A usurpação do direito à propriedade
Coluna foi publicada no sábado (14)
A Constituição de 1988, que completou 35 anos em 5 de outubro, é conhecida como Constituição “Cidadã”, nome cunhado pelo advogado e político brasileiro Ulysses Guimarães, que presidiu a Assembleia Nacional Constituinte responsável pela sua elaboração. Essa alcunha decorre do reconhecimento de um amplo conjunto de direitos e garantias individuais e coletivas, bem como princípios democráticos, participativos e inclusivos.
Em teoria constitucional, alguns direitos são reconhecidos como bases da sociedade e, por isso, são declinados nas chamadas cláusulas pétreas que, de origem do latim, significa pedra, ou seja, são cláusulas imutáveis, não podendo ser alteradas ou revogadas por meio de emendas constitucionais e consideradas como “espinha dorsal” da Constituição, garantindo a estabilidade e a essência de determinados direitos fundamentais e princípios.
Entre esses direitos fundamentais, está o direito à propriedade, que passou a ser reconhecido como um bem de função social. O uso da propriedade como um bem de função social a serviço do desenvolvimento sustentável do país pode ser facilmente identificado no agronegócio.
Um exemplo do exercício desta acepção da função social é encontrado no Norte do Espírito Santo, onde a pujança do agronegócio segue gerando e compartilhando valor na região, que é referência na produção de coco, mamão, pimenta, pimenta-rosa, café, eucalipto, entre outros, contribuindo de forma significativa para compor o PIB do agronegócio capixaba.
Infelizmente, circulam notícias de que na região existem grupos organizados, que se travestem de organização de produtores rurais para a prática de crimes contra o homem do campo. Usurpam o direito fundamental à propriedade para invadirem áreas produtivas, cometerem crimes contra o patrimônio, vandalismos, coação e assédio, sobre comunidades tradicionais que residem na região.
No discurso distorcido de que estão dando função social à terra, comercializam terras produtivas, normalmente da empresa Suzano, localizadas em Conceição da Barra e São Mateus, por valores irrisórios, atraindo de outros estados ou das periferias de cidades vizinhas moradores incautos que por elas são ludibriados. Essas pessoas, de origem humilde, vendem o pouco que têm para investir nas tais associações, com a promessa de receber um pedaço de terra em troca.
Diante desse cenário, é nítido que os únicos beneficiados são as lideranças dessas associações. Afinal, vendem algo que não é deles e recebem mensalidades dos associados. Do outro lado, perde quem foi enganado, perde a sociedade com a redução dos tributos, emprego e renda, e perde o meio ambiente com os sucessivos incêndios criminosos na região.
Felizmente, temos percebido que a Justiça tem trabalhado para coibir esse tipo de prática na região com sucessivas decisões de reintegrações de posse. Afinal, a afirmação do direito à propriedade nesta região é o reconhecimento do exercício da função social da propriedade, e a garantia de direito de hipossuficientes que sofrem com os crimes cometidos na localidade.