações, o silêncio é importante”
“Hoje o mundo está muito conectado. A maioria das pessoas tem acesso às redes sociais; e fica cada vez mais perigoso e até constrangedor você não se atentar ao que está postando no mundo virtual.
Quando o profissional faz uma foto ou usa as redes sociais para divulgar alguma informação de dentro da empresa que trabalha, o cuidado deve ser triplicado.

Então, fique atento aos comportamentos que podem nos prejudicar. Eles estão sendo vistos por alguém e podem impactar de forma negativa, provocando a perda do emprego, mostrando falta de ética e falta de compromisso com a organização.
A falta de cuidado de alguns profissionais nessas postagens, na forma de se expor nas redes sociais, tem levado a algumas demissões que poderiam ser evitadas.
É preciso bom senso e a preocupação em consultar o que deve e o que não deve ser postado nas redes sociais. Essa prudência serve também para o “mundo presencial”, afinal, a imagem profissional que construímos no mercado de trabalho não é apenas digital. Ela faz parte da rotina diária das organizações onde trabalhamos.
Portanto, repensem seus atos. Avalie se o que está sendo dito em relação à empresa, a algum colega ou à própria gestão realmente precisa ser dito. Em algumas situações, o silêncio é importante”.
Neidy Christo, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos( ABRH-ES)
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