Ameaçados por agiotas são indenizados em até R$ 50 mil
Consumidores que caem nessa cilada têm como opção denunciar à polícia a coação e ainda pedir à Justiça reparo por dano moral
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Pandemia, desemprego, desespero. Esse cenário tem levado cada vez mais gente a pegar empréstimo com agiotas. Com a chegada do Pix, as operações tem ficado ainda mais ágeis. Só que esse tipo de dívida costuma ser cobrada com ameaças e violência.
É possível, porém, reduzir o valor do débito e receber indenização pelo dano moral recorrendo à Justiça. Há caso de quem tenha sido reparado em até R$ 50 mil no Estado.

“O crime se concretiza quando a vítima se sentir com medo, coagida, acuada”, disse o advogado e professor Eduardo Sarlo, ao explicar que acontece muito de o agiota praticar mais de um crime, como estelionato, falsidade ideológica, falsificação de documento. “As penas deles são somadas e ele pode pegar um regime fechado”, frisou.
O medo de ser agredido ou morto é uma barreira. Há quem venda tudo o que tem ou até fuja para não sofrer violência. É o caso de uma empresária, de 62 anos, que após ouvir intimidações como “vou cortar sua cabeça”, resolveu vender tudo o que tinha para quitar a dívida.
Mas o valor arrecadado não era suficiente para arcar com o débito acrescido dos juros exorbitantes: “Tive de vender meu bar, minha casa, tudo. Precisei recomeçar do zero depois”, desabafou.
Para evitar esse tipo de drama, a orientação é simples: “Não se deve pegar dinheiro emprestado com pessoas físicas, ou seja, fora das instituições bancárias, especialmente nos casos em que os criminosos estão oferecendo dinheiro facilmente”, alerta o advogado criminalista Flávio Fabiano.
Mas, para quem já caiu nessa cilada, o advogado criminalista André Rocha dá o caminho. Além de entrar na Justiça para rever os juros e o valor do débito — e a indenização por dano moral — o denunciante pode solicitar ao delegado, ao registrar a ocorrência, medidas de proteção para ele e sua família.
“O juiz vai analisar o pedido e pode proibir o denunciado de se aproximar do denunciante e sua família e de não entrar em contato com qualquer deles por qualquer meio, seja ligações, mensagens, WhastApp, sob pena de ser preso”.
Ele explicou que a agiotagem consiste no empréstimo a juros excessivos, superiores aos permitidos em lei, cuja cobrança é considerada crime contra a economia popular.

Dívida tem de ser paga, mas juros podem ser revistos
Muitos consumidores não têm conhecimento de que podem buscar na Justiça a redução de juros abusivos cobrados por agiotas. Contudo há também quem tenha conhecimento dessa possibilidade, mas não busca ajuda.
A advogada criminalista Caroline Veríssimo Portela contou. “Eles pensam: estou errado, estou devendo e vou me virar para pagar”.
E mesmo para quem já pagou há saída para reaver parte do dinheiro. “Pode ser dada entrada a uma ação cível por lesão, em razão da manifesta desproporção do valor cobrado, com pedido de indenização por danos, fazendo o percentual ser reduzido aos juros legais” , conforme o advogado criminalista, André Rocha.
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Agiota condenado a indenizar vítima

Apenas 11 dias após o parto, uma mulher e o marido tiveram a casa invadida à noite por um agiota e três capangas. Ele tomou o carro da família, ameaçou e humilhou o casal. O agiota queria que o homem pagasse o dinheiro devido e os juros.
A mulher ficou tão traumatizada que não conseguia amamentar o filho. Ela passou a ter distúrbios psicológicos. Mas o casal buscou a Justiça. O agiota foi condenado a pagar indenização.
Ao todo foram R$ 72 mil por danos materiais, além de R$ 50 mil para o devedor e R$ 100 mil para a esposa, por danos morais. A decisão foi da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), mantendo a condenação foi pela justiça de Rondônia.
Agiotagem
- Agiotagem consiste no empréstimo de dinheiro a juros excessivos, superiores àqueles legalmente permitidos. A prática da cobrança é considerada crime contra a economia popular, denominada usura pecuniária ou real.
- A cobrança de juros acima de 1% ao mês é considerada agiotagem, se o empréstimo for feito por pessoa não autorizada pelos órgãos econômicos do governo federal (bancos e instituições de crédito, devidamente cadastradas e constituídas na forma da lei). Pena: a pena prevista é de 6 meses a 2 anos de detenção e multa.
Crimes envolvidos
- A agiotagem, em muitos casos, é associada também a outros crimes como ameaça, falsidade ideológica, falsificação de documento.
- Ameaça: a pena é de detenção, de um a seis meses, ou multa.
- Falsidade Ideológica: pena é de até 5 anos de reclusão e multa.
- Falsificação de Documento: a pena prevista é de até 5 anos de reclusão e multa, em caso de a falsidade ocorrer em documento público, e de até 3 anos, nos documentos particulares.
- Estelionato é obter vantagem ilícita criando prejuízo alheio, induzindo ou mantendo a vítima em erro mediante artifício ou meio fraudulento. Pena: reclusão, de um a cinco anos, e multa.
Justiça
- Quem deve a agiota tem de pagar a dívida. O que pode ser feito é entrar na Justiça para que os juros cobrados sejam ajustados dentro da legalidade. Após quitar a dívida, pagando os juros abusivos, a vítima também pode dar entrada a uma ação cível por lesão, por causa da desproporção do valor cobrado, com pedido de indenização por danos, fazendo o percentual ser reduzido aos juros legais.
- Dependendo da situação também é possível buscar reparação por danos materiais e morais.

Medo
- As vítimas muitas vezes não buscam a Justiça por julgarem que elas próprias estão erradas. Além disso, também há casos violentos em que o medo de morrer, ser espancado ou ter a família agredida está presente.
- Além de se julgarem erradas e terem medo de ameaças, vítimas de agiotagem muitas vezes sequer sabem da possibilidade de buscar a Justiça.
- O denunciante pode solicitar ao delegado, ao registrar a ocorrência, medidas de proteção para ele e sua família. “O juiz vai analisar o pedido e pode proibir o denunciado de se aproximar do denunciante e sua família e de não entrar em contato com qualquer deles por qualquer meio, seja ligações, mensagens, WhastApp, sob pena de ser preso”.
Tomada do empréstimo
- Vários fatores influenciam na decisão de pegar empréstimo com agiota. Entre eles o desespero, a necessidade de ter acesso rápido ao dinheiro, o nome negativado que dificulta o acesso ao créditos nas instituições oficiais, ausência de burocracia, entre outros pontos.
Como denunciar
- A vítima que quer a punição para o criminoso pode buscar uma delegacia e fazer notícia-crime. Ela vai narrar o que aconteceu, explicar sobre os juros abusivos. O delegado vai investigar e, ocorrendo a conduta criminosa, ele indicia o agiota.
- Já o caminho cível é para quem busca a reparação dos danos materiais e morais, por causa de prejuízo relacionado a honra, a dignidade e imagem, por exemplo.
- Em casos de ações com valores inferiores a 20 salários mínimos (R$ 22 mil), as vítimas podem buscar o Juizado Especial, sem necessitar de um advogado. A reportagem procurou a Polícia Civil que disse que não tinha fonte para falar sobre o assunto.
Fonte: especialistas citados na reportagem, Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pesquisa AT.
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