Candidatura avulsa e os rumos da democracia no Brasil
O Supremo Tribunal Federal realizou audiência pública para ouvir toda a sociedade aberta de intérpretes da Constituição (no caso, a saber: representantes do Poder Legislativo, dos partidos políticos, e entidades técnico-especializadas no Direito Eleitoral) sobre suas respectivas opiniões em relação à candidatura avulsa, ou seja, aquela candidatura requerida à Justiça Eleitoral para participar das Eleições sem filiação à partido político.
Essa iniciativa do Supremo de colher a opinião de “amigos da Corte” visou fornecer melhor conhecimento ao mesmo para o julgamento de recurso em que irá dirimir se é possível, para as eleições de 2020 e para as futuras, o registro de candidatos para os cargos majoritários (presidente, governador, senador e prefeito) de maneira avulsa.
Nada obstante a Constituição Federal de 1988 exigir a prévia filiação partidária como condição de elegibilidade, isto é, sem a qual não é possível o deferimento de registro de candidatura, bem como malgrado o invocado (pelos entusiastas da candidatura avulsa) Pacto de São José da Costa Rica não conceder esse direito ao cidadão de maneira expressa (conforme já decidiu em 2008 a Corte Interamericana de Direitos Humanos em uma demanda envolvendo o caso Castañeda Gutman x México), certo é que, hoje, a candidatura avulsa reúne em igual medida possibilidade e probabilidade de vir a acontecer.
Isso porque, acima de tudo, hodiernamente no Brasil a democracia representativa através dos partidos políticos está em crise.
Segundo pesquisa do Datafolha publicada em 2018, aproximadamente 70% dos brasileiros não depositam nenhuma confiança nos partidos políticos. E vejam que existem agora 33 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral. Nenhum deles para a maioria esmagadora da população é digno de fé.
Sociologicamente, não se sabe se esses dados empíricos são um reflexo da Operação Lava a Jato, que escancara continuamente, desde 2014, o modo de ser corrupto dos maiores partidos que sempre estiveram no poder da República (PT, PMDB e PSDB, entre outros), ou se é (de)mérito próprio dos partidos essa cisma da sociedade, porque políticos, habitualmente, legislam em causa própria.
Basta vermos a recente aprovação pela Câmara dos Deputados de aumento dos recursos do fundo partidário, furtando, em contrapartida, a aplicação de recursos financeiros já tão escassos para a Saúde, Educação, Segurança e outras políticas de interesse público primário.
Assim sendo, em decorrência desse ambiente de crise de representatividade do sistema político no Brasil, o Poder Judiciário é alocado como o superego da população. Ele é ativista, pois cria Direito por meio de sua atividade interpretativa.
Logo, não importa a Constituição nem muito menos o Pacto de São José da Costa Rica. Alguém precisa resolver esse problema. E quem está com a bola é o Supremo Tribunal Federal.