Ufes recruta voluntários que doem corpos para estudo após a morte
Quem deseja ajudar a ciência, deve se cadastrar pela internet e entregar documentos pelos Correios ou na universidade, em Vitória
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O estudo da anatomia humana faz parte de cursos da área da saúde, e ter acesso a corpos reais ao longo das aulas é fundamental para a formação de um profissional bem qualificado. No entanto, a quantidade disponível é pequena.
A fim de suprir essa necessidade, a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) criou o Programa de Doação de Corpos Humanos em 2017, que recebe inscrições de pessoas que têm o interesse de doar o corpo após a morte.
Quem tem o desejo de fazer essa contribuição, precisa preencher formulários no site sejadoador.ufes.br, autenticá-los em cartório, fazer a entrega dos documentos no campus de Maruípe, em Vitória, ou enviá-los pelos Correios. A pessoa recebe uma carteirinha identificando-a como doadora.
Segundo Ricardo Eustáquio da Silva, professor de Anatomia da instituição e coordenador do programa, o principal motivo de as pessoas não doarem é a falta de informação.
Segundo ele, hoje não existe nada que consiga substituir ou reproduzir de forma tão fidedigna o corpo.
“Como vamos formar um bom médico, dentista ou fisioterapeuta se esse indivíduo não conhecer bem o corpo humano? Existem peças de plástico que podem ser estudadas, mas não se comparam na riqueza de detalhes e minúcias que um corpo natural tem”.
De acordo com ele, as peças de plástico são muito padronizadas. Ao ter contato com um organismo real, o aluno tem a possibilidade de ver diferenças que existem nas estruturas. “O aluno precisa desse conhecimento para conseguir atender pacientes diversos”.
Entre os estudantes que fazem aula de Anatomia estão os de Medicina: Isa de Oliveira, Lucas Coscioni, Laira Sopeletto e Ana Carolina Avancini Guimarães.
No laboratório, grande parte das “peças” que são estudadas têm mais de três décadas. “A gente precisa trocá-las com maior frequência porque elas vão deteriorando”, ressaltou o professor.
Ele concluiu que os corpos são recebidos com muita gratidão, são bem cuidados e respeitados por todos. “Os corpos doados são os primeiros pacientes dos alunos”.
Aluno virou doador
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Ao ter contato com as aulas de anatomia, o estudante da Ufes de Odontologia Árlem Couto, de 40 anos, passou a nutrir o desejo de ser doador de corpo.
“Eu me sinto muito feliz de ajudar o coletivo e de ajudar pessoas que vão se formar no futuro, de pensar que mesmo após a morte eu estarei contribuindo para a ciência de uma maneira bem específica”.
Ele também disse que sempre leva informações para familiares e amigos, comentando sobre a importância da ação.
Agradecimento aos doadores
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Fábio Miranda, estudante de Odontologia da Ufes, de 34 anos, foi um dos organizadores da Cerimônia da Gratidão, evento que aconteceu no final de agosto com o objetivo de agradecer a todos os doadores de corpos que a instituição recebe.
Participaram alunos, professores, familiares de doadores e também pessoas que ainda irão doar os seus corpos.
“A gente quis agradecer e foi um evento bem tocante e bonito. Entendemos que não tem uma utilidade mais nobre dos nossos corpos do que a possibilidade de contribuir para a ciência e formação dos profissionais que irão fazer a manutenção da nossa vida”, comentou.
FIQUE POR DENTRO
> Programa de Doação de Corpos da Ufes
- Existe desde 2017 o Programa de Doação de Corpos da Ufes e, até a atualidade, já conta com cerca de 50 inscrições para doadores. Uma doação foi efetivada neste ano com a morte de um doador.
- Para participar, a pessoa deve ter acima de 18 anos, preencher formulários disponíveis no site sejadoador.ufes.br, autenticá-los em cartório e fazer a entrega dos documentos no campus da Ufes de Maruípe, em Vitória, ou enviá-los pelos Correios.
- A família do doador efetivará a doação após sua morte, e por esse motivo é fundamental que o doador converse com seus familiares.
- O contrário também ocorre: mesmo se a pessoa não estiver participando do Programa e a família desejar fazer a doação, esta será aceita, como está previsto em lei.
Não há impedimentos quanto a doenças, amputações, altura, peso ou idade (a doação de menores pode ser realizada pelos pais). Até mesmo portadores de doenças infecciosas ou transmissíveis, como o HIV e a hepatite, poderão ser doadores. Corpos oriundos de morte violenta, crime ou suicídio são proibidos por lei de serem doados.
> Benefícios de doar
- Contribui para os estudos dos profissionais que atuarão na área da saúde, melhorando sua qualificação.
- Dentre os cursos que fazem aulas de Anatomia, estão: Medicina, Odontologia, Farmácia, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Enfermagem, Nutrição, Fonoaudiologia, entre outros. Em média, 700 alunos passam pelo Laboratório de Anatomia da Ufes semanalmente.
> Número baixo de doadores
- Desde a década de 1960, o Laboratório de Anatomia da Ufes recebe corpos para estudo, contudo, esses corpos eram oriundos de pessoas que moravam em situação de rua e que não conseguiram ser identificadas. Se não era conseguido o reconhecimento familiar, o corpo era doado pelo Estado para as faculdades.
- Com o passar do tempo, menos pessoas passaram a morar nas ruas, e com o advento da internet os familiares conseguiram identificar mais facilmente o morto. Assim, menos corpos passaram a ser doados.
- A procura por eles também aumentou, visto que mais faculdades surgiram a partir dos anos 2.000.
Fonte: Ricardo Eustáquio da Silva e Ufes.
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