Redes sociais privadas geram cenário para a prática de desafios perigosos e crimes
Adolescentes nas redes enfrentam assédio, violência e influência criminosa, muitas vezes sem que os pais saibam
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Com acesso às redes sociais, adolescentes também ficam expostos ao mundo do crime. No cenário virtual, podem ser tanto vítimas quanto autores. Entre os perigos estão assédio, pedofilia e incitação a vários crimes, até mesmo homicídio.
Uma jovem de 17 anos tinha três contas no Instagram. O perfil público era controlado pelo pai, que, no entanto, não sabia das outras duas contas privadas. Em uma delas, conta a treinadora comportamental Carla Afonso, que acompanhou o caso, a jovem publicava sua automutilação.
“O pai controlava o perfil público dela, mas ela tinha dois privados. Em um deles, compartilhava suas dores, inclusive, lesões que fazia em si mesma. Nem o pai, nem o psiquiatra sabiam disso. Mas olha o perigo de estar expondo isso nas redes sociais. Imagina as possibilidade de adolescentes e jovens adultos estarem assumindo esse tipo de risco?”, questiona.
Em março, um grupo de “observadores digitais” da Polícia Civil de São Paulo coletou vários conteúdos de violência on-line em aplicativos de mensagens. Entre eles, estavam estupros virtuais, em que crianças e adolescentes de 7 a 17 anos eram submetidas a rituais de humilhação em salas de bate-papo.
Já no ano passado, a Polícia Civil capixaba participou da Operação Cyberbullying 01, que prendeu uma organização criminosa que planejava, dentre outros crimes, atear fogo e matar uma pessoa em situação de rua e transmitir o ato ao vivo pelas redes sociais.
Por outro lado, os adolescentes também podem se tornar algozes, influenciados por grupos que integram aplicativos de mensagem.
Especialista em segurança digital, Eduardo Pinheiro explica que, ao utilizar perfis fechados, um dos riscos é a criação de uma “identidade paralela”, o que, segundo ele, pode afetar a autoestima e gerar conflitos internos, pressão para participar de desafios perigosos — para ser aceito no grupo — e a normalização de discursos de ódio.
“Alguns desses comportamentos caracterizam crimes na legislação brasileira, e o adolescente pode responder por ato infracional, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente”, diz.
No Rio de Janeiro, no mês passado, um adolescente de 17 anos foi preso. Transmitindo ao vivo, ele queimou 70% do corpo de um homem em situação de rua.
Controle do Instagram

Bernardo Ezer tem 12 anos, nenhum celular e um perfil no Instagram criado pela mãe, a arquiteta Giedre Ezer, de 48 anos. Ela conta que tudo é monitorado. O perfil dele no Instagram, por exemplo, só pode ser acessado pela conta da mãe. “Eu faço um monitoramento seguro e direto. Eu tenho acesso irrestrito ao tablet dele, e ele sabe disso. Precisamos ter esse controle de tela. Ele é um adolescente, adora, mas não tem esse discernimento dos danos que isso pode causar. Vemos tantos problemas com adultos, imagina com adolescentes?”.
Opiniões



“Não existe privacidade para um menor de idade”
Os pais devem sim fiscalizar, e a polícia está atenta. É o que reforça o titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC), delegado Brenno Andrade.
“Programas de controle parental são essenciais. Os pais devem monitorar e fiscalizar o que crianças e adolescentes acessam”, afirma o delegado, destacando que essa é uma obrigação legal dos responsáveis.
“Os pais têm o dever de prover toda a assistência necessária até os 18 anos”, completa.
Segundo Brenno Andrade, o respeito irrestrito à privacidade dos filhos menores de idade pode ser perigoso. “Isso deve ficar claro: não existe privacidade para um menor de idade. Pela lei, os pais são os responsáveis e devem supervisionar”.
No entanto, ele alerta que essa supervisão não deve ser feita às escondidas. “É fundamental criar um ambiente de diálogo. Quando isso acontece, o adolescente tende a procurar os pais diante de um problema, ao contrário do que ocorre em ambientes marcados pela desconfiança”.
Brenno Andrade também esclarece que o fato de um grupo ser “secreto” — como perfis privados no Instagram ou servidores fechados no Discord — não impede a atuação da polícia.
“Mesmo em grupos privados, sempre há algum vazamento. Além disso, temos ferramentas para monitoramento e investigação. De uma forma ou de outra, vamos chegar até os envolvidos”.
Em caso de suspeita de crime, o delegado orienta que o registro da ocorrência pode ser feito presencialmente em qualquer delegacia ou on-line, pelo site sesp.es.gov.br. Também é possível denunciar pelo Disque 100.
Dicas
Ensine
Os pais precisam atuar de forma equilibrada e eficaz. Uma estratégia recomendada é ensinar desde cedo sobre os riscos e consequências da exposição on-line para as crianças e adolescentes.
Postergue
Segundo a comunicóloga e treinadora comportamental Carla Afonso, o ideal é postergar a entrega do celular ao filho até o mínimo de 12 anos.
Outro alerta que ela faz é sobre as redes sociais. Pede que os pais só permitam contas nesses ambientes virtuais a partir dos 16 anos.
Apesar de permitir o uso a partir dos 13 anos, a Meta restringe o acesso de adolescentes ao Instagram, Facebook e Messenger, como forma de proteção. Entre as restrições, estão a de lives sem autorização dos pais para menores de 16 anos.
Mantenha o diálogo e escute
Segundo especialistas, os pais, muitas vezes, só perceberão sinais de alerta se conhecerem os comportamentos típicos dos filhos. Portanto, é importante manter um diálogo aberto com eles.
Criar um espaço para conversar sobre os sentimentos, preocupações e escolhas do adolescente é importante.
Assim como manter uma escuta ativa, ouvir atentamente o que o filho tem a dizer, sem julgar ou interromper e transparência.
Compartilhe
Tentar compartilhar informações sobre os próprios sentimentos e experiências pode mostrar que os pais também são vulneráveis, contribuindo para um diálogo aberto.
Isso também pode ensinar aos adolescentes que as relações são feitas a partir de experiências, e que experiências são escolhas.
Defina limites
É importante que os pais estabeleçam acordos claros com os filhos sobre o uso das redes, incluindo limites de tempo e regras de segurança.
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