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José Antônio Martinuzzo

José Antônio Martinuzzo

Colunista

Pós Doutor em Psicanálise, doutor em Comunicação e professor titular da Ufes

A tragédia, a travessia do luto e a reconstrução da vida

Coluna foi publicada no sábado (11)

José Antonio Martinuzzo | 15/05/2024, 17:41 h | Atualizado em 07/04/2025, 17:57

Imagem ilustrativa da imagem A tragédia, a travessia do luto e a reconstrução da vida
José Antonio Martinuzzo

A dor, como o amor, tem o condão de fazer laço. Por compaixão, empatia e/ou ética humanística, somos capazes de nos irmanar com o outro em seu momento de desespero. A tragédia que se abate sobre o Rio Grande Sul sombreou o País com um sofrimento dilacerante.

Por óbvio que o triste afeto oriundo da vivência midiatizada do horror não se compara com a devastação de quem sangra na carne, no coração e na razão as dores da desgraça que cai dos céus e varre a vida e os seus feitos como vaga lamacenta e mortífera, reduzindo tudo a um nada avassalador.

Apesar de a tragédia ainda ser de longo curso, ademais da reconstrução material da existência, os sobreviventes terão um caminho a percorrer entre o trauma e o luto, como uma travessia necessária para reinventar os dias.

E se essa caminhada diz respeito essencialmente às nossas irmãs e aos irmãos do Sul, por compartilharmos de algum modo esse desespero, também nos caberá um quinhão desse exercício de reestruturação afetiva da vida terrivelmente aviltada.

Freud assinalou que viver é algo extremamente desafiante, dado que habitamos um corpo que adoece, envelhece e morre, ocupamos um ambiente natural hostil, incontrolável e, algumas vezes, letal, e que, ainda, dividimos essa paisagem com semelhantes capazes de violências e ferocidades destrutivas. Mas também observou que isso não é motivo para desistirmos da oportunidade de, tocados pela pulsão de vida, produzirmos uma existência exuberante e resiliente.

Essa catástrofe das tempestades é o que se nomeia como trauma. Trata-se de uma irrupção destruidora que se propaga ao sabor do sem sentido e que nos joga no abismo de um desamparo atroz. Diante de sua face aparentemente incontornável, sentimo-nos tão impotentes que não conseguimos, num primeiro momento, elaborá-la simbolicamente.

O trabalho do luto é um dos meios que temos para a superação de ocorrências traumáticas, ainda que seja limitada a nossa capacidade de processar por meio de palavras tudo o que nos acontece. Ele prescreve, entre outros, assumir o vazio da perda, chorar a perda, falar da perda, de modo a se construir uma memória que vá obturar o buraco que o real da vida interpôs em nossa trajetória. Sem o luto, tornamo-nos prisioneiros da melancolia, a nefasta alienação do nosso eu àquilo que se perdeu, reduzindo-nos a um vazio existencial limitador.

Num belíssimo texto de 1916, diante da destruição da guerra, reveladora da precariedade, da fragilidade, enfim, da transitoriedade de tudo que achamos/desejamos ser eterno porque amamos e/ou nos ampara, Freud afirma que o luto é condição essencial para que possamos reconstruir tudo o que foi destruído – “e talvez em terreno mais firme e de modo mais duradouro do que antes”.

Ainda considerando sobre a morte, magistralmente sentenciou: “Suportar a vida continua a ser o primeiro dever dos vivos”. Nesse caminho, que não cessa de nos desafiar, que sejamos capazes de no laço da dor, também e fundamentalmente, firmarmos o laço do amor.

- José Antonio Martinuzzo é professor titular na Ufes, pós-doutor em Psicanálise (Uerj) e doutor em Comunicação (UFF)

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