Especialistas pedem cautela com a vacina contra Covid-19
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Há, entre infectologistas, o entendimento de que deve haver uma cautela especial com a vacina contra Covid-19. O motivo está nos anticorpos, que podem desencadear uma piora no quadro da doença.
Doutor em doenças infecciosas pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), o médico Lauro Ferreira Pinto admite que há mesmo preocupação entre os especialistas.
“Existe uma preocupação de que alguns anticorpos, em vez serem neutralizantes, causem agravamento da resposta do organismo. A Covid-19 possui um aspecto que lembra a dengue muito grave, que é uma resposta imune exagerada. É uma tempestade de mediadores químicos”, explicou.
“Então, uma coisa que atrasou a vacina da dengue e que, de certa forma, ainda interfere, é que a vacina possa desencadear essa gravidade, que a medicina chama de doença exagerada pelo anticorpo. Logo, as novas vacinas envolvem esse cuidado: elas não podem desencadear uma resposta com essa tempestade”, completou.
Segundo Lauro, o fato de o Brasil ser o epicentro da pandemia faz com que ele possa ser palco do teste de vacinas e medicamentos.
“Tem de fazer testes onde está a doença. Não adianta fazer onde a doença está controlada, porque vai ter menos gente exposta para acompanhar resultados e evoluções. É mais complicado, tem menos exposição ao vírus. A vacina de dengue do Instituto Butantan parou dois anos justamente pela ausência de muitos casos”.
Duração da imunidade é dúvida
A notícia de mais uma vacina entrando na fase 3 é boa, mas segue trazendo preocupações. Uma delas é quanto à duração da imunidade, alerta a pesquisadora Ethel Maciel, pós-doutora em Epidemiologia pela Universidade Johns Hopkins (EUA).
“Tem vacinas para várias doenças que não conferem imunidade completa, como é o caso da tuberculose. Tomamos a BCG, que não confere imunidade para tuberculose pulmonar, por exemplo. Já a do sarampo é muito boa”, disse.
“Em outras vacinas, temos de tomar mais de uma dose. Então, depende. Será que essa imunidade vai ser igual à do H1N1, que vai ter de revacinar de um ano para o outro?”, questiona.
Enquanto isso, a doença segue desafiando especialistas. “Há dois problemas: poucas pessoas imunizadas no Estado e não sabemos quanto de imunização a gente precisa para a imunização em massa. Também não sabemos por quanto tempo a imunidade é conferida. Há casos na Coreia do Sul, Vietnã e China em que tidos como curados voltaram a ser infectados”.
Por isso, as análises sobre a pandemia do novo coronavírus são feitas “num momento de excepcionalidade”, diz Ethel.
“É cedo para termos uma avaliação mais precisa sobre o futuro, sobre como estaremos quando essa vacina for concluída, como sugerem, para até julho de 2021. Não conseguimos avaliar uma pandemia desse porte em dois, três meses. Só vamos entender o pico depois que a gente passar por ele”, pondera.
Tudo ainda é muito incerto, diz a pesquisadora. “Nós ainda estamos vendo as coisas acontecendo em tempo real, e o vírus está muito mais rápido do que nossa capacidade de analisar os dados. Os elementos para cravar uma volta da normalidade ainda são incertos”.
Segundo ela, não há como antecipar fases de uma nova vacina. “Etapas precisam ser cumpridas, para não prejudicar a qualidade dos dados. Mas as principais perguntas são: como a vacina vai ser distribuída? Quem terá acesso?”.
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