Vinte pacientes por dia ganham na Justiça direito a cirurgias e remédios
São decisões, no Estado, favoráveis para cirurgias, exames, tratamentos, além de fornecimento de remédios de alto custo
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Buscando garantir direitos à saúde, pacientes têm recorrido à Justiça e conseguido decisões favoráveis para serem submetidos a cirurgias, exames, tratamentos, além de fornecimento de remédios, sobretudo de alto custo. No Espírito Santo, a média é de 20 casos por dia.
A judicialização da saúde na pandemia e os desafios do Sistema Único de Saúde (SUS) no enfrentamento da covid-19, inclusive, são temas debatidos no 8º Congresso Brasileiro Médico, Jurídico e da Saúde. O evento começou nesta terça-feira (26) e vai até sexta-feira, em Vitória.

No Espírito Santo, o número de mandados judiciais vem diminuindo, conforme a assessoria do evento, segundo a qual, os dados foram repassados pela Secretaria de Estado da Saúde.
Em 2019, o Estado precisou cumprir 14.269 mandados. Em 2020, o número caiu para 7.556. E este ano, são 6.562 mandados (até meados deste mês). A capital, ainda de acordo com a assessoria do evento, é a cidade que possui o maior número de mandados judiciais.
Para alguns médicos e juristas, essa queda nos números, entretanto, pode estar atrelada à pandemia.
Presente ao evento nesta terça, o desembargador federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Paraná), João Pedro Gebran Neto, disse que mais de 85% das liminares geralmente são favoráveis aos pacientes.
O desembargador, que é mestre e doutor em Direito à Saúde e membro do Fórum Nacional da Saúde do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), destacou ainda que durante a pandemia o perfil das demandas que chegam à Justiça tem mudado.
“Tínhamos uma judicialização histórica, principalmente por medicamentos e procedimentos. Com a pandemia, as ações têm sido voltadas para as políticas públicas, chegando ao Supremo Tribunal Federal. Além disso, outras são para garantir algumas demandas da covid, como internação, procedimento, acesso a medicamentos, oxigênio e vacinas”.
“Como principal desafio daqui para frente teremos o atendimento a essa demanda reprimida por atendimentos eletivos (sem urgência), que irá voltar”.
Aposentado pensa em entrar com ação
Em novembro de 2019, o servidor público aposentado Ivon Cleber André, que hoje tem 78 anos, contou à reportagem que ficou sem chão após receber alta hospitalar e descobrir que o plano de saúde tinha sido cancelado, sem justificativa.
À época, em tratamento por conta de acidente vascular cerebral (AVC), ele recorreu ao Poder Judiciário em busca dos seus direitos e obteve vitória. Agora, o aposentado não descarta recorrer novamente à Justiça na tentativa de conseguir remédios de graça. Mas antes quer passar por uma avaliação médica.
“Por mês, tenho uma despesa de R$ 2.200 com medicamentos. Tomo 15 remédios por dia, sendo dois de uso contínuo para controlar a arritmia. A Justiça é a nossa aliada”.
Especialistas temem avalanche de ações
Devido à suspensão de procedimentos eletivos nos períodos mais críticos de enfrentamento da pandemia da covid-19, o temor agora de especialistas é que ocorra uma avalanche de ações na Justiça.
No enfrentamento à pandemia, exames, consultas e cirurgias não urgentes foram adiados frente à necessidade emergencial de garantir leitos aos milhares de pacientes infectados pela covid-19.
Esse é um dos assuntos que também é discutido no 8º Congresso Brasileiro Médico, Jurídico e da Saúde, que acontece em Vitória.
A advogada sanitarista Clenir Sani Avanza, que é presidente da Associação Brasileira de Advogados em Saúde (Abras), por exemplo, diz que a judicialização vai aumentar.
“Os serviços de saúde foram paralisados por conta da pandemia, causando agravamento das comorbidades, que vão se agravar cada vez mais ao longo do tempo de espera”, destacou.
Ela observa ainda que já existia uma “longa espera” por cirurgias, a exemplo de cataratas, além das ortopédicas, cardíacas e até mesmo as mais simples, como apêndice, de hérnia, entre outras.
Para ela, que está na coordenação do Congresso, a pandemia mostra que a saúde está subfinanciada e precisa da atenção de todos. “O orçamento da saúde precisa ser revisto e nós precisamos formar mais profissionais de saúde”.
Ela também disse que a judicialização precisa ser qualificada dentro da oferta do SUS.
“Isso significa que os procedimentos precisam ser disponibilizados para todos. É preciso pensar de uma forma coletiva para não desequilibrar o SUS e para que o estado brasileiro possa entregar o que ele prometeu na Constituição Federal, que é a saúde como direito fundamental”.
O presidente do Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES), Fabrício Otávio Gaburro Teixeira, também estima um aumento na judicialização.
“A gente ficou praticamente um ano e meio com as coisas paradas, as pessoas sem procurar assistência médica, postergando alguns diagnósticos e tratamentos por conta do medo da pandemia, de ir para instituições hospitalares e acabar pegando covid-19”.
Esse contexto, segundo ele, indica que há uma demanda reprimida e que a partir de agora as pessoas irão buscar, principalmente, procedimentos de alta complexidade, que já contavam com “certa dificuldade de acesso”.
SAIBA MAIS
Decisões judiciais
2019 - O Estado precisou cumprir 14.269 mandados judiciais.
2020 - O número caiu para 7.556.
2021 - Foram 6.562 mandados até meados deste mês, segundo divulgou a assessoria do 8º Congresso Brasileiro Médico, Jurídico e da Saúde.
Por dia
Diariamente, em média 20 pacientes ganham na Justiça direito a cirurgias, exames, tratamentos e remédios, principalmente de alto custo, pelo Sistema Único de Saúde.
Ações na Justiça contra planos de saúde
2020 - 64, segundo levantamento do Tribunal de Justiça do Estado
2021 (até março) - 49
Principais motivos
Internações
Medicamentos
Cirurgias, como cardíacas , ortopédicas, oftalmológicas e câncer
Exames
Consultas
Tratamento
O congresso
O 8º Congresso Brasileiro Médico, Jurídico e da Saúde começou nesta terça e vai até sexta-feira.
O evento acontece no Ilha Buffet, Álvares Cabral, em Vitória.
Fonte: Assessoria do 8º Congresso Brasileiro Médico, Jurídico e da Saúde; Tribunal de Justiça do Estado; juristas e médicos entrevistados.
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