Jeffrey Dahmer e todas as suas vítimas, além das que morreram
Artigo da coluna Tribuna Livre, do Jornal A Tribuna
Geralmente, pensamos nas vítimas como sendo as pessoas que sofreram diretamente o dano, mas, na verdade, devemos pensar para além das vítimas óbvias de um crime.
Ao ver a famosa série da Netflix sobre os crimes de Jeffrey Dahmer, assassino em série americano que matou 17 homens entre 1978 e 1991, percebi o quanto é real a dor e o sofrimento das outras vítimas.
Nesse sentido, parei para estudar e entender um pouco mais, e de uma forma mais assertiva, sobre o assunto. Foi quando me deparei com o livro de um grande amigo, “Vitimologia Manual da Vítima Penal” de Anderson Burke. Ali, compreendi melhor quem são as vítimas e como elas, ainda hoje, são tratadas. A propósito recomendo a leitura.
Às voltas com esse pensamento, conclui que as outras vítimas, que não as primárias, sofrem muito e na pele com o crime. Voltemos ao exemplo de Jeffrey Dahmer.
Os familiares das vítimas dos crimes de Jeffrey, além de sofrerem a perda do ente querido, ainda passaram pelo sofrimento de todo o processo judicial que muitas das vezes se estende por longo tempo, deixando com que todos fiquem ainda mais expostos às críticas, julgamentos, perseguições.
É importante pensar, também, na família do próprio Jeffrey, na sua estigmatização. Pensa você ser o irmão, ser a mãe ou o pai e todos ao redor do crime e alguns culpando a família pelas atitudes dele.
Essa vitimização, chamada de “vitimização terciária propriamente dita sobre os familiares”, é muito bem retratada no filme “Precisamos falar sobre o Kevin”.
A obra cinematográfica mostra o sofrimento da mãe de Kevin após o filho ser preso, todas as dificuldades que ela passou, até mesmo para conseguir e se manter em um emprego.
Sobre essa vitimização, a proposta apresentada pelo autor do livro, Anderson Burke, com a qual eu concordo, é a necessidade maior de uma humanização e de aplicação de políticas públicas que atinjam não só o reeducando como também a sua família. Devemos cuidar dessas pessoas para que elas também não sofram além do que já sofreram independente de qualquer política pública que tente amenizar a dor de ter um familiar nessa situação.
É importante ressaltar que estamos tratando de casos onde existam uma possível ressocialização do preso e sobre o auxílio que precisa ser dado à família, de todo e qualquer detento, mesmo sendo ele um psicopata, que sabemos de antemão não ser possível ressocializar.
O destaque está na vitimização terciária e de forma alguma significa que a sociedade não se importe ou que não queira a atenção do Estado em relação às vítimas primárias, apenas é mais uma forma de visualizar as inúmeras vítimas existentes das quais precisamos conversar.
Enfim, o estudo do crime, do criminoso e da vítima se mostra cada vez mais importante para o aperfeiçoamento do Direito e, principalmente, da Justiça.
Acredito que cabe a nós, quanto operadores do Direito, a obrigação aos estudos e a tentativa de melhorarmos o entendimento da sociedade em geral sobre a real complexidade e dimensão de um crime.